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No início, quando algo dava errado no governo petista, a culpa era sempre da “herança maldita”, termo cunhado por Lula para se referir às consequências dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso. Falava-se dessa herança sempre em termos genéricos, sem especificar se, por exemplo, faziam parte dela o Plano Real, que abateu a hiperinflação; a Lei de Responsabilidade Fiscal, que colocou freio na gastança irresponsável dos governos; as privatizações, que, se ainda não resultaram em serviço comparável ao dos países desenvolvidos em áreas como telefonia, deixaram para trás a época em que linhas tinham de ser declaradas no Imposto de Renda; ou o Proer, que reestruturou o sistema bancário brasileiro. A tese da “herança maldita” ganhou força especial porque o PSDB, na oposição, pouco ou nada fez para defender as medidas de FHC e também não fez questão de lembrar aos brasileiros que o PT foi contrário a praticamente todas elas.

A presidente se supera de forma impressionante na ânsia de buscar culpados externos para a crise

À medida que o tempo foi passando e a tese da “herança maldita” perdia força, pois o PT já estava no poder havia tempo suficiente para ter desfeito todo o “mal” praticado por FHC, surgiu um novo culpado para a recessão que já vinha dando sinais desde 2014: a “crise internacional”. Se o Brasil não estava mais avançando, era porque o mundo todo estava parado. Foi o que Dilma Rousseff afirmou durante toda a campanha da reeleição e seguia afirmando até agora. A realidade, no entanto, a desmentia: enquanto o Brasil estacionava, com 0,1% de crescimento no PIB em 2014, Estados Unidos, Reino Unido e Japão registravam avanços na casa dos 2%; os países mais encrencados da zona do euro, como Irlanda, Portugal, Espanha e até mesmo a Grécia, cresceram mais que o Brasil. Entre nossos vizinhos, só Argentina e Venezuela tiveram desempenho pior que o nosso. Para 2015, enquanto o FMI prevê retração de 1,5% no PIB brasileiro, a estimativa de crescimento é de 3,3% para a média mundial, 2,1% para os países desenvolvidos, 1,5% para a zona do euro, 4,2% para os países emergentes e 0,5% para a América Latina e Caribe.

Mas agora a presidente Dilma encontrou outro culpado. Em reunião com ministros na segunda-feira, dia 27, ela disse que “a Lava Jato influenciou na redução da atividade econômica em 1%. Não foi isso, Nelson?”, referindo-se a Nelson Barbosa, ministro do Planejamento, segundo relato dos jornalistas Gerson Camarotti e Cristiana Lôbo. O raciocínio é o de que, com as principais empreiteiras do Brasil sob investigação, os setores de construção civil e gás e energia foram afetados. Se o cálculo é exato ou não, importa menos que a estarrecedora ideia de que uma operação de combate à corrupção seria a responsável pela recessão.

Ora, se existe uma Operação Lava Jato, é única e exclusivamente porque os partidos instalados no poder, não satisfeitos em aparelhar dos pés à cabeça a maior empresa estatal brasileira, resolveram pilhá-la em benefício próprio, contando para isso com a ajuda de empreiteiras em um esquema do qual todos, em maior ou menor grau, se beneficiavam. Dilma realmente preferiria que a roubalheira seguisse correndo solta na Petrobras, se isso garantisse um ponto porcentual de crescimento no PIB do país? Ainda é preciso repetir que, se todos se comportassem de maneira perfeitamente republicana, não haveria necessidade de nenhuma Lava Jato e talvez o país crescesse até mais, aplicando corretamente a fortuna que é hoje desviada pela corrupção? Após a repercussão negativa da declaração, o ministro do Planejamento se apressou em dizer que, embora a investigação tenha, sim, impacto econômico, ela é benéfica para o país. Mesmo assim, isso não anula o fato de que a presidente se supera de forma impressionante na ânsia de buscar culpados externos para algo que é resultado de sua própria incompetência na condução da economia.

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