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| Foto: Daniel Caron/Gazeta do Povo

Tão logo empossada, Cida Borghetti, nova governadora do estado, anunciou entre seus primeiros atos a criação da Divisão de Combate à Corrupção, que irá congregar as Polícias Civil, Militar, Ambiental, Rodoviária Estadual, além da Secretaria da Receita Estadual e a Controladoria do Estado, as quais terão a missão de trabalhar conjuntamente na investigação de casos de corrupção.

Ato nobre, certamente. Porém, o que de fato podemos esperar? Quão eficaz será essa divisão na consecução dos seus anunciados objetivos? Como será gerida e que mecanismos permitirão que as diversas entidades possam efetivamente atuar de forma conjunta?

Não podemos esquecer que, mesmo à luz da Lava Jato, crimes contra a ordem pública continuam ocorrendo e sendo revelados quase que diariamente, em dimensões, abrangência e valores inimagináveis. Vale também lembrar que em quatro anos da Lei Anticorrupção foram abertos 183 processos, penalizando tão somente 30 empresas, sendo a corrupção causa de 66% dos casos de expulsão de servidor federal em 2017.

Em quatro anos da Lei Anticorrupção foram abertos 183 processos, penalizando tão somente 30 empresas

Onde estamos errando? Quem continua errando? A Lei Anticorrupção veio para ficar, mas ainda há uma leitura errática da sua aplicabilidade e extensão. Muitos ainda a veem apenas como um mecanismo de punição de relações malversadas entre fornecedores de produtos e serviços para o Estado, em todas as suas dimensões: as três esferas do governo (federal, estadual, municipal), as três esferas de poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e empresas estatais.

Mas a Lei, na sua essência, é bem mais abrangente, aplicável a qualquer desvio de conduta nas relações com entes públicos. Mesmo não sendo a pessoa ou a empresa fornecedora do Estado, mas com ele tendo uma relação que abra espaço para um ato ilícito, aplica-se a lei.

Se uma companhia privada necessita de licença ambiental e para tanto se vale de um ato de suborno a um agente, a lei é plenamente aplicável, punindo-se a empresa e o agente público. Mais do que isto, caso este ato seja levado a efeito por um terceiro, prestador de serviço, contratado e atuando em nome da empresa que necessite da licença ambiental, esta última será objeto de punição.

Opinião da Gazeta: A Justiça que falha porque tarda (editorial de 22 de abril de 2018)

Leia também: Compliance: uma nova realidade (artigo de Rodrigo Pironti, publicado em 30 de abril de 2018)

Infelizmente muitas são ainda as empresas que não incorporaram aos seus códigos de conduta e políticas de integridade (compliance) os preceitos da Lei Anticorrupção, estendendo tais códigos à adesão de seus fornecedores, prepostos e terceiros, prestadores de serviços de qualquer natureza.

Há uma corrida contra o relógio por parte do empresariado que percebeu a urgência de mudar seu comportamento, seu modelo mental, sua atitude e seu grau de tolerância à corrupção, redimensionando riscos reputacionais nos quais queiram incorrer.

Talvez esteja aí um dos grandes legados da operação Lava Jato, um marco histórico: não basta identificar crimes contra o Estado e punir quem os cometa; há de haver uma mudança comportamental, uma maior consciência de todos os membros da sociedade, um resgate da ética.

Muito provavelmente nunca em nossa história se discutiu tanto esta questão, que deve ser fomentada, multiplicada e exponenciada. É o único caminho para um país mais justo, eliminando corruptos e corruptores, uma simbiose que tem de ser eliminada por severas leis, mas acima de tudo pelo resgate da ética e da cidadania.

Daí a importância da adoção da governança corporativa nas organizações, públicas e privadas, como guardiã das melhores condutas e práticas de gestão, como construtora de uma agenda estratégica que vise a perenidade das empresas e de sadias relações com o Estado.

Gino Oyamada é gerente da 3G Governança, bacharel em Administração de Empresas pela FEA/USP, com especialização em Finanças, pós- graduação em Gestão Empresarial (ISAE/FGV) e especialização em Banking e em Gestão pela Manchester Business School (UK).
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