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Se Pero Vaz de Caminha tivesse chegado hoje a bordo de uma das caravelas de Cabral e postado nos Correios a carta a dom Manuel, é bem possível que o rei de Portugal não ficasse sabendo da descoberta do Brasil. A carta poderia estar perdida nalgum terreno baldio como se fosse lixo – como ainda outro dia se viu em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro – ou escondida entre as montanhas que se acumulam nos armazéns da estatal a cada (frequente) greve de carteiros. Em 1500, porém, as caravelas que cruzavam o Atlântico parecem ter se mostrado mais seguras e confiáveis que os modernos meios de controle e transporte que, em tese, poderiam manter os Correios com a mesma eficiência que, durante décadas, lhe garantiram lugar privilegiado entre as mais confiáveis instituições brasileiras.

Mas é bom recordar que, na mesma carta, Caminha pediu ao soberano português um empreguinho para o genro necessitado. Se atendido, provavelmente a sinecura ao parente do missivista não foi dada nos serviços postais da coroa, que já àquela época entendia a importância de vencer distâncias e obstáculos desconhecidos para tornar rápidos e eficientes os trabalhos de recepção e entrega de correspondências. Tanto que, já em 1673, criava-se na Terra Brasilis o primeiro correio a ligar as capitanias entre si e à Corte.

Foi a partir do aparelhamento que os Correios passaram a sofrer o processo de corrosão na qualidade dos seus serviços

Tudo vinha funcionando bem até pouco tempo atrás, quando o emprego de presidente dos Correios, assim como o de seus superiores, passou a ser ocupado pelos cortesãos do Planalto – aqueles amigos do grupo político-partidário que supostamente poderiam retribuir com apoios para votar projetos de agrado do governo. Já não interessava a competência profissional e técnica dos escolhidos, mas a sua disposição para “colaborar” e, evidentemente, também tirar proveito para o grupelho que os indicou.

Não por acaso, foi a partir de um flagrante de pagamento de propina a um diretor dos Correios que se descobriu a teia do mensalão. E também não foi por acaso que a partir daí – isto é, do aparelhamento da estatal – que os Correios passaram a sofrer o processo de corrosão na qualidade dos seus serviços, a tal ponto de, pela primeira vez nos últimos 20 anos, acumular prejuízo operacional da ordem de R$ 900 milhões.

A estatal, como reconhece seu novo presidente, indicado pelo PDT – partido que ameaçava abandonar o barco se não fosse contemplado com cargos no governo –, o médico Giovanni Queiroz, sofreu nos últimos anos os mesmos problemas que levaram a Petrobras à UTI. Com tarifas represadas artificialmente, a empresa passou a não dar conta de suas responsabilidades quanto à confiabilidade e rapidez dos seus serviços.

A gravidade da situação é reconhecida também pelo novo ministro das Comunicações, André Figueiredo, deputado federal do PDT cearense, indicado pelo partido para o cargo. Figueiredo elegeu como missão prioritária recuperar as finanças dos Correios. “Precisamos adotar medidas para melhorar a governança dos Correios. E é algo que não podemos reverter de imediato. O prejuízo deste ano também é muito influenciado por incorporações de débitos de anos anteriores, principalmente as referentes ao fundo Postalis”, disse o ministro, pondo o dedo numa outra ferida – o fundo de previdência dos funcionários que, por ter também se transformado em ninho de malfeitos, encontra-se em igual estágio pré-falimentar.

É muito difícil imaginar como uma empresa que detém o monopólio dos serviços postais tenha chegado ao extremo do déficit que apresenta – algo que só se explica mesmo pela gradativa mutação de sua atividade-fim – isto é, transformou-se numa entidade política com o mesmo viés populista que levou o Estado brasileiro à grande crise que atravessamos hoje.

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