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Nos anos 1980, o ponto central dos debates sobre a inflação e a incapacidade do governo em combatê-la era a expansão monetária. A cada mês, o governo fabricava mais dinheiro do que a soma do crescimento da produção mais a taxa de inflação mensal e isso era, para os economistas ortodoxos, a principal causa da inflação crônica. O estoque de moeda que circula deve ser adequado ao volume de produto transacionado e ao nível médio dos preços vigentes. E quando o governo emite dinheiro acima do crescimento nominal do Produto Interno Bruto (PIB), os preços acabam subindo como forma de adequar o estoque de moeda circulante ao volume de bens e serviços negociados.

Todavia, a emissão de moeda não acontece sem motivo. A causa primária e mais importante da emissão é o déficit público. Quando o governo gasta mais do que arrecada, há somente três saídas para o problema: aumentar os impostos, tomar dinheiro emprestado ou emitir moeda. Durante décadas, o Brasil adotou a prática nociva de cobrir os déficits governamentais com emissões monetárias, sem que a população percebesse que a inflação daí resultante é um imposto perverso e sem lei. A cultura da austeridade monetária demorou a ser incorporada aos costumes políticos e às crenças populares. Foi somente com o Plano Real que governo e sociedade passaram a condenar a emissão de dinheiro de forma irresponsável, pois o sucesso do plano fez o País sentir os benefícios de viver sem inflação.

Agora, nestes primeiros meses de 2011, a inflação está de volta, não nos níveis daqueles fatídicos anos 1980, mas o suficiente para gerar preocupação. Várias são as explicações do fenômeno: aumento do déficit público no fim do governo Lula, elevação dos preços mundiais de alimentos, explosão das cotações do barril de petróleo e excesso da demanda sobre a capacidade produtiva do País. São explicações verdadeiras, com impactos diferentes na subida da inflação nos últimos seis meses e que não esgotam todas as causas do retorno da elevação dos preços acima da meta do Banco Central. O que chama a atenção é o completo esquecimento da expansão monetária como uma das causas da inflação e a falta de debate público sobre o tema. Nesse momento, é útil retomar esse tema e recolocá-lo na pauta dos debates econômicos. Somente nos últimos cinco anos, a base monetária dobrou, passando de R$ 98,3 bilhões em 2005 para R$ 197,4 bilhões em 2010. No fim de 1994, primeiro ano do Plano Real, o saldo da base monetária era de R$ 17,3 bilhões, tendo aumentado, portanto, quase 11 vezes até o fim do ano passado. Os meios de pagamentos, no conceito M1, que incluem o papel-moeda em poder do público mais os depósitos à vista nos bancos, saíram de R$ 20,9 bilhões em fim de 1994 para R$ 142,5 bilhões em 2005 e R$ 279,6 bilhões em 2010, o que dá um aumento de 12,4 vezes nos últimos 16 anos. São números que podem parecer complexos para a maioria da população, mas que permitem tirar algumas conclusões quando comparados, por exemplo, com o índice de preços medido pelo IPCA, que aumentou 3,6 vezes desde 1994 até dezembro passado.

Quando se analisa o aumento dos meios de pagamentos de 12,4 vezes contra aumento dos preços de "apenas" 3,6 vezes desde a implantação do Plano Real, é necessário considerar que o PIB real aumentou em todo esse período, ajudando a diminuir os efeitos nocivos da expansão monetária. Porém a pergunta que fica é: terá o PIB aumentado tanto ao ponto de justificar a expansão da moeda nesses níveis? A princípio, parece que não, e isso sugere que o tema da austeridade monetária precisa voltar à cena dos debates. Inflação é um imposto sem lei e um mal que desorganiza todo o sistema econômico, tendo se tornado consenso mundial que ela é um mal e deve ser combatida sem tréguas. Economistas de prestígio chegam a propor que o governo e o Banco Central percam poder de emitir moeda acima do crescimento do PIB e passem a depender de autorização do Poder Legislativo.

A inflação é como uma doença crônica que, se bem controlada, permanece inerte no organismo sem se manifestar, mas que, ao primeiro descontrole, volta de maneira voraz e produz os estragos típicos de sua lógica. O fato é que a inflação não se extermina; apenas se controla. Isso exige atenção constante e combate permanente das causas. É por medo da inflação que o mundo está prestando atenção acurada nas medidas econômicas dos países deficitários, Estados Unidos à frente, pois o rumo da inflação mundial dependerá do que fizerem os países que estouraram os gastos públicos antes da crise, durante a crise e depois da crise.

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