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Quando Dilma Rousseff, já reeleita, não precisou mais enganar o eleitorado com afirmações de que a economia estava indo muito bem e os indicadores estavam sob controle, ela saiu à procura de um ministro da Fazenda que consertasse o estrago feito pela “nova matriz econômica” que a própria Dilma tanto prestigiou, e que trouxesse alguma credibilidade – algo que faltava a Guido Mantega, alvo de piada internacional por suas previsões totalmente descoladas da realidade e cuja permanência no governo já estava descartada por Dilma desde antes do primeiro turno.

Quem aceitou a missão foi Joaquim Levy, PhD em Economia pela Universidade de Chicago, conhecida por seu viés liberal (tudo o que estatistas como Dilma e grande parte do PT abominam); secretário do Tesouro Nacional entre 2003 e 2006, na época em que Lula ainda dava sequência à política econômica herdada de Fernando Henrique Cardoso e que tinha conquistado a estabilidade da moeda; e, mais recentemente, diretor-superintendente do banco Bradesco. Não havia dúvidas de que era um nome com capacidade de tirar as contas públicas do buraco em que Dilma e Mantega as meteram; a grande dúvida era o grau de autonomia que Levy teria na condução da política econômica, não apenas porque Dilma é uma centralizadora contumaz, mas porque outros membros do ministério, como o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, estavam mais alinhados com as convicções de Dilma/Mantega que com as de Levy.

O que falta a Levy é a habilidade política, a sagacidade nas negociações que lhe permitiria se impor

O episódio vergonhoso da lei orçamentária de 2016, que de forma inédita prevê déficit primário para o país, é a prova mais recente do desempenho de Levy na queda de braço contra as forças da gastança. No sábado passado, ele estava no interior de São Paulo e foi chamado por Dilma às pressas para uma reunião sobre o orçamento, na qual ele foi meramente comunicado das decisões, tomadas por Barbosa e por Aloizio Mercadante, ministro-chefe da Casa Civil e outro economista da ala estatizante, que em 1994 pontificou que “o Plano Real não vai superar a crise do país”. Levy queria mais cortes, Dilma recusou. Tem sido assim já há algum tempo.

O que não se pode questionar é a lealdade do ministro, que mesmo assim leva rasteiras de outros membros do governo. O liberal de Chicago chegou a peregrinar entre empresários para convencê-los a engolir a recriação da CPMF, da qual o próprio Levy discordava. Mas, enquanto passava o chapéu, o governo desistiu do imposto e se esqueceu de avisar o ministro, como conta o colunista Elio Gaspari na Gazeta do Povo desta quarta-feira, dia 2. Mesmo contrariado com o orçamento de 2016, é Levy quem vai buscar apoio no Congresso para fechar o buraco de R$ 30,5 bilhões. Ele realmente acredita no que diz quando defende mais carga tributária nas costas dos brasileiros?

Capacidade e as ideias certas não faltam a Levy; o que lhe falta, como já afirmamos em outras ocasiões, é a habilidade política, a sagacidade nas negociações que lhe permitiria se impor diante de seus adversários no governo. Um episódio narrado pela jornalista Miriam Leitão em seu livro Saga brasileira mostra a importância desse traquejo. No início de 1994, o texto da medida provisória que instituiria o Plano Real estava sendo apresentado em uma reunião ministerial, com a participação do então presidente da República, Itamar Franco. O ministro do Trabalho, o ex-sindicalista Walter Barelli, apresentou várias oposições e Itamar ficou tentado a adotar uma solução que, na prática, desfiguraria o plano. Fernando Henrique, ministro da Fazenda, ameaçou se demitir – não uma, mas três vezes durante aquela reunião. Sua posição prevaleceu e o resultado foi a estabilização econômica.

Claro, a situação do Brasil de 1994 era muito pior que a do Brasil de 2015, mas Levy é para Dilma um fiador com o mesmo valor que FHC tinha para Itamar. O problema é que, enquanto o folclórico ex-presidente confiava em seu ministro da Fazenda, a centralizadora Dilma parece não ter o mesmo sentimento e reduz cada vez mais o espaço de Joaquim Levy, por mais que em público diga o contrário, como fez nesta quarta-feira, dia 2, falando a jornalistas. Ela não o demite por saber da confiança que o mercado coloca nele, mas o que Dilma fará se um dia Levy concluir que a possibilidade de contribuir para um Brasil melhor já não compensa todo o desgaste a que a presidente lhe submete?

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