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A emissão de vistos é concedida entre os países que mantêm relações diplomáticas e interesses comerciais comuns, gerando o que se chama de “princípio da reciprocidade” – caso que ocorre entre Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália em relação ao Brasil. Na mesma situação estão aqueles países que não exigem vistos de entrada mútuos, ou seja, o acesso entre ambos é autorizado automaticamente apenas com a apresentação do passaporte, como o que ocorre entre vários países europeus e o Brasil.

Nesse cenário, considerando que vivemos em uma aldeia global, a tendência é de que as fronteiras que limitam o acesso entre os países devem diminuir cada vez mais e uma das consequências é o fato de se buscar alternativas que facilitem a desburocratização das concessões de entrada. O interesse principal entre os países é promover as trocas comerciais ao mesmo tempo em que viabilizam as viagens, desencadeando a movimentação da economia.

No que tange ao turismo, deve-se lembrar que a questão dos vistos de entrada é fundamental, pois, quando se menciona a atividade turística como um todo, costuma-se pensar apenas nas viagens de lazer, mas devemos incluir todos os tipos de viagem – a negócios, para eventos, de intercambio ou de férias... Por isso, a iniciativa do governo brasileiro, que implantou desde o fim do ano passado o e-Visa – o visto eletrônico para australianos e, a partir de janeiro, para americanos, canadenses e japoneses –, demonstra uma decisão estratégica que pretende captar turistas com diferentes motivações e, consequentemente, injetar dinheiro na economia brasileira.

A cadeia produtiva do turismo não inclui apenas transporte e hotéis, mas cerca de 50 segmentos da economia

Segundo dados da Organização Mundial do Turismo (OMT), medidas como essa podem incrementar em até 25% o fluxo de turistas, sendo que o Ministério do Turismo prevê que visitantes desses países poderão desembolsar quase US$ 800 milhões no país. Para entender melhor as vantagens que essa medida terá para os turistas estrangeiros, podemos imaginar que quando nós, brasileiros, viajamos para o exterior, gastamos nosso dinheiro lá fora com hotéis, compras, restaurantes etc. Nesse caso, há uma evasão de divisas e contribuímos com a economia do país visitado, gerando empregos e riquezas lá. Quando recebemos turistas estrangeiros, a mesma situação ocorre, só que inversa. Há uma injeção de divisas no Brasil, pois os turistas gastarão seu dinheiro com bens e serviços oferecidos nos destinos turísticos brasileiros, além de gerar empregos e riquezas aqui.

Portanto, quanto mais turistas pudermos receber, mais movimentada será a cadeia produtiva do turismo, promovendo um ciclo econômico virtuoso em todo o país. Quando mencionamos a cadeia produtiva do turismo, vale destacar que não nos referimos apenas ao transporte e aos hotéis, mas a cerca de 50 segmentos da economia que são impactados direta ou indiretamente pelo turismo. A analogia mais comum que fazemos para exemplificar essa questão é a do iceberg, em que a ponta visível da cadeia produtiva do turismo é aquela que todos comumente conhecem, como as agências de viagens, os meios de hospedagem e transportes e os guias de turismo. No entanto, a parte mais volumosa do iceberg não está visível e corresponde a uma série de outros setores envolvidos – desde a produção primária que inclui os hortifrutigranjeiros que serão servidos no restaurante até a matéria-prima do artesão para a confecção do souvenir –, sem falar na arrecadação de impostos que se beneficia do consumo gerado pelos turistas. O dinheiro arrecadado com tributos contribui para a manutenção e construção de todo tipo de infraestrutura pública no Brasil, como estradas, hospitais e creches.

Nosso país reconhecidamente tem atrativos naturais e culturais ímpares. Também tem uma das cidades mais importantes para se fazer negócios do mundo. Entretanto, pouco se investe em infraestrutura e qualificação profissional para garantir que o país se consolide como destino turístico internacional.

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Na contramão do mundo, em que o turismo tem uma contribuição relevante no PIB de muitos países, o Brasil ainda tem muitos desafios a serem superados. Com a iniciativa de implantar o visto eletrônico, pode dar sinais ao mundo de sua vontade em estreitar as relações exteriores, já que a concessão se refere à confiança existente entre os países.

Para o governo japonês, citado pela Comex do Rio de Janeiro, o cônsul-geral do Japão, Yoshitaka Hoshino, afirmou que o novo sistema demonstra a “confiança prestada pelo governo brasileiro ao povo japonês” e que o e-Visa deve aumentar a demanda do mercado japonês pelo destino Brasil, que está atento a uma fatia dos 17 milhões de turistas japoneses que já viajam pelo mundo anualmente.

Assim, quem sabe, pelo viés do turismo, será possível alavancar a economia nacional com o que mais temos no país, que é a nossa terra e a nossa gente, por meio da valorização das nossas riquezas culturais, das belezas de nossos recursos naturais e da hospitalidade inerente ao brasileiro.

E a reciprocidade? E se Austrália, Canadá, Japão e EUA não implantarem vistos eletrônicos para brasileiros? Talvez esse seja um aspecto que possa ser conquistado pelo governo brasileiro quando demonstrar que está disposto a promover um país mais justo para seus cidadãos, quando alcançar patamares de desenvolvimento social mais dignos e sustentáveis.

Raquel Panke, turismóloga e doutora em Gestão Urbana, é professora da Escola de Educação e Humanidades da PUCPR.
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