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Nos últimos tempos, onde quer que apareça em público a presidente Dilma Rousseff é recebida com vaias. Há poucas semanas, ao visitar uma feira de materiais de construção em São Paulo, passou por constrangimento; em Goiânia, foi preciso erguer um muro em volta do Paço Municipal para protegê-la da indignação popular. Nesses casos, os defensores do governo dizem que o público – para usar a linguagem do momento – era majoritariamente formado por “coxinhas”, a “elite branca e rica” que, na interpretação do lulopetismo, se contrapõe aos pobres. Esta visão típica de quem acredita estar o Brasil vivendo uma luta de classes tomou contornos extremos quando das manifestações dos dias 13 e 15 deste mês, uma pró e a outra contra o governo.

A presidente, no entanto, não teve de se preocupar com apupos e xingamentos ao comparecer a um evento promovido por uma cooperativa de assentados da reforma agrária no Rio Grande do Sul no último dia 20. Sua presença e seu discurso foram aplaudidíssimos. Detalhe: a plateia era exclusiva de agricultores paramentados com os uniformes vermelhos característicos do “exército de Stédile” – a militância assim definida pelo ex-presidente Lula e que estaria pronta para, a seu chamado, enfrentar os críticos do governo e do PT. Stédile, mentor do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e “comandante do exército”, estava também presente no mesmo palanque.

Naquele seu idioma nem sempre fácil de ser decodificado, Dilma voltou a citar suas promessas de diálogo com a sociedade, sempre presentes em seus mais recentes discursos, especialmente após as manifestações de desagrado em relação aos rumos de sua administração. Ela falou de “um país que eu não concordo tudo com que o Stédile concorda, agora eu respeito a luta do Stédile e as propostas dele” – que propostas, a presidente não disse. O que se sabe é que o líder sem-terra é hoje um dos principais arautos do marxismo bolivariano e fiel defensor da ditadura comandada por Nicolás Maduro na Venezuela.

Dilma só se limita a conversar com um dos lados da múltipla e complexa sociedade brasileira. O lado que escolheu é aquele que a apoia e pensa de maneira semelhante

“Ninguém tem de concordar com ninguém em tudo, eu não estou aqui pedindo para concordarem com tudo que o governo faz, mas para entenderem que nós queremos com um movimento como o de vocês, o que nós queremos? Nós queremos diálogo, muito diálogo”, continuou Dilma, antes de falar do “esforço e trabalho que dignificam a minha relação, a relação do governo com o MST”. “Nem sempre concordamos em tudo, vou repetir. Ah, mas dialogar até cansar, nós temos de fazer”, concluiu.

Uma disposição que poderia até ser louvada se não fosse pelo ceticismo com que qualquer disposição de “diálogo” da presidente deve ser vista. Afinal, ela só se limita a conversar com um dos lados da múltipla e complexa sociedade brasileira. O lado que escolheu é aquele que a apoia e pensa de maneira semelhante (e, quando diverge dela, é porque considera que o governo não se move suficientemente à esquerda). E, no caso do MST, trata-se de um lado que, ainda por cima, é violador contumaz da ordem pública e do direito à propriedade.

Se pretende mesmo exercer o papel que cabe a um presidente, Dilma não conseguirá bons resultados se não incluir as vozes discordantes – e, até agora, não consta que ela tenha buscado o diálogo com essas vozes. Cabe à chefe do Executivo buscar o melhor para o país. Agir no sentido de promover a justiça social, diminuir as desigualdades, equilibrar as finanças públicas, combater a corrupção, reencontrar meios para prover o Brasil de obras e serviços que o elevem à condição de país desenvolvido social e economicamente. São tarefas difíceis, e, por isso mesmo, devem ser encaradas como desafios coletivos e não exclusivos desta ou daquela facção de pensamento. Todos têm com o que contribuir.

Assim, não passarão de palavras ocas as promessas de diálogo se excluída a oposição, nela presentes setores trabalhistas e empresariais, e também aquela formal, exercida por partidos e políticos. As grandes passeatas do dia 15 constituíram a maior prova de que esta parcela significativa da população merece, sim, ser ouvida.

O fato é que o Brasil não merece se afundar nas divisões de classe social, nem se submeter aos radicalismos. Compete à presidente Dilma Rousseff ser a condutora de um consenso construído pacificamente em favor dos grandes desafios nacionais. E isto se faz pelo diálogo – nunca entre os que só falam a mesma língua. Seria, neste caso, um monólogo.

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