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| Foto: Jonas Pereira/Agência Senado

Praticamente desde o seu surgimento, o PSDB se caracterizava por reunir filiados de matizes ideológicos bem distintos, tendo desde egressos do terrorismo armado contra a ditadura militar até políticos de postura mais liberal em temas econômicos e conservadora em assuntos de ordem moral. Tantas forças internas antagônicas talvez expliquem por que o partido acabou entrando para o folclore político como uma legenda sempre “em cima do muro”, ainda que, na média, adote mais políticas de centro-esquerda, a julgar pelo que seus principais líderes (como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso) defendem. Mas o partido nunca se mostrou tão fragmentado quanto agora, quando intrigas internas se tornam públicas.

Desde 17 de maio deste ano, quando explodiu a bomba armada por Rodrigo Janot e Joesley Batista, o partido discute a permanência ou não do partido no governo de Michel Temer, duas vezes formalmente denunciado pela Procuradoria-Geral da República. Não era possível permanecer em um governo marcado por denúncias de corrupção, argumentavam os defensores da ruptura. Eles ganharam um impulso no dia seguinte, 18 de maio, quando o então presidente da legenda, Aécio Neves, deixou o comando do PSDB para se defender, pois também tinha sido gravado por Joesley e havia sido afastado do cargo de senador pelo Supremo Tribunal Federal. Em seu lugar, entrou o senador cearense Tasso Jereissati.

Desde 17 de maio o partido discute a permanência ou não do partido no governo de Michel Temer

Apesar de ter sido indicado por Aécio, partidário de Temer, Jereissati defendia o desembarque do governo. Foi sob seu comando que o partido exibiu na televisão um programa especialmente crítico a Temer e à própria permanência do PSDB na base aliada, com direito ao uso da expressão “presidencialismo de cooptação”, sugerida por Fernando Henrique Cardoso. O programa causou mal-estar, especialmente entre os ministros tucanos, e acentuou as divergências. O partido foi dividido para as duas votações que arquivaram as denúncias contra Temer no plenário da Câmara. Em agosto, 21 tucanos foram favoráveis ao prosseguimento da denúncia, e 22 votaram pelo arquivamento. Em outubro, ligeira reversão: 23 a 20, respectivamente.

O capítulo mais recente da guerra civil tucana foi a “deposição” de Jereissati por Aécio, sob a alegação de que o cearense, que se declarou candidato na eleição interna prevista para dezembro, teria uma vantagem indevida se permanecesse interinamente à frente do partido – o candidato de Aécio é o governador goiano, Marconi Perillo. Para conseguir seu objetivo, Aécio simplesmente reassumiu a presidência do partido e logo a deixou novamente, colocando no lugar o paulista Alberto Goldman, o vice-presidente mais velho.

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O PSDB, assim, se desfaz a olhos vistos, vítima de pressões internas e externas – os partidos do “centrão” fisiológico, de olho em mais cargos, já vinham cobrando de Temer a demissão dos quatro ministros tucanos, já que o partido não demonstrou fidelidade completa ao presidente na votação das denúncias. Temer resiste porque sabe que tem de contar com os tucanos se quiser aprovar mais reformas, mas não conseguiu evitar uma baixa, com o pedido de demissão de Bruno Araújo, ministro das Cidades. Agora, o PSDB tem três ministérios: Relações Exteriores, com Aloysio Nunes; Secretaria de Governo, com Antonio Imbassahy; e Direitos Humanos, com a “ministra-escrava” Luislinda Valois.

Um governo declaradamente reformista, disposto a fazer o necessário para tirar o país do atoleiro econômico e colocar o Brasil na rota do crescimento sustentado, mas que por outro lado se mostra moralmente comprometido: essa situação cria um enorme dilema para o PSDB. O que fazer? Colocar-se a favor das reformas, mas sem fazer parte do governo? Que partido, no Brasil de hoje, seria capaz de não exigir nenhuma contrapartida por tamanho apoio? Ou tolerar as debilidades morais e manter os cargos no governo, enfatizando as reformas e, de quebra, aumentando as chances de costurar uma boa aliança para a eleição presidencial de 2018? A discussão interna já ganhou dimensões de autodestruição e, se a pancadaria colocar em risco a aprovação das reformas, deixará de ser assunto doméstico para se revelar uma irresponsabilidade para com o país.

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