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Em fevereiro participei de uma reunião com o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, em que foi colocada em pauta a disposição do governo em debater a regulamentação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF).

O infindável apetite do governo

Em tempos de ajuste fiscal, em que o governo federal prefere aumentar a tributação a reduzir o número de ministérios, extinguir parte dos mais de 107 mil cargos comissionados e fazer uma reforma séria da dívida pública com seu alongamento, que é o principal ralo do orçamento federal, entra novamente em discussão a regulamentação do IGF.

Leia também o artigo de Bernardo Santoro, professor de Economia Política da UFRJ.

Discutir a implementação de um tributo, em qualquer parte do mundo, nunca é uma tarefa simples. Exige responsabilidade e sensibilidade social do governo, parlamento e sociedade, além de lucidez para que se deixe de lado a visão de curto prazo e individualismos, o que nem sempre é fácil.

O IGF é o único entre os sete tributos federais previstos na Constituição de 1988 que ainda não foi regulamentado. Desde a Constituinte, o imposto foi tema de uma série de projetos apresentados na Câmara e no Senado por parlamentares de diferentes partidos, entre eles PSDB, PPS, PCdoB e PT.

O fenômeno da desconcentração de renda ocorrido ao longo dos últimos anos veio acompanhado do aumento da concentração da propriedade

De maneira geral, a fonte de inspiração para todas as propostas apresentadas nestes 26 anos é o substitutivo do então senador Fernando Henrique Cardoso (PSDB), apresentado no fim de 1989.

Entretanto, nunca nenhum dos projetos chegou a ser votado no Congresso. Ao redor do mundo, a taxação de grandes fortunas já existe em países como França, Holanda, Espanha e Argentina.

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013, os super-ricos brasileiros – uma parcela de 0,9% da população – detêm entre 60% e 68% da riqueza do país, sendo que as principais fontes de acumulação de riqueza são os fluxos de renda e heranças.

Além disso, um estudo inédito divulgado no ano passado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que o fenômeno da desconcentração de renda ocorrido ao longo dos últimos anos veio acompanhado do aumento da concentração da propriedade, fazendo com que a desigualdade patrimonial no Brasil seja muito maior do que na renda.

O desequilíbrio brutal da equação concentração de riqueza x aumento da concentração de propriedade x desigualdade de renda é o gatilho inevitável da tributação das grandes fortunas.

Acredito ser importante considerar e entender a resistência histórica que existe no país em relação ao IGF. São muitos os argumentos contrários: baixo potencial arrecadatório; elevado custo de administração decorrente do grau de complexidade; desestímulo à poupança; estímulo à saída de capital do país para outros locais que não adotam o imposto; conflito com os outros impostos sobre a propriedade. Entretanto, esses problemas já estão presentes em nosso país com a ausência do IGF, acrescidos de uma monumental injustiça tributária.

É fundamental considerar que o Brasil precisa encontrar formas de distribuir de maneira mais eficiente a riqueza gerada. A tributação das grandes fortunas – patrimônio cuja acumulação ao longo dos anos por uma exclusiva lista de brasileiros é facilitada, na maioria das vezes, pelas melhores condições em que se encontram, como posse de imóveis, terrenos, ações e aplicações financeiras – é imprescindível para ajudar a combater a desigualdade e estimular a formação de uma sociedade mais justa e solidária. A regulamentação do IGF é um avanço necessário e urgente.

Gleisi Hoffmann é senadora (PT-PR).
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