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A Constituição da República Federativa do Brasil diz o seguinte, no artigo 53: “Os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.

Em sua jurisprudência sobre este artigo, o STF afirma que “O ‘manto protetor’ da imunidade alcança quaisquer meios que venham a ser empregados para propagar palavras e opiniões dos parlamentares”, inclusive “manifestações em meios de comunicação social e em redes sociais” (AO 2.002, julgada em fevereiro de 2006 e que teve como relator o ministro Gilmar Mendes). Sobre a troca de ofensas entre parlamentares, o Supremo diz que para “parlamentares em posição de antagonismo ideológico” há uma “presunção de ligação de ofensas ao exercício das ‘atividades políticas’ de seu prolator, que as desempenha ‘vestido de seu mandato parlamentar; logo, sob o manto da imunidade constitucional’” (também da AO 2.002).

O STF não quis nem sequer esconder o casuísmo de sua decisão

A imunidade não é o direito de dizer tudo

É acertada a conclusão do ministro Luiz Fux, no sentido de que as declarações do deputado não têm “teor minimamente político”

Leia o artigo de Roosevelt Arraes, professor do curso de Direito da Unicuritiba.

Sobre declarações dadas à imprensa, o STF afirma que “a cláusula de inviolabilidade constitucional [...] também abrange, sob seu manto protetor, as entrevistas jornalísticas”, que são “natural projeção do exercício das atividades parlamentares” (Inq 2.332-AgR, que teve como relator Celso de Mello, com julgamento em fevereiro de 2011).

A única hipótese em que as palavras do parlamentar não estão acobertadas pela imunidade é no caso de não estarem relacionadas ao exercício de seu mandato, como no caso do parlamentar que é também jornalista e profere injúrias exclusivamente enquanto jornalista (Inq 2.134, que teve como relator Joaquim Barbosa, com julgamento em março de 2006).

O caso do deputado Jair Bolsonaro, cuja denúncia foi recebida pela 1.ª Turma do STF, foi um ponto fora da curva em comparação com tudo que o Supremo dissera antes sobre o tema. Segundo notícia veiculada no site do STF, “O relator, ministro Luiz Fux, entendeu que as declarações do deputado Bolsonaro não têm relação com o exercício do mandato. ‘O conteúdo não guarda qualquer relação com a função de deputado, portanto não incide a imunidade prevista na Constituição Federal’, disse. Ele acrescentou que, apesar de o Supremo ter entendimento sobre a impossibilidade de responsabilização do parlamentar quanto às palavras proferidas na Câmara dos Deputados, as declarações foram veiculadas também em veículo de imprensa, não incidindo, assim, a imunidade”.

Mas a jurisprudência do Supremo afirma, como vimos, que a imunidade resguarda as palavras dos parlamentares inclusive em entrevistas. Por que para Bolsonaro o STF disse exatamente o contrário, isto é, que as declarações não estão protegidas porque foram veiculadas “também em veículo de imprensa” (reconhecendo, no “também”, que antes elas foram ditas na tribuna da Câmara, no pleno exercício do mandato)?

Da mesma forma, já vimos que o Supremo tem jurisprudência segundo a qual ofensas trocadas entre parlamentares em posição de antagonismo estão acobertadas pelo manto da imunidade, pois frutos da atividade política. Por que, então, o STF afirma agora que a reação de Bolsonaro à calúnia de Maria do Rosário – que lhe chamou de “estuprador” primeiro – não possui, segundo o relator Luiz Fux, “teor minimamente político” e, por isso, não estaria acobertada pela imunidade?

Bolsonaro falou enquanto deputado, na tribuna da Câmara, e deu entrevistas enquanto parlamentar. Não incide, no caso, a única exceção possível à imunidade (o desempenho de outra atividade).

Dois pesos e duas medidas. O STF não quis nem sequer esconder o casuísmo de sua decisão e o desejo inconfessável de, com ela, atingir pessoalmente a Jair Bolsonaro.

Taiguara Fernandes de Sousa é advogado e jornalista.
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