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Nos últimos dias, o tema da maioridade penal tem tomado grande espaço na mídia, sendo possível observar inúmeros argumentos que buscam a comoção social em prol da redução da idade mínima para a imputação de infrações penais visando unicamente aprovar medidas legislativas abruptas e comprovadamente ineficientes, pois cedem à apresentação de dados estatísticos.

De acordo com a Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça (Senasp), estima-se que os adolescentes entre 16 e 18 anos – faixa etária mais afetada, por exemplo, pela aprovação da PEC 171/93 – são responsáveis por apenas 0,9% do total dos crimes praticados no Brasil, incluindo-se as tentativas. Este dado fica ainda mais evidente quando considerados apenas homicídios e tentativas de homicídio, pois o porcentual cai para 0,5%. Ainda estima-se que, dentre atos infracionais praticados por adolescentes, 43,7% são patrimoniais e 26,6% são relacionados ao tráfico de drogas – ou seja, mais de 70% dos atos infracionais praticados são normalmente decorrentes da falha estatal na garantia da subsistência digna da população.

Além de atacarem o efeito e não a causa da prática das infrações, as propostas atacam exatamente a parcela mais vulnerável, os adolescentes

Não obstante os argumentos estatísticos, convém esclarecer que os adolescentes que cometem atos infracionais são, sim, responsabilizados. O sistema de aplicação de medidas socioeducativas corresponde à imposição de sanção ao ato ilícito praticado, e pode ensejar a aplicação de medidas em meio aberto, ou com a total privação da liberdade, como a internação. Ademais, não raras vezes os adolescentes passam até mais tempo privados de liberdade do que adultos: por exemplo, no caso do delito de roubo, é possível que um adulto seja posto em liberdade após o cumprimento de dois anos de prisão em regime fechado, através de direitos decorrentes da execução penal. Já um adolescente que praticar ato infracional equiparado ao crime de roubo poderá ter de cumprir três anos de internação integralmente.

Assim, a redução da maioridade penal, por meio da PEC 171/93, e o recrudescimento através da proposta de alteração do ECA que aumenta o tempo de internação e cria um regime especial de cumprimento para adolescentes condenados pela prática de ato infracional análogo a crimes hediondos (PL 133, já aprovado no Senado Federal) buscam solucionar o problema de violência, que é real e preocupante na sociedade brasileira. Porém, não constituem instrumentos adequados a tal fim, pois, além de ineficientes e de atacarem o efeito e não a causa da prática dessas infrações, atacam exatamente a parcela mais vulnerável, os adolescentes. É notório que adolescentes são utilizados por adultos para praticarem infrações penais; a redução, ou o aumento do tempo de internação, em nenhum momento alterará essa realidade; pelo contrário, poderá ensejar a utilização de crianças ou adolescentes mais jovens pelos adultos. A bomba da violência e da falta de segurança urbana não pode estourar para o lado mais vulnerável da sociedade brasileira. A Constituição Federal de 1988 estabelece a proteção integral às crianças e aos adolescentes, e cabe a todos nós garantir a efetividade dessa norma constitucional. Por esse motivo, a Defensoria Pública do Estado do Paraná manifesta-se publicamente contrária à PEC 171/93, ao PL 333 e a todas as propostas legislativas que de qualquer forma mitiguem ou reduzam a proteção já garantida às crianças e aos adolescentes, e se coloca nesta luta, juntando-se aos movimentos sociais.

Matheus Cavalcanti Munhoz e Lívia Martins Salomão Brodbeck e Silva são defensores públicos.
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