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 | Geraldo Magela/Agência Senado
| Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

O até há pouco ministro das Cidades, o tucano Bruno Araújo, poupou o presidente Michel Temer da tarefa de tirar ministérios do PSDB e entregá-los aos fisiológicos e insaciáveis partidos do “centrão”: na segunda-feira, Araújo entregou o cargo pouco antes de uma cerimônia de entrega do Cartão Reforma, no Palácio do Planalto – ele chegou a discursar, sem que mais ninguém além de Temer soubesse que o ministro estava de saída. Com isso, o presidente ganha alguma margem de manobra para falar a única língua que as legendas do “centrão” entendem.

O PSDB se digladia internamente em torno da permanência no governo e da sucessão dentro da própria legenda, mas, ainda que os tucanos estivessem harmonicamente unidos, havia outra ameaça aos quatro ministérios que o partido detinha na Esplanada. Legendas como PP – que deve ficar com a pasta até agora comandada por Bruno Araújo –, PR, PSD e PTB já tinham deixado claro seu apetite pelos cargos dos tucanos; como o PSDB não votou maciçamente pela rejeição das denúncias da Procuradoria-Geral da República contra Temer, seria obrigação do presidente retaliar o partido. E o “centrão” deixou claro que, sem isso, não haveria apoio às reformas ainda por votar, especialmente a da Previdência. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o líder do PP, Arthur Lira, chegou a dizer que “ou muda ou não vota mais nada aqui”.

Temer está nas mãos de um grupo de partidos sem convicção ideológica, interessados apenas nos cargos

Lira, convenientemente, se esqueceu de que os partidos do “centrão” também contribuíram com sua cota de “rebeldes” nas duas votações que definiram o destino de Temer no plenário da Câmara. O que torna a situação toda ainda mais surreal: Temer estaria nas mãos de um grupo de partidos sem convicção ideológica nenhuma, interessados apenas nos cargos – e nos grandes orçamentos que algumas pastas, como a das Cidades, gerenciam – e que condicionam seu apoio a um naco maior da Esplanada, mesmo tendo sido incapazes de entregar a fidelidade total quando tiveram a oportunidade. E, como esse jogo é de soma zero, a vitória dos fisiológicos que enxergam as reformas não pela sua real necessidade, mas como pretexto para chantagem, exige necessariamente a derrota de um outro parceiro importante para o governo e que, pelo menos no discurso, tem um alinhamento muito mais responsável, percebendo a necessidade das reformas.

Informações de bastidores dão conta de que o PSDB poderia entregar de uma vez os cargos, mas sem perdê-los todos: Temer manteria um ou dois ministros por decisão pessoal, para demonstrar apreço aos tucanos enquanto ganha alguma margem de manobra para saciar o apetite do “centrão”. Nesse cenário, seria provável a manutenção de Aloysio Nunes no Itamaraty; outro tucano, Antonio Imbassahy, se permanecer, mudaria de pasta, deixando a Secretaria de Governo; já a ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, que reclamou de “trabalho escravo” por não poder acumular vencimentos acima do teto constitucional, ganharia a alforria.

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O senador Romero Jucá, líder do governo no Senado, disse que até 17 ministérios entrarão na reforma, já que alguns dos atuais titulares têm ambições eleitorais em 2018 e, nesses casos, é melhor que eles saiam agora. Mas, se considerarmos que há tantos partidos sedentos por cargos, bastaria a reorganização dos nomes nas pastas que já são do “centrão”, com o acréscimo de apenas dois ou três ministérios tirados aos tucanos? O presidente, claro, poderia mexer mais peças e sacrificar seu partido, o PMDB. Melhor ainda seria tirar da Esplanada os suspeitíssimos Moreira Franco e Eliseu Padilha, que só não permanecem formalmente denunciados porque, ao arquivar a denúncia da PGR contra Temer, os deputados também livraram os dois ministros, incluídos na mesma peça. Mas, como o presidente não cumpriu a promessa feita em fevereiro, de afastar ministros denunciados, e mais recentemente sancionou a lei que deu status de ministério à Secretaria-Geral da Presidência, garantindo o foro privilegiado a Moreira Franco, seria uma surpresa se algum deles saísse agora.

Jucá ainda disse que “Michel [Temer] fez mágica, ele fez mais do que Mister M e David Copperfield juntos”. Mágica, mesmo, será aprovar a reforma da Previdência contentando um “centrão” aparentemente insaciável e com os votos de um PSDB com menos ministérios, ou até mesmo sem pasta nenhuma. Mas é uma mágica muito necessária ao país.

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