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Neste mês em que se comemora o centenário de nascimento do cronista Rubem Braga, ele tem sido alvo de homenagens em vários segmentos, não somente da imprensa brasileira, mas também por muitos círculos literários. Com um estilo de escrita nobre e insuperável, é considerado o criador da crônica moderna, de intenso lirismo mesmo na narrativa difícil do cotidiano. Na abordagem objetiva da realidade, sabia levar o leitor, dando à escrita o tom de conversa, atingindo leitores dos mais diversos perfis sem abrir mão do sentimento. Mas foi, acima de tudo, um jornalista crítico e cronista combativo.

Jamais deixou suas raízes; era reconhecidamente visto pelos amigos contemporâneos como um "bicho do mato cosmopolita". No singular apartamento de cobertura em Ipanema, onde viveu os últimos anos de sua existência, buscou cercar-se de plantas, goiabeiras, pitangueiras e mangueiras em um jardim desenhado por Burle Marx. Amava as flores, os pássaros e as pessoas. Nesse espaço, apelidado de open house, circulou a nata da intelectualidade carioca, com Vinicius de Moraes, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, Fernando Sabino e Lúcio Costa dentre os mais assíduos.

Durante a 2.ª Guerra Mundial, foi correspondente de guerra e embarcou com o 2.º escalão da Força Expedicionária Brasileira (FEB) rumo à Itália, compondo o grupo de jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas enviados ao teatro de operações. Esses correspondentes substituíram os norte-americanos que pouco sabiam da tropa brasileira. Para a cobertura dos acontecimentos, os correspondentes brasileiros e estrangeiros utilizavam duas organizações internacionais, a America Cable e American Press. Quem não tivesse a franquia da transmissão era obrigado a usar outro expediente. Rubem Braga muitas vezes acabou enviando seus textos por avião; por causa disso, eles eram publicados aqui quase um mês depois do ocorrido.

Segundo Marco Antonio de Carvalho, biógrafo de Rubem Braga, nenhum correspondente de guerra brasileiro aproximou-se tanto das batalhas. É tocante a descrição dos fatos ocorridos na cidade de Montese após a tomada do local pelos brasileiros, diante de um inimigo aguerrido. No Diário Carioca, Braga fez um balanço do que viu em Montese, quando a cidade perdeu mais de 1,3 mil dos seus monumentos históricos, muitos remanescentes do período medieval. Os mortos durante os bombardeios passaram de mil. Ele acompanhou de perto o registro dos mortos e feridos brasileiros, constatando o alto preço pago pela vitória nessa região.

No seu último informe sobre Montese, temos uma mostra do cronista observador e objetivo cujas palavras se entrelaçam entre o lírismo e sentimento. "Escurece, rodo pela estrada. No acampamento, uma brisa leve faz cair as pétalas das flores de cereja, numa chuva de neve. A esta hora os homens estão escavando abrigos nas posições que conquistaram para passar a noite. E todas as noites eles esperarão um contra-ataque inimigo que não virá."

No fim, as linhas alemãs foram rompidas e os alemães, em retirada, foram perseguidos pelos brasileiros até Colecchio e Fornovo di Taro, onde se renderam à FEB em 30 de abril de 1945.

Carmen Lúcia Rigoni é doutora em História Cultural.

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