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| Foto: Lionel Bonaventure/AFP

Foram fortes as emoções suscitadas pelo primeiro turno das eleições presidenciais do Hexágono, após campanha inusitada, a lembrar pleitos tropicais de democracias inexperientes. A começar pela ausência de Hollande, renunciando a candidatar-se e ignorando o momento político, o que muitos interpretaram como forma metafórica de repetir Luís XV: après moi le déluge.

Era, de fato, o que muitos imaginavam, pelas pesquisas que apontavam segundo turno imponderável, entre as extremas direita e esquerda, de Le Pen e Melanchon, algo inconcebível para o francês médio, que estaria obrigado a escolher entre la peste et la colère. E, se isso não passou, a primeira consequência foi a salvaguarda da União Europeia, em risco com a vitória dos extremos. Aos que previam que o eleitorado francês seguiria a tendência do populismo, resta a lição de como o constante ensino laico, republicano e universal é eficaz elixir da democracia, apto a neutralizar aventuras demagógicas de pequenos tiranos.

A saída da França da União Europeia seria a explosão de todo o projeto de integração do velho continente

Desconsiderando-se a hipótese esdrúxula de que a extrema-esquerda possa agora votar na extrema-direita, a aritmética elementar e o bom senso parecem não permitir que a França possa ser governada pelo radicalismo. As forças políticas sensatas, à direita e à esquerda democráticas, todas propõem votos estratégicos no segundo turno para derrotar Le Pen, restrita a seus votos cativos.

Passado o risco do temido choque de extremos, lembre-se de que a saída da França da União Europeia seria a explosão de todo o projeto de integração do velho continente, sem comparação com os danos contornáveis que o Brexit pode provocar. De fato, as comunidades europeias se iniciam não com o Tratado de Roma, senão com o Tratado de Paris, que unificava de forma inédita a produção e o uso do carvão e do aço em base comunitária, já em 1951. Ainda no plano simbológico, o Tratado de Paris associava históricos inimigos figadais na busca da construção da concórdia e da paz, assentes em liberdade comercial e interesses comuns.

Na governança europeia, a saída de uma França intoxicada de extremismo representaria o rompimento do equilíbrio de poder com a Alemanha, comprometendo as relações Berlim-Paris. No plano financeiro, o que dizer, então, de uma deserção do euro por parte da França, quinta economia mundial? As consequências por certo iriam abalar todo o mercado mundial.

Quanto ao novo possível presidente, com votos de todos os matizes, espera-se que a híbrida atuação prévia de Macron tanto no Partido Socialista como no setor financeiro internacional não conforme contradição a comprometer sua credibilidade. Com formação acadêmica brilhante, se presidente, por certo saberá entender o que sua escolha representou de fortuito, longe de vitória pessoal, nos milhões de votos úteis que recebeu e que haverá de receber.

Na reta final marcada pelo atentado terrorista na vigília eleitoral, em plena Champs Élysées – o que para muitos significaria forte influxo na campanha de Le Pen –, ao fim o que se viu foi a desconsideração do episódio pelo eleitorado, que em pouco ou nada se deixou arrastar pelas razões do medo ou pelo simplismo de crer na possibilidade da violência como única resposta à violência.

Jorge Fontoura é professor e advogado.
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