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| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

O bilhete único do transporte coletivo retornou à pauta da prefeitura de Curitiba nos últimos dias. A integração temporal permitiria ao usuário realizar baldeações e trocas de ônibus em qualquer estação sem a necessidade de deslocamentos desnecessários até terminais, o que torna o sistema – do ponto de vista do usuário – muito mais eficiente. Porém, segundo relatório simplificado da Urbs, o novo sistema acarretaria em um aumento do valor da tarifa técnica, que fatalmente seria repassado ao usuário. Portanto, o passageiro chegaria mais rapidamente aos destinos, porém com custo superior.

Mas há análises do relatório que apontam algumas contradições no posicionamento da empresa, que alega um potencial aumento do custo, relativo à queda de receita proveniente de alguns usuários que ainda pagam duas passagens para chegar ao seu destino – algo que, na essência de um sistema integrado, não deveria acontecer. Outro apontamento é o impacto social do eventual efeito-cascata da obsolescência dos cobradores nos ônibus e estações-tubo. Porém, pensemos: a diminuição do número de funcionários de uma empresa não acarretaria numa diminuição de despesas e, portanto, no barateamento do sistema? Ainda assim, o impacto social da diminuição da necessidade de cobradores – um processo que já está ocorrendo independentemente do bilhete único – não poderia acarretar na migração destes profissionais para outras áreas do sistema, como postos avançados de recarga de cartões e apoio nas novas modalidades de terminais?

Aumentar a eficiência do cartão-transporte é urgente

Ainda que se releve o fato de a própria prefeitura assumir que há a necessidade de estudos mais detalhados para pontuar prós e contras, alguns aspectos, aparentemente, ainda não foram considerados.

Curitiba se notabilizou pela utilização de terminais de transporte como polos de descentralização da cidade, levando até os bairros atividades anteriormente só ofertadas no Centro. A integração temporal poderia diminuir a importância do terminal dentro deste sistema. Porém, o contraponto se dá pela integração do terminal com seu entorno, abrindo à comunidade suas atividades internas de comércio, sanitários e equipamentos públicos, evitando muros que podem gerar insegurança ao seu redor. Os terminais seriam, portanto, mais integrados com a vida do bairro onde estão inseridos.

Leia também: O declínio do transporte coletivo (editorial de 23 de outubro de 2017)

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Outro ponto diz respeito aos modais integrados. Em Curitiba, temos a integração de ônibus convencionais, troncais, circulares e pendulares. Porém, apenas ônibus. Outros vários modais poderiam ser incorporados – é o caso das bicicletas, carros públicos, táxis, transporte individual por aplicativos. Imagine poder utilizar uma bicicleta de casa até a estação, ali embarcar em um ônibus de alta eficiência, e finalizar a viagem com um táxi, tudo isso pagando uma passagem. Utópico? Não é o que acredita Jaime Lerner, justamente um dos mentores e responsável pela aplicação do sistema de transporte de Curitiba.

É lógico que alcançar este nível de integração requer tempo e adaptação de sistemas. Aumentar a eficiência do cartão-transporte, por exemplo, é urgente, assim como criar um sistema complementar de bilhetes, abandonando a utilização de dinheiro dentro dos veículos. Curitiba precisa atualizar seu sistema de transporte para estancar a perda de usuários e resgatar a confiança e o orgulho do cidadão. O primeiro passo pode ser dado nos próximos dias. Cabe à prefeitura dar continuidade ao processo de renovação de seu sistema, em especial desatando as amarras de um passado glorioso, porém longínquo.

Marlos Hardt, arquiteto e urbanista, é mestre e doutorando em Gestão Urbana com especialização em Arquitetura Sustentável e Urbanismo, e professor de Urbanismo e Coordenador da pós-graduação em Arquitetura da Paisagem da PUCPR.
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