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Ampliação do Colégio Pinheiro do Paraná, em Curitiba, é uma das que passaram a ser investigadas | Albari Rosa/Gazeta do Povo
Ampliação do Colégio Pinheiro do Paraná, em Curitiba, é uma das que passaram a ser investigadas| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

A Operação Quadro Negro – que apura um esquema de desvio de recursos de obras em escolas estaduais – ampliou as investigações para pelo menos outros 18 colégios de diversas regiões do Paraná. Há indícios de que as intervenções – construções, reformas ou ampliações – nessas unidades educacionais tenham sido alvo de irregularidades transcorridas nos mesmos moldes já apurados pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR) em outras escolas: principalmente, com a liberação de pagamentos para construtoras a partir de medições fraudulentas do andamento dos trabalhos. Todas as obras estão paradas desde 2015.

A nova fase da Quadro Negro atinge em cheio outras 13 construtoras, responsáveis pela execução de contratos que passaram a ser investigados. Com a ampliação da operação, deve-se constatar que os desvios já causados pelo esquema de corrupção são bem maiores que os R$ 20 milhões apontados até agora pelas investigações, que então haviam se debruçado em contratos executados pela Valor Construtora e que ligam a cúpula do governo do Paraná às irregularidades – conforme delação do empresário Eduardo Lopes de Souza, dono da Valor. Algumas das empresas alegam que foram vítimas do esquema.

A informação sobre a extensão da Quadro Negro foi obtida a partir de um levantamento feito pela Gazeta do Povo em documentos públicos do MP-PR. Tratam-se de portarias e despachos do Grupo Especializado na Proteção do Patrimônio Público (Gepatria), que, entre setembro e dezembro, instaurou inquéritos civis para apurar se houve improbidade administrativa na execução dos contratos de construtoras com a Secretaria de Estado da Educação (Seed). Procurado pela reportagem, o MP-PR preferiu não se manifestar, porque as investigações estão em andamento.

INFOGRÁFICO: veja a localização das obras investigadas nesta etapa da Quadro Negro

Das 18 obras, dez dizem respeito à construção de escolas, cujos contratos movimentam a maior parte de recursos: sete correspondem a edificações de Centros Estaduais de Educação Profissional (CEEPs) e três Unidades Nova Escola (UNVs). As outras oito obras estão relacionadas a reformas e/ou ampliações de colégios estaduais – dos quais quatro ficam em Curitiba.

CEEP de Campo Largo: construção orçada em R$ 7 milhões está abandonadaAlbari Rosa/Gazeta do Povo

Construções

Como apurou a Quadro Negro, o pagamento às construtoras nos contratos investigados eram liberados proporcionalmente, a partir do andamento das obras. Deste modo, segundo o MP-PR, o esquema se valia de falsas medições – em que engenheiros apontavam que as intervenções se encontrariam em estágio mais avançado do que efetivamente estavam – para efetivar os desvios.

Uma das obras que passou a ser investigada é a construção do CEEP de Ibiporã (no Norte do estado), que estava orçada em R$ 7,4 milhões. Relatórios de execução apontam que apenas 29,6% da edificação foram concluídos, mas que medições fraudulentas atestavam que os trabalhos já teriam passado dos 77%. Ainda segundo os documentos, um engenheiro inseriu no sistema de acompanhamento federal “dados falsos que noticiavam a execução de 60,71%” da obra.

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Mais de R$ 2,3 milhões foram liberados à construtora responsável pela construção – a Machado Valente –, mas os auditores apontaram que apenas o equivalente a R$ 1,9 milhões foram executados pela empresa: indícios de pagamento indevido (“a maior”) de R$ 361,3 mil.

Outra construção com indícios de irregularidades é a do CEEP de Maringá (Noroeste). Apenas 9,72% da obra foram efetivamente executados, mas, segundo documentos, engenheiros inseriram no sistema de acompanhamento “dados falsos que noticiavam a execução de 36,85%”. Dos R$ 1 milhão repassados à Atro Construção Civil – executora do contrato –, há evidências de que R$ 316 mil tenham sido pagos indevidamente. A construção estava orçada em R$ 9 milhões.

Escola em Campo Largo atenderia a 1,2 mil alunos de cursos profissionalizantesAlbari Rosa/Gazeta do Povo

Entre as construções que passam a ser investigadas, também está a do CEEP de Campo Largo (Região Metropolitana de Curitiba). Em setembro, a Gazeta do Povo já havia mostrado que o colégio orçado em R$ 7 milhões e que serviria a 1,2 mil alunos está com as obras paradas e não passava de um esqueleto de concreto e abandonado. Mais de R$ 2,8 milhões já haviam sido repassados à construtora Machado Valente, mas o Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR) havia impugnado o pagamento e determinado a devolução do dinheiro aos cofres públicos.

