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Depende apenas de um ato do presidente do Tribunal de Contas do Estado, Ivan Bonilha, a implantação de mais um privilégio a agentes públicos paranaenses: a concessão do auxílio-moradia para conselheiros e auditores do TCE, além dos procuradores do Ministério Público de Contas (MPC). São 20 servidores que passariam a receber mais R$ 4,4 mil mensais. Dinheiro proveniente do caixa estadual, que está em situação dolorosa.

É até possível que a proximidade entre Bonilha e o governador Beto Richa, que vem contando cada centavo que pode economizar em seu esforço para colocar em ordem as contas do estado, ajude a frear a voracidade dos conselheiros e auditores do TCE e membros do MPC. Mas, ainda que as dificuldades de caixa possam ser usadas agora como argumento para impedir a concessão do auxílio-moradia, essa jamais deveria ser a razão principal, ou mesmo um motivo relevante; isso equivaleria a dizer que, caso o estado estivesse nadando em dinheiro, o auxílio-moradia passaria a ser aceitável. Nada mais distante da verdade. Há razões muito mais sólidas para que o TCE recue e dê um tão necessário exemplo ao Judiciário e ao Ministério Público, que não tiveram o menor pudor em empenhar dinheiro público em privilégios disfarçados de direitos.

Um verdadeiro auxílio-moradia consistiria no ressarcimento das despesas daqueles que, por terem de trabalhar em uma cidade diferente daquela onde têm residência, precisassem alugar um imóvel ou recorrer à rede hoteleira. O agente público – juiz, procurador, conselheiro – apresentaria a fatura das despesas com moradia e receberia de volta esse valor. Isso constituiria o caráter indenizatório do auxílio. No entanto, o benefício que o TCE busca para si é a repetição daquilo que magistrados e o MP se concederam: um mero adicional financeiro, cujo valor não tem a menor ligação com os preços do mercado imobiliário local e do qual não se exige nenhuma prestação de contas – ou seja, o beneficiário pode usar os R$ 4,4 mil como bem entender, e não precisa comprovar que o dinheiro foi gasto com despesas relacionadas à moradia. Isso jamais pode ser considerado verba indenizatória, por mais que os interessados digam o contrário. Trata-se única e exclusivamente de aumento salarial por vias tortas.

Ninguém é “obrigado” a esbanjar dinheiro do contribuinte paranaense ou brasileiro, mesmo que todos os demais o estejam fazendo

Assim como nos outros casos de concessão de auxílio-moradia, os integrantes do TCE e MPC têm seus salários vinculados aos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que têm tido reajustes defasados na comparação com a inflação. É justo que não se aceite perdas salariais, mas existe um caminho legítimo para se pleitear aumentos: o Congresso Nacional. Usar o auxílio-moradia para contornar essa questão é imoral e demonstra desrespeito pela população que banca o TCE com seus impostos e elegeu representantes para que decidissem inclusive quanto devem ganhar aqueles que servem à população.

Quando se trata de defender o auxílio-moradia, os interessados sacam imediatamente a palavra-chave “isonomia”. “Se os outros recebem, por que não nós?” é o pensamento predominante. Foi assim com o presidente da Associação dos Magistrados do Paraná quando se decidiu o benefício para os juízes. Agora, o conselheiro Fernando Guimarães diz que “a resolução nada mais fez do que aplicar ao TC tudo o que está sendo aplicado no Brasil e no Paraná” e chega ao ponto de falar em “obrigação de aplicar esta medida”. É um argumento de pobreza ímpar. Ninguém é “obrigado” a esbanjar dinheiro do contribuinte paranaense ou brasileiro, mesmo que todos os demais o estejam fazendo.

Esta é a hora de demonstrar nobreza. Infelizmente, outras categorias – mesmo constituídas em sua grande maioria por pessoas conscientes, sensatas e bem formadas – foram vencidas pela cegueira quando entraram em jogo os próprios interesses, e se renderam ao patrimonialismo e ao corporativismo. Buscar a “isonomia” com o Judiciário e o MP significa igualar-se na imoralidade, no desprezo pela sociedade, na fome por privilégios. Ainda há tempo de o TCE recuar e fazer o que outros não souberam fazer quando tiveram a oportunidade: liderar pelo exemplo.

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