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Pouco menos de três meses depois de ter aprovado o fim do regime de comissão geral – o famigerado “tratoraço” –, mecanismo que permitia a tramitação em tempo recorde de projetos, a Assembleia Legislativa do Paraná pode ressuscitar a medida com nova roupagem. Pela proposta, feita pelo corpo técnico da Alep, os projetos submetidos em regime de urgência poderiam ser votados mesmo sem o aval das comissões temáticas responsáveis por sua análise, formato semelhante ao da comissão geral, usada pela última vez em 10 de fevereiro, na sessão que tentou aprovar medidas do pacote de ajuste fiscal do governo estadual.

Esperemos que o “tratoraço” e as tristes lembranças que ele evoca sejam sepultados de vez e nunca mais retornem

Atualmente, todo projeto antes de entrar na ordem do dia precisa antes receber o parecer prévio das comissões, onde os temas podem ser debatidos e analisados e alterações podem ser sugeridas. Como cada projeto tem de passar por diversas comissões – o número varia de acordo com o teor da matéria –, a votação em plenário costuma demorar. Por isso, os técnicos da Alep pensaram num “jeitinho” de acelerar as coisas, propondo que os projetos que tramitem em regime de urgência só poderão ter vista concedida pelo prazo “improrrogável” de duas horas, bem menor que o atual, que é de um dia.

Também foi proposto que se as comissões não emitirem seu parecer sobre propostas em regime de urgência em 48 horas – como prevê o regimento interno da Casa –, os projetos entrariam na ordem do dia para votação em plenário. Caberá à Comissão Especial de Reforma do Regimento Interno da Alep avaliar as sugestões e incluí-las ou não no projeto de reforma que será votado pelos deputados. A análise deve ser concluída até o final de junho.

Embora seja necessário que existam formas de dar maior agilidade à tramitação de propostas urgentes – no âmbito estadual não existe mecanismo parecido com as medidas provisórias usadas pelo Executivo federal –, é preciso preservar e valorizar o debate entre os legisladores e também com a sociedade. Apenas acelerar o processo pela supressão do debate é pernicioso por não dar espaço para emendas e alterações que possam aprimorar as propostas. Afinal, é justamente esse o papel do Legislativo: propor, debater, aprimorar e votar medidas que atendam ao interesse público.

Mesmo diante de propostas antipáticas ou polêmicas, não é correto fugir da discussão por medo da reação dos próprios pares ou da população. O ideal democrático pressupõe que através do diálogo e do debate se chegue ao convencimento da maioria e consequentemente à aprovação da medida. Quando se torna mero figurante, votando e aprovando tudo o que lhe é proposto sem nada debater, o Legislativo perde sua razão de ser. As comissões temáticas da Alep também acabariam enfraquecidas com a ressurreição do “tratoraço”. Hoje elas possuem importante papel na análise dos projetos de lei, mas poderiam deixar de ser ouvidas justamente naqueles que tramitam em regime de urgência, que, normalmente, possuem conteúdo não só urgente, mas delicado, e que precisariam de tempo para poder ser melhor avaliados.

Além disso, a fórmula do “tratoraço” ajuda a aumentar ainda mais a antipatia da população por projetos que por si só já são polêmicos, como o aumento de IPVA e ICMS, concessão de auxílio-moradia aos juízes paranaenses e a criação da Fundação Estatal em Saúde (Funeas), todos aprovados através de comissões gerais. A tentativa frustrada da votação do pacote de medidas do ajuste fiscal do governo estadual em fevereiro desde ano foi outra prova de que o modelo precisava ser descartado. Indignados por saberem que a proposta seria analisada através de uma comissão geral, servidores públicos invadiram a Alep, suspendendo a sessão. Foi justamente por causa do lamentável episódio que os próprios parlamentares reconheceram o repúdio geral da população contra o mecanismo e decidiram dar fim a ele. Seria um grande erro retomá-lo agora.

Felizmente, parece que os deputados estão cientes de quão pernicioso seria ressuscitar o “tratoraço”. O deputado Pedro Lupion, presidente da comissão que estuda as propostas de reforma do regimento da Alep, disse que as sugestões do corpo técnico da Alep foram aceitas para análise, mas não devem ser aprovadas. “Os deputados não vão acatar de jeito nenhum”, garantiu. Esperemos que o prognóstico de Lupion se confirme e o “tratoraço” e as tristes lembranças que ele evoca sejam sepultados de vez e nunca mais retornem.

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