Além destes, a Quadro Negro vai se focar ainda nas obras de construções dos CEEPs de Londrina (Norte), Colorado (Noroeste) e Medianeira (Oeste) e das UNVs Indígena Pindoty, em Paranaguá (Litoral), Bairro Bela Vista, em Bandeirantes (Norte Pioneiro); e Casemiro Karman, em Campo Largo (Região Metropolitana de Curitiba). Em todas, há indícios de irregularidades no pagamento às construtoras e fraudes nas medições ou incertezas relacionadas aos motivos pelos quais as empresas abandonaram as obras e quanto receberam.

Recursos estaduais

As construções investigadas envolvem uma fatia maior de recursos do governo federal e uma contrapartida menor do governo do Paraná. Os documentos que subsidiam a instauração das investigações indicam que o dinheiro que correspondia à fatia estadual era, proporcionalmente, liberado em volume muito maior às construtoras.

Na construção do CEEP de Ibiporã, por exemplo, dos R$ 1,4 milhão em recursos do governo estadual, R$ 1,3 milhões foram repassados à construtora: 93% da verba estadual comprometida na obra. Por outro lado, apenas 17% dos recursos federais (R$ 1 milhão) foram liberados à empresa.

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No CEEP de Maringá, 77,84% dos recursos estaduais comprometidos na obra (o equivalente a R$ 507,1 mil) foram pagos à construtora, enquanto apenas 8,73% da verba federal destinada ao empreendimento (R$ 527,6 mil) foram repassados à empresa.

Escola João Wislinski entrou na mira da Quadro NegroAlbari Rosa/Gazeta do Povo

Reformas e ampliações

O que seriam os novos laboratórios e salas de aula do Colégio Estadual Pinheiro do Paraná, em Curitiba, não passam hoje de um galpão de tijolos, com as vigas de concreto e armações metálicas expostas. A obra da escola interrompida em meados de 2015 é uma das reformas e/ou ampliações que entraram na mira da Quadro Negro.

De acordo com ficha de acompanhamento da ampliação, 49,85% da obra teriam sido executados pela construtora Versailles Engenharia, mas a medição apontou que o andamento dos trabalhos estaria em 63,87%. Um relatório técnico feito meses adiante – em agosto de 2017 – constatou que, na verdade, a execução era de 27,57%.

O Quadro Negro também vai apurar se houve irregularidades na reforma da Escola Estadual Padre João Wislinski, em Curitiba. Segundo o MP-PR, vistorias na obra executada pela Brioschi Engenharia constataram que 83,55% da obra foi efetivamente executada, mas que o trabalho havia sido dado como concluído: um engenheiro atestou a medição de 100%, “sem qualquer justificativa para isso”. Essa diferença, segundo o relatório, corresponderia ao equivalente a R$ 114,8 mil.

Quadra do Colégio Santa Gemma não foi concluída e sem coberturaAlbari Rosa/Gazeta do Povo

Outra obra inacabada fica no Colégio Estadual Santa Gemma Galgani, também em Curitiba. Trata-se da construção de uma quadra poliesportiva, que hoje se resume a um piso de concreto e ao esqueleto da estrutura metálica que corresponderia à cobertura. Segundo o MP-PR, a Secretaria de Estado da Educação (Seed) comunicou que a construtora Engepark abandonou a obra. A Quadro Negro, agora, quer saber quanto a empresa recebeu, qual o porcentual da obra que foi executado, porque a construção foi paralisada e se houve irregularidades no processo.

Construtoras alegam ter sido lesadas pelo governo

“Eu não era amigo do rei.” A declaração de um empreiteiro paranaense sob investigação do Ministério Público Estadual (MP-PR) revela a indignação em ser comparado à Valor Construtora, pivô inicial da Quadro Negro. A exemplo dele, pelos menos outros três empresários afirmam que, ao contrário da Valor, executaram as obras em escolas e não receberam os pagamentos do governo do estado. Eles pretendem acionar o Executivo na Justiça para conseguir o dinheiro. A Gazeta do Povo não conseguiu contato com as outras empreiteiras investigadas.

