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| Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

A absoluta falta de consenso entre os deputados a respeito dos diversos itens da reforma político-eleitoral levou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e os líderes dos partidos a optar pelo fatiamento da proposta, para não haver o risco de o texto todo cair por causa de um ou outro trecho. E, nesse processo, o primeiro teste feito pela Câmara foi feito com o “Fundo de Financiamento da Democracia”, o tal superfundo bilionário que o relator, o petista Vicente Candido, tinha incluído na reforma para que o dinheiro do contribuinte banque os partidos, incapazes de fazer campanhas gastando pouco.

Por 441 votos a um, os deputados decidiram que o fundo não deveria ser composto por uma porcentagem fixa da receita da União – a proposta inicial era de 0,5% da receita, o que levou a estimativas de cerca de R$ 3,5 bilhões para 2018. Mas há um pulo do gato aqui, pois não faria sentido que a Câmara votasse a composição do fundo sem ter nem sequer aprovado a sua criação. É muito mais provável que o resultado de quarta-feira tenha sido muito mais uma maneira de entregar à opinião pública um anel e preservar o dedo: os deputados rejeitam o escandaloso valor de R$ 3,5 bilhões para o fundo, esperando que a população se satisfaça com isso, quando mantêm o plano de bancar suas campanhas com recursos públicos.

Este é o típico de caso de parlamentares legislando única e exclusivamente em causa própria

O próprio relator já havia dado como perdida a briga por 0,5% da receita da União dias antes da votação. Disse que os deputados ficaram surpresos com a repercussão negativa da proposta – como se a população devesse ficar entusiasmada com a possibilidade de que o dinheiro de seus impostos fosse destinado a campanhas políticas, em vez de outras prioridades – e que deixaria a batata quente para os responsáveis pela elaboração do orçamento federal, não sem antes dar uma sugestão: “R$ 2 bilhões é um valor razoável”, afirmou. Ora, se essa quantia é “razoável”, por que Candido pretendia abastecer o fundo com um valor 75% maior? Ou o deputado está apenas lançando ao vento números sem critério, na esperança de que algum deles conte com a aprovação popular?

Que ainda estejamos, a essa altura do campeonato, discutindo financiamento público de campanha é uma demonstração do enorme abismo que separa a classe política da população. Este é o típico de caso de parlamentares legislando única e exclusivamente em causa própria. Ao contrário do que insinua o eufemístico nome escolhido para o fundo eleitoral, a democracia não se fortalece quando o dinheiro do contribuinte é usado para bancar partidos e pessoas que, muitas vezes, ele não gostaria de ver eleitos; a democracia se fortalece quando os partidos têm plataformas autênticas, que animem o cidadão a ponto de ele contribuir voluntariamente para que essa legenda tenha os meios de eleger seus candidatos.

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A criação do superfundo bilionário ainda não está enterrada – na verdade, talvez ela seja o item da reforma político-eleitoral que goze de maior consenso entre os deputados. Mas eles se enganam se pensam que a indignação popular foi motivada apenas pelo número escandaloso de R$ 3,5 bilhões – é a própria ideia de os partidos ficarem com uma enorme soma de dinheiro do cidadão, tomado por meio da cobrança de impostos, que revolta o brasileiro. Ele vê, diariamente, os efeitos do mau uso dos recursos públicos. Ele ouve dia sim, dia também o presidente da República e a equipe econômica afirmando que não há dinheiro para um sem-número de órgãos e serviços. Como poderia, então, haver bilhões para campanhas eleitorais?

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