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Os consumidores que utilizam os serviços de telefonia celular e de acesso à internet têm opções de serviços de voz concorrentes no mercado. Estas opções decorrem da evolução tecnológica na oferta destes respectivos serviços de comunicação pessoal. Há os serviços de voz ofertados pelas empresas de telecomunicações. E há os serviços de voz ofertados pelo WhatsApp, baseados na plataforma da internet. Aqui, o foco é a análise jurídica do conflito entre as empresas de telecomunicações e a empresa WhatsApp, fato noticiado pela Gazeta do Povo em ocasiões anteriores.

As empresas de telecomunicações são reguladas, obviamente, pela Lei Geral de Telecomunicações. A prestação dos serviços de voz pela empresa de telecomunicações somente pode ocorrer mediante concessão ou autorização da Anatel, agência reguladora e fiscalizadora dos serviços de telecomunicações. Essas empresas de telecomunicações submetem-se a regime jurídico com diversas obrigações e intensa tributação. A prestação dos serviços de voz depende de infraestrutura de rede de telecomunicações, via de regra de propriedade das empresas de telecomunicações.

Em discussão está a competência da Anatel para regular e fiscalizar os serviços de aplicações de internet

A empresa WhatsApp, embora ofereça serviço de voz assemelhado ao serviço de voz da empresa de telecomunicações, não é formalmente uma empresa de telecomunicações. O WhatsApp é uma empresa de tecnologia, com sede nos EUA, que oferece aplicações de internet para os consumidores em território brasileiro. Estes aplicativos são regulados pela lei do Marco Civil da Internet. Esta empresa oferece seus serviços de voz na plataforma tecnológica da internet. Destaque-se que a lei do Marco Civil da Internet distingue os serviços de conexão à internet, um serviço que pode ser oferecido por empresa de telecomunicações, dos serviços de aplicações de internet, como é o caso de WhatsApp, Facebook, YouTube, Uber ou Netflix, entre outros exemplos.

As empresas de telecomunicações defendem a aplicação da Lei Geral de Telecomunicações sobre as atividades da empresa WhatsApp – e, respectivamente, a fiscalização pela Anatel e a incidência da tributação dos serviços de voz realizados pelo WhatsApp, por exemplo a tributação incidente sobre o setor de telecom por ativação de cada linha móvel. Por sua vez, segundo alegação das empresas de telecom, o WhatsApp, embora utilize chamadas de celulares a partir de números móveis, não recolhe tributos sobre esta operação.

Conforme noticiado na Gazeta do Povo, o presidente da Anatel declarou que a agência reguladora não tem competência para regular os serviços de comunicação pessoal prestados por aplicativos da internet, como é o caso do WhatsApp. Ou seja, se prevalecer esta premissa, não é aplicável a Lei Geral de Telecomunicações aos serviços da empresa WhatsApp, não cabendo à Anatel impor o regime de licença sobre aplicativos da internet, obrigações e fiscalização dos respectivos serviços. Não se discute a competência da Anatel quanto à fiscalização do serviço de acesso à internet, classificado como espécie de serviço de valor adicionado à rede de telecomunicações, na forma na Lei Geral de Telecomunicações. Em discussão, registre-se, está a competência da Anatel para regular e fiscalizar os serviços de aplicações de internet, como é o caso do serviço de voz do WhatsApp.

A solução do conflito entre as empresas de telecomunicações e a empresa WhatsApp depende da interpretação adequada da legislação em vigor aplicável sobre os serviços de telecomunicações e os serviços de aplicações da internet. Caso prevaleça a interpretação da lei no sentido da incompetência da Anatel para regular o aplicativo da internet, eventualmente caberá ao Congresso Nacional decidir pela atualização e adequação da legislação à regulação do tema, com a inclusão da jurisdição da Anatel sobre o serviço de voz, prestado mediante aplicativo de internet. Outra questão daí decorrente é saber da constitucionalidade de eventual medida legislativa para afirmar a regulação sobre as aplicações de internet.

Enfim, o tema é relevante e atual, envolve a aproximação entre as tecnologias e o direito, no aspecto da comunicação pessoal. Enquadra-se no Direito das Comunicações, o qual abrange a regulação dos serviços de telecomunicações e de internet, bem como o estudo dos marcos regulatórios setoriais desses segmentos econômicos.

Ericson Scorsim, advogado e consultor em Direito Público, especializado em Direito das Comunicações, é mestre e doutor em Direito.
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