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Após a votação do impeachment de Dilma Rousseff, o presidente interino Michel Temer dará prioridade em sua agenda a seu Programa de Parcerias em Investimentos (PPI), o que deve trazer a reboque um debate sobre o papel das agências reguladoras. É desejo da equipe de Temer levar adiante uma proposta ainda em construção para dar mais poder aos ministérios, deixando as agências com um papel secundário, de fiscalização de contratos. A proposta reacende um modo de pensar que esteve presente nos governos do PT e cujas consequências podem ser a indesejada imposição da vontade do governo sobre o que deveria ser uma política de Estado.

As agências têm hoje a função de acompanhar setores da economia em que há a necessidade de organização da atividade, seja para a licitação ou concessão de bens públicos, seja para o acompanhamento de critérios de proteção à concorrência e ao consumidor. Faz parte de seu trabalho também fiscalizar o cumprimento dos contratos e impor sanções a quem descumprir os marcos regulatórios que elas estabelecem. Não são, portanto, órgãos que cumprem os planos de governo do Executivo, mas sim o braço que coloca em prática a regulação, estando sob fiscalização do Congresso e do Tribunal de Contas da União.

Nesse modelo, é importante que as agências tenham independência, já que a ingerência política pode facilmente deturpar seu papel de órgãos de Estado. Exatamente porque não devem se subordinar aos governos de plantão, elas foram enfraquecidas durante a gestão do PT, que tentou, sem sucesso, aprovar um projeto de lei que reduzia bastante a função desses órgãos.

O governo Temer, por sua vez, assumiu uma postura ambígua. Em um primeiro momento, anunciou apoio à tramitação de um projeto de lei do Senado que reforça a independência operacional das agências. O texto, já aprovado em comissão, reafirma a autonomia dessas estruturas e confere a elas um orçamento próprio. Também cria o instrumento da lista tríplice na nomeação das diretorias, reduzindo e escopo da prática do loteamento dessas repartições.

Ao mesmo tempo, uma parte do governo quer ir na direção oposta, de esvaziamento desses órgãos. Membros da equipe de Temer articulam uma lei que daria aos ministérios a função, hoje reservada às agências, de preparar os editais de concessões e leilões para exploração de bens públicos. Essa mudança, defendida pelo secretário-geral do PPI, Moreira Franco, daria ao Executivo o poder de cuidar diretamente de regras que precisam ser resguardadas de interesses particulares, inclusive do próprio governo.

Um exemplo de como essa mudança é delicada está nos setores de petróleo e energia elétrica. Em ambos o governo é dono de empresas que concorrem diretamente pelas concessões – Petrobras por blocos de exploração e Eletrobrás por projetos de geração e transmissão. Não é correto que o ministério que representa o governo nessas companhias elabore também os editais que ditará as regras das concorrências e dos contratos que posteriormente serão fiscalizados.

Além disso, ao tomar para si essa tarefa, o governo abre uma porta de influência política sobre uma atividade que é técnica. Um ministério, por melhor que seja seu corpo de servidores, tem uma cúpula nomeada por critérios políticos e que pode carregar compromissos que estão fora de uma agenda de longo prazo para o país.

O governo precisa fazer a escolha certa e abandonar a ambiguidade apoiando o aperfeiçoamento do projeto de lei que está no Senado – que ainda tem em seu texto a criação de ouvidorias subordinadas ao Executivo cuja função é obscura – e enterrando o quanto antes a ideia de tirar das agências seu poder de organizar as concessões e licitações de serviços públicos.

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