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| Foto: Paulo Pinto/Gazeta do Povo

“O PT é a legenda preferida, com o dobro da preferência dos tucanos e do PMDB”, disse o ex-presidente Lula quando deixou seu local de votação, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Mas, quando os dados das urnas eletrônicas começaram a aparecer, a realidade desmentiu o petista. Nem mesmo seu filho Marcos, candidato a vereador em São Bernardo, conseguiu a reeleição. A derrota caseira foi mero reflexo de uma catástrofe ainda maior.

O partido, que tinha conquistado 630 prefeituras em 2012, só garantiu o comando de 256 cidades no último domingo, uma queda de quase 60% que rebaixou a legenda de terceira para a décima força em número de prefeituras – na melhor das hipóteses, caso vença todas as disputas de segundo turno em que está presente, o PT teria 263 cidades. Entre as capitais brasileiras, o PT só conquistou Rio Branco (AC) e foi para o segundo turno em Recife (PE), tendo amargado derrotas especialmente dolorosas, como em São Paulo, onde o prefeito Fernando Haddad perdeu já no primeiro turno para o tucano João Dória Jr. Em Porto Alegre (RS), tradicional reduto da esquerda, Raul Pont manteve a segunda colocação nas pesquisas até o fim de agosto, mas perdeu fôlego e terminou fora do segundo turno, em terceiro lugar.

O partido cuja cúpula deu origem à “propinocracia” murchou eleitoralmente

Assim, opera-se uma mágica curiosa, especialmente nas mídias sociais e em comentários na imprensa. Até o último sábado, para parte da esquerda e seus defensores na academia e em outros ambientes, o voto popular era tão soberano que constituía até mesmo uma carta branca que legitimava crimes de responsabilidade e outras maracutaias – o “respeito aos 54 milhões de votos” não era o grande mote dos defensores de Dilma Rousseff? Mas, depois do domingo, o mesmíssimo voto popular passou a ser a expressão máxima do atraso, do conservadorismo provinciano, do “ódio das elites”... como os eleitores de 2014 são praticamente os mesmos de 2016, parece que estamos diante de um entendimento muito peculiar de “democracia” e de “respeito ao voto”, que só existem quando a esquerda vence.

Mas, se o partido cuja cúpula deu origem à “propinocracia” murchou eleitoralmente, com seus candidatos recebendo apenas 6,8 milhões de votos (outra queda de 60% na comparação com 2012, quando teve 17,3 milhões de votos), para onde foram todos esses eleitores? A julgar pela votação total de partidos como PDT, PSB ou PPS, que não tiveram grandes variações em seu desempenho considerando-se o total de votos recebidos, a esquerda mais tradicional não se beneficiou da derrocada petista. Mas tampouco isso ocorreu com a extrema-esquerda. Luciana Genro, do PSol, liderou as primeiras pesquisas em Porto Alegre para terminar em quinto lugar. A única – mas notável – exceção foi o Rio de Janeiro, que levou para o segundo turno Marcelo Freixo, também do PSol, um apoiador de black blocs que só resolveu moderar o discurso após a morte do cinegrafista Santiago Andrade, em fevereiro de 2014 (episódio, aliás, em que o nome de Freixo apareceu ligado a um dos acusados pela morte). Mesmo com a votação de Freixo, no entanto, o PSol perdeu eleitores entre 2012 e 2016, caindo de 2,4 milhões para 2,1 milhões de votos em todo o país.

Especialmente para o PT, o momento pede uma autêntica autocrítica. Seus líderes cultivaram, por anos, o hábito de buscar culpados externos para tudo de errado que ocorria em seus governos. Os grandes nomes do partido que acabaram atrás das grades eram aclamados como heróis. Essa postura jamais passaria incólume em um país que tem demonstrado menos tolerância com a corrupção, elevada pelo lulopetismo a níveis nunca antes vistos neste país. Se quiser assumir o papel de esquerda comprometida com a democracia e a lisura no trato da coisa pública, o partido precisará rever todas essas práticas que cobraram seu preço no domingo.

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