• Carregando...
 | Luís Macedo/Câmara dos Deputados
| Foto: Luís Macedo/Câmara dos Deputados

Nas três esferas de governo, não são poucos os mandatários que, antes ou depois da eleição, prometem montar ministérios ou secretariados de “notáveis”: os melhores nas suas áreas de atuação, vindos não necessariamente da política, mas da academia ou do setor privado, por exemplo. Tais esforços costumam durar pouco, infelizmente, soterrados pela realpolitik em que cargos de primeiro escalão são o preço a pagar pelo apoio parlamentar. Michel Temer manifestou intenção semelhante, mas que não resistiu nem mesmo até o dia da posse. Ao assumir a Presidência da República interinamente em maio de 2016, após o afastamento de Dilma Rousseff, em vez dos “notáveis” (com exceção, talvez, da equipe econômica), ele colocou na Esplanada os amigos de longa data – gente do naipe de Geddel Vieira Lima, Moreira Franco, Eliseu Padilha e Romero Jucá – e os indicados pelos partidos com os quais pretendia governar.

E, se a excelência nas respectivas áreas de atuação nunca foi exatamente o critério geral para as nomeações ministeriais de Temer, nas últimas semanas ficou ainda mais difícil afastar a impressão de que “qualquer um serve”. Duas circunstâncias forçaram o presidente a caçar novos nomes para seu ministério: a primeira foi o desembarque do PSDB, que levou à saída de ministros como Bruno Araújo (Cidades) e Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo), enquanto Aloysio Nunes (Relações Exteriores) permaneceu como integrante da “cota pessoal” de Temer e Luislinda Valois (Direitos Humanos) deixou o partido para não interromper seu “trabalho escravo” na Esplanada. A segunda é a saída de ministros interessados em se candidatar nas eleições de 2018 e que resolveram não esperar até abril para entregar os cargos – foi o caso de Ronaldo Nogueira (Trabalho) e Marcos Pereira (Indústria, Comércio Exterior e Serviços).

Temer pode encerrar seu mandato com um ministério notável não por sua excelência, mas por sua inépcia

Para o lugar de Imbassahy, Temer nomeou o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), que não demorou a demonstrar seus dotes para a articulação política e a negociação: chantageou abertamente os governadores que pleiteiam repasses de bancos públicos, dizendo que, se eles não convencerem suas bancadas a votar em favor da reforma da Previdência, poderão esperar sentados. “O governo espera que aqueles governadores que têm recursos a serem liberados, financiamentos a serem liberados, o governo espera desses governadores, como de resto de todos os agentes públicos, uma reciprocidade no que tange a questão da Previdência”, afirmou. Diante da reação totalmente justificada dos governadores e da opinião pública, Marun se justificou dizendo que tais repasses são “ações de governo”, como se o critério para tais liberações não fosse o da necessidade e do interesse público, mas o da conveniência política. Ao agir assim, Marun danifica o esforço para a aprovação das necessárias mudanças no sistema previdenciário – justamente o oposto do que se espera de um negociador.

Mas foi na busca por um substituto para Ronaldo Nogueira que Temer se superou, nomeando Cristiane Brasil (PTB-RJ), mais conhecida por ser filha de Roberto Jefferson, delator do mensalão e que, na qualidade de presidente nacional do partido, teve a iniciativa de sugerir ao presidente que colocasse Cristiane na Esplanada. Logo após o anúncio, Jefferson disse que a nomeação representava um “resgate da família”, em estilo semelhante ao dos políticos pegos em pilantragens e que, quando reeleitos, dizem que “as urnas os absolveram”. Para aumentar o escândalo, Cristiane – cuja posse, originalmente marcada para esta terça-feira, está suspensa por ordem judicial – tem condenações justamente na área trabalhista, e sua saída do Congresso permitirá a posse de um suplente condenado por exploração sexual de crianças e adolescentes e estupro de vulnerável.

Leia também: Luislinda, escrava de mentirinha (editorial de 4 de novembro de 2017)

Leia também: Promessa ignorada (editorial de 3 de novembro de 2017)

Até abril, Temer ainda deve perder mais dez ministros que já anunciaram a intenção de disputar algum cargo em outubro, enquanto outros ainda não tomaram sua decisão, incluindo Henrique Meirelles (Fazenda), que sonha com o Planalto. Se a substituição desses nomes seguir o padrão que norteou as escolhas de Carlos Marun e Cristiane Brasil, Temer encerrará seu mandato com um ministério notável não por sua excelência, mas por sua inépcia.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]