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 | Wilson Dias/Agência Brasil
| Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

O país acordou no começo da semana sob uma crise institucional. Dois dos três poderes da República engalfinharam-se na defesa de seus territórios e, em nome desta “causa”, trocaram farpas verbais que não condizem com a litúrgica dignidade que deveria prevalecer em suas relações. O estopim do tiroteio foi a Operação Métis – deflagrada na sexta-feira passada, dia 21, por ordem do juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara Federal de Brasília –, que prendeu membros da Polícia Legislativa do Senado por suposta contraespionagem: eles estariam fazendo varreduras nas casas de senadores para identificar interceptações telefônicas, inclusive aquelas feitas legalmente, o que significaria obstrução da Justiça.

Uma avaliação sobre o mérito da operação não é fácil. Que os policiais do Senado não têm foro privilegiado é evidente. Assim como políticos podem, sim, contar com ajuda para saberem se estão sendo ilegalmente grampeados. Mas é possível que um juiz de primeira instância ordene busca e apreensão na sede de um outro poder – no caso, o Legislativo? É uma pergunta cuja resposta caberá ao Supremo Tribunal Federal. E mais: sabe-se que os senadores beneficiados pelo serviço são investigados em operações como a Lava Jato. E a ordem de prisão parece partir da presunção de que eles estavam, sim, sendo objeto de escutas autorizadas. Mas como um juiz de primeira instância saberia disso, se tais interceptações são autorizadas pelo STF e mantidas sob sigilo?

A presidente do STF, Cármen Lúcia, também não achou o melhor caminho ao lidar com a situação

De qualquer modo, ainda que haja motivos para questionar a ordem judicial, o presidente do Senado, Renan Calheiros, perdeu toda a compostura. Comparou a invasão de dependências do Senado a atos típicos de regimes de exceção e fascistas. Referiu-se ao juiz Oliveira como “juizeco”. E, quando o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, justificou a ação da PF, Calheiros reagiu chamando-o de “chefete de polícia”.

A troca de petardos foi suficiente para que o presidente Michel Temer se movesse para colocar água fria na fervura e tentar costurar encontros entre os três protagonistas do bate-boca. Ao presidente interessa evitar embaraços à tramitação no Congresso de matérias importantes do governo, dentre as quais a urgente emenda constitucional que fixa teto para despesas nos três poderes, a PEC 241. Temer depende da boa vontade de Calheiros, agora que o texto já passou pela Câmara. Mas o presidente do Senado já adiantou que não estará no lançamento do Pacto Nacional pela Segurança Pública, na sexta-feira. “Eu terei muita dificuldade de participar de qualquer evento que tenha a presença do ministro da Justiça”, alegou.

E a presidente do STF, Cármen Lúcia, também não achou o melhor caminho ao lidar com a situação. Recusou um outro encontro, que deveria ter ocorrido nesta quarta-feira. E, já antes disso, na abertura de sessão do Conselho Nacional de Justiça, lançou a Renan Calheiros um desafio: “Não é admissível aqui, fora dos autos, que qualquer juiz seja diminuído ou desmoralizado. Quando um juiz é destratado, eu também sou”. Manifestar repúdio era necessário, mas não com essa expressão de corporativismo. Apontar o destempero de Calheiros e mostrar a ele que o modo de solucionar as controvérsias levantadas pela Operação Métis está nos canais institucionais teria sido um modo firme, mas conciliador, de colocar o senador em seu lugar.

O episódio, além de revelar despreparo nos altíssimos escalões do Legislativo e do Judiciário, ainda chama a atenção pela banalização da expressão “Estado de exceção”, usada por Calheiros para reclamar das prisões e das buscas. O termo ressuscitou pela boca dos acusados no mensalão e dos petistas que os aclamavam como “guerreiros do povo brasileiro”. Com a Lava Jato chegando perto de Lula, Renan e outros figurões, a tendência é que seja cada vez mais usado como estratégia de defesa. Nada mais falso, pois tanto as instituições democráticas quanto os mecanismos para corrigir erros e arbitrariedades funcionam plenamente no país. “Estado de exceção” seria aquele em que se ganha no grito – exatamente como quis fazer Calheiros.

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