• Carregando...
 | Daniel Castellano/
Gazeta do Povo
| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Houve uma época em que no roteiro de todo filme encaixava-se um fumante. Não importava o estilo, lá pelas tantas alguém puxava um cigarro no meio da história, tragava gostoso. A propaganda corria solta, sempre associando o cigarro à liberdade, evento esportivo, aventura amorosa. Ou seja, vendia-se exatamente prazeres malogrados pela torpe nicotina.

Projeções sombrias traziam pessimismo. Tragédia irreversível, não sobraria pulmão saudável. Pobre humanidade, manipulada pelo poder cruel do dinheiro, não teria a menor chance.

Cigarro custava caro e, para fugir do preço alto, criou-se alternativa. Eram os tais palheiros. Não tardou, surgiram restrições ao produto caseiro. Ônibus traziam aviso: “fume somente cigarro de papel”. Segundo alguns entendidos, o cigarro industrializado, de aroma agradável, praticamente não fazia mal – matéria prima bem lavada. Quem se dispunha a pagar um pouco mais, aí, sim, optaria por cigarros com filtro – esses, totalmente inofensivos.

A situação dos fumantes não anda fácil

Aqui e ali profissionais da saúde se erguiam, cobrando solução das autoridades: todo cigarro matava. O chiado surtiu efeito, campanhas educativas renderam frutos, o consumo de tabaco encolheu. Atualmente até as criancinhas sabem: além do perigo grande de câncer, queimar fumo é hábito feio.

A situação dos fumantes não anda fácil. Perderam o glamour de outros tempos, foram expulsos dos recintos fechados. A cada vez que puxam um cigarrinho da carteira para alimentar o mau costume, são lembrados da impotência futura e de outros malefícios. Isso tudo é insuficiente na visão dos patrulheiros obstinados. Querem expulsá-los das marquises, enxotá-los pra longe, que vão sujar o ar tomando chuva.

Enfim, o monstro sedutor curvou-se perante a consciência coletiva. Cigarro continua fazendo estrago, submisso, porém, às boas regras sociais.

Não convém comemorar. O risco segue em alta. A fumaça está devidamente enquadrada, mas a ruína se reinventa na ilusão de novos vícios. Pior para a juventude, mais receptiva ao assédio do líquido e do pó.

Florentino Augusto Fagundes é professor de Matemática da PUCPR.
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]