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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

É necessário que o governo de um país constitua uma unidade de decisão e de ação. Por isso, a autoridade, o governo, é sempre uma dimensão inescapável de todo organismo social dinâmico. Não parece precisa, portanto, a formulação de alguns liberais de que o Estado (ou, melhor dito, o governo) é um “mal necessário”.

Como afirma o filósofo Ernst-Wolfgang Böckenförde, “a tarefa consiste antes em admitir a existência desse poder de direção e desses representantes, em conferir-lhes estabilidade no possível, mas, ao mesmo tempo, em submetê-los à legitimação democrática em um processo aberto de formação da vontade democrática, assim como em vinculá-los à responsabilidade e aos controles democráticos, para que sua ação possa valer como uma ação autorizada pelo povo e em nome do povo, e inclusive simplesmente para que essa ação possa dar-se”.

Essa visão remete a uma questão teórica e prática de difícil equacionamento: a da natureza da representação política. Pensemos nos representantes dos corpos legislativos. A quem cada deputado ou senador tomado individualmente representa? E qual a liberdade de ação de que dispõe?

A quem cada deputado ou senador tomado individualmente representa? E qual a liberdade de ação de que dispõe?

Há duas teses extremas que precisamos evitar. A primeira considera que cada parlamentar eleito representa única e exclusivamente o conjunto de cidadãos ou a base eleitoral que o elegeu e, por isso, ele deve votar sempre em consonância com a vontade desse conjunto ou base. Seu poder decorreria de um mandato. Essa tese, do caráter vinculado do poder do parlamentar, inviabiliza completamente o jogo democrático e a função dos organismos legislativos, uma vez que não haveria construção possível de consensos ou de busca das melhores soluções, que requerem liberdade da parte dos envolvidos para negociar e transigir.

A segunda tese considera que, uma vez eleito o parlamentar, não há vinculação alguma com a base que o elegeu, e sua atuação não está vinculada juridicamente a qualquer compromisso com os eleitores. Essa visão falseia ou minimiza ao extremo o caráter democrático da representação política.

Sem entrar com mais profundidade no tema, parece que a solução passa pela necessidade de um paradigma que sirva de referência ou finalidade para a atuação dos representantes. Segundo Böckenförde, “ficou claro que esse ponto de referência mais amplo da representação democrática material contém e tem de conter necessariamente um momento normativo, isto é, um momento que remete para mais além da esfera da vontade empírica natural e das correspondentes delegações de vontade”.

Mas em que consiste esse ponto de referência mais amplo de uma representação democrática? O problema – a realidade de que o poder dos representantes não pode ser nem um poder totalmente discricionário, nem totalmente vinculado – remete claramente para a ideia de bem comum, com todas as dificuldades que ela possa comportar e mesmo que esse conceito não traga propriamente, ainda, uma solução prática. Mas é o “conceito normativo” mais adequado e que pode, paulatinamente, ir adquirindo os contornos concretos, em cada sociedade, de que cada sociedade necessita.

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