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| Foto: Yasuyoshi Chiba/AFP

Das colunas sociais para as páginas policiais, Eike Batista viu seu conto de fadas ruir ao vincular seus negócios a políticos. E jamais imaginaria que suas relações com Sérgio Cabral terminariam com um mandado de prisão contra ele dois meses depois da prisão do ex-governador do Rio de Janeiro. Cabral foi indiciado na Lava Jato e preso preventivamente por suspeita de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Eike é suspeito de pagar propina de US$ 16,5 milhões ao ex-governador usando bancos estrangeiros.

A amizade entre Eike e Cabral começou em 2006. Como diz o ditado, os dois juntaram a fome com a vontade de comer durante um café da manhã na mansão do empresário no Rio, local onde, na semana passada, agentes da Polícia Federal tentaram prendê-lo. Na época, Cabral precisava de um financiador com a carteira recheada; Eike precisava de um político que pudesse resolver eventuais entraves que atrapalhassem os seus negócios. Cabral recebeu R$ 400 mil de Eike e venceu a eleição.

Já no poder, segundo a jornalista Malu Gaspar no livro Tudo ou Nada — Eike Batista e a verdadeira história do Grupo X, “Cabral franquearia os gabinetes do governo a Eike”. E quando se deparava com qualquer dificuldade, “bastava [ao empresário] recorrer ao governador, que pegava o telefone imediatamente e emitia uma ordem a algum subordinado resolvendo a situação”. Um exemplo? Cabral ordenou que o secretário de Meio Ambiente, Carlos Minc, desse prioridade absoluta ao projeto do Porto de Açu, que necessitava com urgência de licença ambiental. E assim foi feito.

O Barão de Mauá e Eike Batista ignoraram as advertências sobre fazer negócios com o governo e foram à bancarrota

A relação entre os dois tornou-se tão íntima que Cabral e a mulher, Adriana Ancelmo, hoje também presa em Bangu, usaram diversas vezes os aviões de Eike para passear e cumprir agenda oficial. Foi num dos jatos de Eike que Cabral viajou em 2009 junto com Eduardo Paes, então prefeito do Rio, para participar da cerimônia que anunciou a cidade como sede dos Jogos Olímpicos de 2016.

No ano seguinte, em 2010, o jato Legacy 600 do empresário levou para as Bahamas Cabral, a mulher, os dois filhos mais duas babás e a mulher do empreiteiro Fernando Cavendish, que tinha contratos de mais de R$ 1 bilhão com o governo do Rio. Em prisão domiciliar desde o ano passado, Cavendish revelou o esquema de desvio de dinheiro envolvendo Cabral em depoimento para negociar sua delação premiada. E disse ter comprado uma joia de R$ 800 mil a pedido do governador, que a deu de presente para a mulher.

No ano seguinte, a relação entre Cabral e Cavendish foi revelada ao país após uma tragédia que se seguiu a mais uma viagem realizada pelo governador num jato de Eike. Dessa vez, o destino foi a cidade de Porto Seguro, na Bahia, para comemorar o aniversário do empreiteiro. Mas, no trajeto entre o aeroporto e o resort onde ficaria hospedado o grupo do governador, o helicóptero caiu, provocando a morte de sete pessoas. Mais tarde, Cavendish ficou preso no mesmo local onde hoje Cabral está detido.

E a propina paga por Eike a Cabral? Na semana passada, a jornalista Malu Gaspar revelou detalhes no site da revista Piauí . Em 2010, Cabral procurou Eike para fazer um pedido inusitado: queria um “pagamento pelo ‘conjunto da obra’ de seu governo em favor das empresas X”. Disse que pretendia garantir o futuro dos filhos. Os US$ 16,5 milhões foram depositados pouco tempo depois.

Dez anos atrás, naquele encontro que selou a amizade entre Eike e Cabral, o empresário decidiu ignorar a orientação de seu pai Eliezer para não financiar campanhas políticas. No século 19, o escocês Richard Carruthers deu conselho parecido ao sócio brasileiro, o Barão de Mauá: não se meter em negócios com o governo. Mauá e Eike ignoraram as advertências e foram à bancarrota. Mauá, que era empresário de verdade, recuperou-se, pagou todas as dívidas e ficou rico novamente. Quanto a Eike, antes de refazer a vida, poderá ter a chance de repetir o café da manhã com Cabral. Mas em condições um tanto distintas e num espaço ironicamente inaugurado pelo ex-governador em 2008: Bangu 8.

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