Denilson Gonçalves é sócio-proprietário da empresa Tallento, responsável pela construção da Unidade Nova Escola Monteiro Lobato em Marechal Cândido Rondon, no Oeste do Paraná. Ele conta que a obra foi concluída e está sendo normalmente utilizada por alunos e professores. Cerca de 15% do pagamento, porém, não foi efetuado pelo governo. “Quando a Secretaria de Educação [Seed] iniciou as auditorias nas obras, deixou vencer a vigência dos contratos e impossibilitou os pagamentos. Desde então, isso virou uma novela”, reclama. “Toquei quatro escolas nos últimos anos e nunca recebi antecipado. Ao contrário da Valor, todas tiveram atraso no pagamento.”

Já Gislayne Korchak, da empresa Korchak & Korchak, atribui a morte do pai ao descaso do governo em pagar pela reforma e ampliação do Colégio Agrícola Manoel Ribas, em Apucarana. De acordo com ela, apesar de a obra estar 75% executada, apenas 18% do pagamento foi quitado. A empresária conta que, em meio ao escândalo da Quadro Negro, o governo alegou ter paralisado os pagamentos para fazer um pente-fino em todas as obras de escolas no estado. E, mesmo sem encontrar qualquer irregularidade no trabalho da Korchak, não repassou mais nenhum dinheiro desde abril de 2014, forçando a construtora a tocar a obra com recursos próprios, antes de decidir abandoná-la em agosto deste ano.

“Temos mais de R$ 2 milhões a receber por uma obra que já poderia estar acabada em 2015. Solicitei a medição rescisória, mesmo com dor no coração, por ver uma obra linda, praticamente concluída e que o governo não deu o devido valor, usando do dinheiro para atos ilícitos”, lamenta Gislayne.

Situação praticamente idêntica é narrada por Sandro Valerio, advogado da KS Construtora Galvan, que era responsável por obras em duas escolas, em Bandeirantes e Santa Mariana. Segundo ele, 180 dias depois de iniciados os trabalhos, quase nenhum pagamento havia sido feito à empresa. Por isso, decidiu-se fazer um pedido de rescisão unilateral dos contratos. “A Galvan é uma construtora pequena, não tem condições de suportar uma situação como essa, tanto que teve de mandar 140 funcionários embora”, afirma. “Esperamos que administrativamente a Seed faça a coisa certa e pague os valores devidos. Do contrário, só nos restará ir à Justiça.”

Por sua vez, a Machado Valente Engenharia, que tocava obras em duas escolas em Campo Largo e outra em Ibiporã, alega ter a receber do governo mais de R$ 2 milhões. O assessor jurídico da empresa, Luis Fernando Loyola, argumenta que, como duas das obras não recebiam dinheiro, a própria Seed propôs compensar o problema pagando além do porcentual de fato executado na obra em que os recursos estavam entrando normalmente. “Eles próprios sugeriram isso para que os trabalhos não tivessem de ser paralisados. Temos toda a comprovação técnica disso. A Machado Valente não cometeu qualquer irregularidade”, diz Loyola.

O que diz a Seed?

A Secretaria de Estado da Educação (Seed) disse, por meio de nota, que “foi a primeira a investigar os indícios de disparidades em medições de obras de escolas”. A pasta aponta que uma auditoria interna em 2015 para a apuração e as informações levantadas sofram repassadas à Polícia Civil, MP-PR e TCE-PR, “para que cada órgão tomasse as providências cabíveis”. “A Seed também reforçou seus departamentos de controle interno e de auditoria após o episódio”, consta da nota.

A Quadro Negro

Deflagrada em julho de 2015, a Quadro Negro começou a partir de investigação deflagrada pela Polícia Civil. Posteriormente, com o aprofundamento das apurações e com indícios de participação de servidores do governo estadual, o caso passou a ser investigado por dois grupos ligados ao MP-PR: o Gepatria e o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco).

Até então, os trabalhos se concentraram nos contratos da Secretaria de Estado da Educação com a Valor Construtora. De acordo com as investigações, mais de R$ 20 milhões foram desviados das obras de escolas estaduais, por meio do esquema. O dono da construtora, Eduardo Lopes de Souza, fechou colaboração premiada, em que apontou que o dinheiro abastecia a campanha de reeleição do governador Beto Richa (PSDB).

O delator destacou que o então superintendente de Educação, Maurício Fanini, esperava arrecadar R$ 32 milhões com os desvios relacionados à Valor. Além disso, Lopes de Souza apontou envolvimento da cúpula do governo estadual no esquema: o chefe da Casa Civil, Valdir Rossoni (PSDB) e do deputados Ademar Traiano (PSDB) e Plauto Miró (DEM). Todos negam as acusações e desqualificam a palavra do delator.

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