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Em dezembro, um leitor enviou-me um e-mail comentando o artigo “Um Deus implacável”, comparando as ideias do texto com a imagem de Deus defendida por Spinoza, um dos mais importantes filósofos da história. Seria cansativo continuar no tema naquela época, mas, em meio às mazelas da política nacional, vale a pena voltar nossos olhos para o alto mais uma vez.

A imagem de Deus defendida por Spinoza é recorrente na história e muito comum nos dias atuais (mesmo que as pessoas nem se deem conta de suas raízes históricas).

Já na Grécia Antiga os filósofos estoicos propuseram um Deus que era não uma pessoa, mas a própria harmonia universal, a força criadora do real (conceito que tem muita proximidade com o budismo). Afastavam-se, deste modo, da imagem dos deuses gregos, representados como pessoas que tinham os mesmos temperamentos, defeitos e virtudes dos humanos.

A este Deus harmônico e impessoal corresponde uma ética de harmonia interior e nas relações sociais, para que o ser humano possa “sintonizar” seu próprio ser com a harmonia universal.

A peculiaridade do Deus-pessoa é que sua existência não pode ser verificada por um discurso racional

“Mente sã em corpo são”, práticas de meditação, busca por dietas saudáveis ou modos de vida alternativos são em grande parte devedores dessa visão de Deus, da realidade e do humano. Alguns leem essas ideias de modo mais religioso, outros de modo mais profano, mas o que se busca é a harmonia que está na essência de tudo.

Spinoza se vinculou a essa corrente de pensamento e, como lembra nosso amigo leitor, Einstein também. Ficou clássica a sua resposta a um rabino: “Acredito no Deus de Spinoza, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no Deus que se interessa pela sorte e pelas ações dos homens”.

Os grandes monoteísmos (judaico-cristão e islâmico) se afastaram dos deuses humanizados dos gregos e dos animismos, mas julgam conhecer um Deus pessoal, que é mais do que uma harmonia: é um ser capaz de importar-se com cada ser humano.

Qual das duas visões estará certa? Ou ambas estão erradas? A peculiaridade do Deus-pessoa é que sua existência não pode ser verificada por um discurso racional. Nenhuma análise lógica pode nos provar que uma determinada pessoa existe. Para ter certeza de que ela existe, temos de fazer a experiência de nos encontrarmos com ela.

Alguns de nós dizem ter encontrado essa pessoa divina em suas vidas. Outros afirmam que isso é impossível. Mas é uma questão de experiência pessoal, não de teoria abstrata. Por isso, crentes e não crentes se entendem quando compartilham sua experiência humana e guerreiam quando querem impor suas ideias.

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