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Tramita no Congresso o Projeto de Lei 200/2015 que propõe permitir que pesquisas científicas com participantes humanos sejam conduzidas sem nenhum princípio ético, deixando claro quais são os interesses escusos de quem o propõe.

Hoje, no Brasil, nenhuma pesquisa cujo participante seja um ser humano pode ser iniciada sem que antes o seu projeto tenha sido aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) dos 700 espalhados por todo o país e vinculados principalmente a universidades, hospitais e secretarias de saúde.

Não há nenhuma preocupação em proteger o participante da pesquisa

Creditados e supervisionados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), esses comitês constituem o Sistema CEP/Conep, colegiados interdisciplinares e independentes, criados para defender os interesses dos participantes da pesquisa em sua integridade e dignidade e para contribuir no desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos. São colegiados independentes formados por pesquisadores doutores, de diferentes áreas do conhecimento, onde um dos seus membros é representante dos usuários, membro da sociedade que participa como controle social. Os integrantes dos comitês de todo o Sistema desempenham trabalho voluntário e de relevância pública.

Durante 20 anos, a Conep trabalhou no intuito de proteger o participante de pesquisa e conseguiu grandes avanços nesse sentido, como garantir que o participante, mesmo depois de concluída a pesquisa, continue a receber gratuitamente do patrocinador (laboratório) o medicamento pesquisado, se este lhe trouxer benefícios; proibir o uso de placebo (pílula de farinha que não contém princípio ativo de medicamento), se já há tratamento disponível para uma doença e só permitindo seu uso caso não haja tal tratamento; estabelecimento de normas claras para a coleta, armazenamento e uso de material biológico humano, dentre tantos outros avanços, que podem ser consultados nas resoluções do Conselho Nacional de Saúde.

O PL 200/2015 propõe ignorar o Sistema CEP/Conep, passando o controle da ética em pesquisa para as autoridades sanitárias do país, sem o controle social. O projeto não determina como seriam regulados os comitês, permitindo a participação dos próprios pesquisadores proponentes nas suas reuniões e cria dois tipos distintos de comitês, o institucional e o independente, sendo este último sem laços institucionais e mantidos por recursos próprios e externos.

A proposta prevê que se houver justificativa científica o placebo pode ser utilizado, mesmo que já exista tratamento para a doença e quando findada a pesquisa, o participante só terá direito ao medicamento pesquisado se houver risco de morte ou piora relevante de seu estado de saúde, ou se não houver tratamento no Brasil. Quanto ao uso de material biológico humano, a decisão passa a ser feita conforme os critérios de cada comitê. Não há nenhuma preocupação em proteger o participante da pesquisa e, sim, atender e beneficiar os laboratórios insatisfeitos com a fiscalização ética de seus projetos pelo Sistema CEP/Conep.

Os objetivos desse PL relembram o modo como as pesquisas nazistas foram conduzidas durante a Segunda Guerra Mundial. Esse projeto é um desrespeito à sociedade brasileira e, portanto, é preciso impedir que seja aprovado e se transforme em lei.

Beatriz Helena Sottile França é professora do Programa de Pós-Graduação em Bioética da PUCPR e membro do CEP-PUCPR.
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