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| Foto: Evaristo Sá/AFP

O governo federal jogou a toalha nas suas intenções de aprovar a reforma da Previdência na Câmara dos Deputados ainda este ano, mas o anúncio veio da forma mais atabalhoada possível. A primeira informação veio não de um deputado, mas de um senador, Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo naquela casa. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, chegou a desmentir Jucá e garantir que o Planalto pretendia levar o tema a votação ainda na próxima semana. Só na tarde de quinta-feira o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), confirmou a data da votação: 19 de fevereiro de 2018, depois do carnaval. O início das discussões sobre o tema no plenário, inicialmente marcado para esta quinta-feira, ficou para 5 de fevereiro.

A capitulação veio na mesma semana em que o PSDB, tendo resolvido (ao menos aparentemente) suas disputas internas com a eleição de Geraldo Alckmin para a presidência do partido, finalmente decidiu fechar questão em favor das mudanças propostas pelo governo. Na quarta-feira, os tucanos se tornaram a quarta legenda a decidir pelo apoio à reforma, depois do PMDB, do PTB e do PPS. Mas, no total, esses quatro partidos somam cerca de 130 deputados, muito abaixo dos 308 necessários para a aprovação da reforma. A constatação de que a estratégia de convencer as legendas a fechar posição não foi rapidamente adotada por mais partidos fez o governo concluir que não teria sucesso se tentasse votar o assunto ainda em 2017.

Se até um partido fora da base aliada já se comprometeu com a reforma, o que as legendas que se dizem integrantes do governo estão esperando?

Há dois meses, portanto, para conquistar a adesão do Democratas e de partidos do “centrão”, como PR, PP e PSD, todos com bancadas acima de 30 parlamentares. O “centrão” cobrou enfaticamente do presidente Michel Temer uma parcela maior de cargos nos principais escalões do governo, inclusive exigindo a saída de ministros tucanos para acomodar seus indicados. No entanto, são esses partidos que ainda hesitam em fechar questão em favor da reforma mesmo depois de o PSDB já ter assumido essa posição. Os articuladores de Michel Temer não devem deixar passar em branco esse fato: se mesmo um partido que formalmente não está na base aliada e perdeu ministérios já se comprometeu com a reforma, o que as legendas que se dizem integrantes do governo estão esperando?

Mas o prazo que o governo tem para conquistar mais apoios precisará ser usado também dentro do PSDB. Ao fechar questão em favor da reforma, o partido deixou aberta a possibilidade de seus deputados votarem contra as mudanças e não serem punidos, ao contrário do que determinaram as outras três legendas que já prometeram apoio à reforma. Alckmin chegou a dizer, em entrevista coletiva, que “não está excluída a punição, mas nossa primeira estratégia é o convencimento e está indo bem”. Mas, se o partido adota uma posição e ao mesmo tempo já deixa implícito que ela poderá ser desrespeitada sem que os “rebeldes” sejam punidos por isso, é inegável que a decisão perde força. Na quarta-feira, o líder do partido na Câmara, Ricardo Trípoli, disse que menos da metade da bancada de 46 deputados tucanos tinha declarado apoio à reforma. Se a direção do partido não endurecer, só resta esperar que o convencimento realmente funcione e que a bancada não reproduza com a Previdência o racha visto nas votações das duas denúncias da Procuradoria-Geral da República contra Temer. Esses 20 a 25 votos a menos seriam fatais para as pretensões de aprovar a reforma.

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No caso dos tucanos, o apoio à reforma da Previdência é coerente com o legado que o partido tem deixado ao país desde antes de chegar à Presidência da República: o Plano Real, a Lei de Responsabilidade Fiscal, as privatizações, o tripé macroeconômico. Nessa linha, o apoio à reforma da Previdência seria uma decisão natural, independentemente de o partido estar ou não formalmente no governo (ainda que tenham sido os tucanos os responsáveis pelas concessões ao funcionalismo público na versão mais recente da reforma). No caso da Previdência, o que menos importa é o fato de a reforma estar sendo proposta por Michel Temer; a “paternidade” do projeto empalidece diante de sua urgência. Sem mudança nenhuma, os gastos do governo nesta área tendem a comer parcelas cada vez maiores do orçamento federal; a se manter essa trajetória, ou não sobrarão recursos para mais nada, ou o sistema previdenciário vai implodir. Em ambos os casos, as consequências são catastróficas. O país já adiou demais a reforma da Previdência; que esse novo postergamento seja o último, e que não se desperdice a oportunidade de construir uma maioria sólida a favor da responsabilidade.

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