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 | Antônio de Picolli
| Foto: Antônio de Picolli

Lula e o PT têm costurado uma espécie de “aliança” em sua defesa, como forma de se defender dos processos que se avolumam – um dos julgamentos começa nos próximos dias, em Curitiba. A campanha que pede “um Brasil justo para todos e para Lula” certamente terá o apoio dos ditos “movimentos sociais”, estes que o ex-presidente bem gostaria de ver realizar farsas pirotécnicas caso algo (leia-se uma prisão provisória ou preventiva, ou uma condenação judicial) lhe aconteça. A partir de uma narrativa farsesca de perseguição política – cujo capítulo mais recente ocorreu na sexta-feira, quando Lula apresentou queixa-crime contra o juiz Sergio Moro por “abuso de autoridade” –, o ex-presidente e seus aliados tentam a todo custo distorcer fatos e deslegitimar o Judiciário. E a alegação de que o Brasil vive um Estado de exceção dedicado a perseguir petistas justificaria que organizações como o MST fossem às ruas em caso de punição a Lula.

Como o discurso da perseguição consiste mais em paranoia que em qualquer outra coisa, só haveria duas razões para tomá-lo a sério: a primeira seria sua eventual prevalência na sociedade, o que exigiria um grande esforço de esclarecimento. A segunda razão seria sua amplificação por parte de autoridades como o presidente da República. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Michel Temer não endossou a tese da perseguição, mas comprou o discurso das consequências do “ataque a Lula”, quando disse que uma condenação ou prisão do ex-presidente traria instabilidade ao país.

Fiscalizar, investigar, julgar e punir dentro das regras previstas em lei não criam desordem

Mas é falacioso o argumento de que ter Lula atrás das grades traria instabilidade ao país. Fiscalizar, investigar, julgar e punir dentro das regras previstas em lei não criam desordem. Pelo contrário: essas atividades são realizadas justamente para resguardar o patrimônio público e proteger as instituições republicanas.

O que cria instabilidade, na verdade, é o desvirtuamento do Estado para fins político-partidários. São o aparelhamento da máquina pública e o desvio de recursos do contribuinte para a compra de apoio político no Congresso – atos graves, atentados contra a democracia – que geram desordem no ambiente político da nação. O que cria instabilidade é a admissão de que os tais “movimentos sociais” teriam capacidade de provocar uma convulsão nacional (pois já se sabe que eles podem, sim, causar prejuízos de menor escala) caso resolvessem agir; isso corresponderia a uma confissão da incapacidade do aparato estatal de manutenção da ordem. Seria tornar o país refém desses grupos, a ponto de subordinar-lhes inclusive o desfecho de processos judiciais.

A fala de Temer só não é totalmente equivocada porque o presidente afirmou que, “se houver acusações contra o ex-presidente Lula, que elas sejam processadas com naturalidade”. Acusações há – tanto que Lula já é réu tanto em Curitiba quanto em Brasília. E naturalidade é o que vem pautando a condução dos processos. Não há qualquer violação de direitos que justifique considerar a hipótese de desordem política em caso de prisão ou condenação. Os juízes Sergio Moro, Vallisney de Souza Oliveira e Ricardo Leite acolheram as diferentes denúncias por entenderem haver indícios suficientes de materialidade e autoria. Todos os procedimentos adotados estão de acordo com o que se espera em um Estado Democrático de Direito.

É possível que haja partidários de Lula dispostos a usar a força para defendê-lo da ação legítima do Estado? Sem dúvida. Mas essa possibilidade jamais deveria ser um freio para que seja feita justiça. A instabilidade deriva da sensação de que as regras já não valem para todos. Demonstrar que ninguém está acima da lei e que o poder público se empenhará para que essa noção prevaleça, usando para isso os meios que lhe são garantidos pelo Estado Democrático de Direito, é o melhor meio de promover estabilidade.

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