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 | Marcelo Elias/Arquivo Gazeta do Povo
| Foto: Marcelo Elias/Arquivo Gazeta do Povo

Seguidas mensagens de Íris Bigarella – esposa do professor João José Bigarella, falecido em 2016 – enfatizam, de maneira contundente, a necessidade de que nós, conservacionistas contemporâneos, tenhamos mais capacidade de luta e resistência. Sugere que podemos fazer muito mais e que só com um esforço mais determinado nossos desafios poderão ser adequadamente enfrentados. Mexam-se, por fim, explicita.

Outras mensagens, num enfoque bem diferenciado do primeiro, exploram a importância da espiritualidade. De forma amável e apenas sugestiva, recomenda publicações que lhe trouxeram inspiração e esperança, como que nos amparando para que o frequente esmorecimento que atinge os que enfrentam a demanda de evitar a degradação da natureza seja compelido.

Íris fundou, com seu marido, no início da década de 70, a Associação de Defesa e Educação Ambiental (Adea), instituição pioneira no Paraná na defesa do patrimônio natural. Através da Adea, o casal, acompanhado de um pequeno grupo de aliados mais próximos, dentre elas a professora Maria Luiza Merckler, demarcou posição em defesa dos nossos parques naturais, protestando contra abusos como o desmatamento indiscriminado que assolou o estado nas últimas décadas.

Os tempos atuais expõem uma sensação de aridez de posturas mais altivas na sociedade

A Adea, capitaneada pelo professor Bigarella, protestou contra ações de degradação na Serra do Mar, alertando quanto ao risco de as encostas desprotegidas causarem, dentre outros males, o assoreamento do principal porto do Paraná. Resistência contínua que culmina com o tombamento da área, em 1986. Foram lutas frequentes em defesa do Parque Estadual de Vila Velha, descaracterizado com ações irregulares envolvendo infraestrutura turística, e contra a falta de proteção dessa unidade de conservação. Bem como a posição inconteste contra a abertura da chamada Estrada do Colono, no Parque Nacional do Iguaçu. Esses são alguns exemplos dos muitos outros enfrentamentos precipitados por essa instituição.

Os tempos atuais expõem uma sensação de aridez de posturas mais altivas na sociedade. A crise, muito mais do que econômica, é de fundo ético. E arrasa as pretensões de uma sociedade mais equilibrada a partir de exemplos que muitos governantes e empresários praticam sem nenhum pudor. A regra institucionalizada do “levar vantagem em tudo” coloca à distância o real sentimento do interesse público e do bem comum. A proteção da natureza é questão menor, usada como barganha para que políticos consigam se manter em suas posições a partir da concessão de favores que implicam em avanços flagrantes na degradação ambiental a seus comparsas.

Leia também:Remando contra a corrente (artigo de Malu Ribeiro, publicado em 31 de julho de 2017)

Leia também:IAP, referência do que um órgão ambiental jamais deve ser (artigo de Henrique Pontes, publicado em 26 de julho de 2017)

Faltam pessoas com perfil mais combativo, com personalidade e desprendimento capazes de dedicar suas vidas em prol do que é de todos, mesmo que o mundo inteiro jogue contra as expectativas de proteção suficiente de áreas naturais e da sua biodiversidade – no Paraná, representada pelas florestas com araucária, pelos Campos Naturais, pela Floresta Atlântica e pela Floresta Estacional, nas regiões oeste e sudoeste.

Que a inabalável demonstração de resistência e de perseverança de Íris Bigarella represente um valioso exemplo aos mais jovens e àqueles que acreditam que a natureza não é um bem descartável. Que as áreas naturais são um patrimônio inestimável e que nos trazem beleza, espiritualidade e qualidade de vida. Que delas dependem os serviços ecossistêmicos de que precisamos para viver. E que a avidez dos que avançam além dos limites contra o patrimônio natural é um crime de agressão e violência contra toda a sociedade.

Clóvis Borges é diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS).
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