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 | Gianne Carvalho
| Foto: Gianne Carvalho

Se fosse vivo, Roberto Campos teria completado 100 anos no último dia 17 de abril. Brilhante como economista, diplomata, ministro, embaixador, senador, deputado, escritor e intelectual multifacetado, ele morreu em 9 de outubro de 2001, aos 84 anos, e deixou um vazio na paisagem intelectual brasileira. Foi um dos homens mais inteligentes que o Brasil conheceu. Aguerrido defensor do liberalismo, sempre à frente de seu tempo, ele anteviu o desastre da Petrobras e preconizou o fracasso da Constituição de 1988 em promover o desenvolvimento e superar a pobreza.

Nestes tempos de Lava Jato e de lodaçal político, ficou marcada a imagem de Roberto Campos, no dia 5 de outubro de 1988, sentado no fundo do plenário da Câmara Federal, cabisbaixo, quase deprimido, enquanto Ulysses Guimarães levantava a Constituição Federal, gritando que ali estava a Constituição-Cidadã, a Constituição dos miseráveis. Na contramão da euforia, Roberto Campos alertava que o texto representaria o “avanço do retrocesso” e tornaria o Brasil ingovernável. Nada mais profético!

Roberto Campos foi o homem público que mais bravamente lutou pela liberdade do indivíduo contra a opressão do Estado

“Que contribuição trará a nova Constituição para inserir o Brasil na onda modernizante? Rigorosamente, nenhuma. O Brasil está desembarcando do mundo. Em vez de desregulamentação, o Estado fará planos globais e normatizará a atividade econômica. Em vez de encorajar o Poder Executivo a intensificar a privatização, amplia-se o monopólio da Petrobras, nacionaliza-se a mineração, a União passa a ser proprietária, e não apenas administradora, do subsolo, os governos estaduais falidos terão o monopólio do gás canalizado”, dizia ele, para alertar que mais uma vez o Brasil fracassaria na tentativa de se desenvolver.

Roberto Campos foi, sem dúvida, o intelectual e o homem público que mais bravamente lutou pela liberdade do indivíduo contra a opressão do Estado, além de denunciar o perigo da propensão ao intervencionismo e outras formas de coerção resultante da prevalência do Estado burocrático sobre a pessoa humana, sempre a pretexto de defender interesses sociais que ele próprio – o Estado – reserva para si o poder de determinar. Essas palavras com que o identifico são as mesmas que ele próprio usou para avaliar o homem que ele mais admirava: Friedrich von Hayek, economista e jurista, cujo livro O Caminho da Servidão, publicado em 1944, deveria, esse sim, ser lido nas escolas.

Destaco três citações de Roberto Campos, que ilustram bem o momento em que vivemos e a fina ironia com que ele tentava combater as ideias estatizantes. “Os esquerdistas, contumazes idólatras do fracasso, recusam-se a admitir que as riquezas são criadas pela diligência dos indivíduos e não pela clarividência do Estado”, e acrescentava: “O governo não passa de um aglomerado de burocratas e políticos que almoçam poder, promoção e privilégios, e somente na sobremesa pensam no bem comum”.

Em relação ao valor da liberdade e da democracia, selecionei a seguinte citação: “As pessoas têm interesses distintos, talvez egoísticos, e de qualquer forma frequentemente conflitantes pela simples razão de que as demandas possíveis são sempre muito maiores que os meios de satisfazê-las. A sociedade democrática dá a seus membros o direito de expressarem suas divergências. Não tenta obrigar ninguém a amar seu próximo como a si mesmo”. Roberto Campos foi um pensador que, no deserto de inteligência no cenário político atual, merece ser lido e lembrado.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.
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