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Raquel Dodge, Cármen Lúcia, Grace Mendonça e Laurita Vaz (sentido horário): quatro mulheres estão em postos-chave do Judiciário | AFP PHOTO / EVARISTO SA/ José Cruz / Agência Brasil/ Beto Barata/PR / Sergio Amaral / STJ /Divulgação
Raquel Dodge, Cármen Lúcia, Grace Mendonça e Laurita Vaz (sentido horário): quatro mulheres estão em postos-chave do Judiciário| Foto: AFP PHOTO / EVARISTO SA/ José Cruz / Agência Brasil/ Beto Barata/PR / Sergio Amaral / STJ /Divulgação

Na segunda-feira (18), Raquel Dodge tomou posse como Procuradora-Geral da República. É a primeira vez que uma mulher assume o cargo máximo do Ministério Público Federal (MPF), órgão que tem como missão constitucional atuar como fiscal da correta aplicação da lei e defender os interesses difusos da sociedade. A posse dela compõe uma formação inédita na estrutura jurídica brasileira, com mulheres ocupando simultaneamente quatro dos postos jurídicos mais importantes do país: Cármen Lúcia preside o Supremo Tribunal Federal (STF), Laurita Vaz comanda o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Grace Mendonça é a ministra da Advocacia-Geral da União (AGU), órgão de assessoria jurídica do Executivo e que representa judicialmente a União.

Para a Promotora de Justiça Mariana Seifert Bazzo, Coordenadora do Núcleo de Promoção da Igualdade de Gênero do Ministério Público do Paraná, o significado dessa nova etapa histórica do Ministério Público gera reflexos não somente em agentes ministeriais mulheres, mas em toda a sociedade brasileira. “Não houve época, até o século passado, em que a mulher pudesse ser igualada ao homem em direitos. Até 1962, no Brasil, a mulher casada possuía capacidade civil limitada de acordo com a lei, não podendo agir sem autorização de seu marido. Somente com o código civil de 2002, atingiu-se a igualdade entre os cônjuges no espaço do lar e, por consequência, fora dele”, explica Bazzo.

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“A assunção dessa nova chefia de fato representa o amadurecimento de uma trajetória pela igualdade que se iniciou, há menos de um século, com o mero reconhecimento de que a mulher também pode desempenhar (e com brilhantismo) atividades fora do espaço privado e doméstico”, completa.

Na avaliação da promotora, que recentemente integrou uma missão do Conselho Nacional do Ministério Público ao Instituto Europeu para Igualdade de Gênero, na Lituânia, as instituições se enriquecem a partir da diversidade de seus componentes. ”O equilíbrio de gênero é verdadeira compensação histórica às mulheres que tiveram seus interesses e direitos específicos negligenciados por todas as instituições e, inegavelmente, pelo trabalho jurídico de seus integrantes que não as viam sequer como cidadãs civilmente (ou intelectualmente) capazes”, avalia.

Além do aspecto simbólico e de representação, uma maior presença feminina nas esferas de decisão pode fazer a diferença no cotidiano da justiça. A Procuradora Municipal de Belo Horizonte Marina França Santos, também professora da Escola Superior Dom Helder Câmara, investigou, em sua tese de doutorado, a importância da diversidade de gênero nos tribunais superiores brasileiros.

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Para ela, a diversidade confere legitimidade aos julgamentos, pois reforça a imparcialidade em uma sociedade marcada pela desigualdade de gênero. “Em minha tese eu investiguei como os atores institucionais são situados histórica e socialmente – o que influencia sua atuação, ao contrário do que rotineiramente se propaga. Levar em conta a posição social dos magistrados na composição dos órgãos conduz a um enriquecimento dos pontos de vista sobre o parâmetro legal, possibilitando uma compreensão mais completa das demandas sociais endereçadas à ideia de justiça”, explica. De acordo com o Censo do Poder Judiciário, divulgado em 2014, considerando todos os ramos da Justiça brasileira, apenas 36% dos magistrados do país eram mulheres.

Capacidade de diálogo

A importância simbólica e prática da liderança feminina nos sistemas de Justiça também é ressaltada pela ministra Grace Mendonça, que em setembro completou um ano no comando da Advocacia-Geral da União. Ela destaca características como o comprometimento com o trabalho, a organização e a capacidade de diálogo e de conciliação como diferenciais do perfil das mulheres para contribuir para a melhoria das instituições jurídicas do país. “Eu tenho mais de dez anos de casa e sempre trabalhei muito. E é justamente o trabalho intenso e organizado de toda a equipe da AGU que vem possibilitando o cumprimento de nossa missão constitucional”, disse em entrevista à Gazeta do Povo.

Como principais resultados de seu primeiro ano de gestão, a ministra Grace destacou um esforço na economia de recursos do órgão, por meio da revisão de contratos, com redução de despesas administrativas na ordem de R$ 18 milhões em um ano. Ao mesmo tempo, ressaltou o estímulo que tem dado a políticas de conciliação, ampliando o diálogo entre as partes, o que possibilitou que fossem firmados pela AGU 45 mil acordos, além de vitórias judiciais que garantiram à União um montante estimado em R$ 55 bilhões em um ano, entre recursos recuperados ou que foram mantidos com o erário.

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A austeridade administrativa, a capacidade de diálogo e a discrição são características que também marcaram o primeiro ano de gestão de Cármen Lúcia à frente do STF. A ministra é firme no cumprimento de metas: por exemplo, não cedeu à pressão dos Tribunais de Justiça para alterar a meta prioritária do Judiciário de julgar mais processos do que os distribuídos este ano.

Apesar de seu tom costumeiramente conciliador, quando necessário age com firmeza também na condução do plenário. Em uma situação em que a ministra Rosa Weber fora interrompida várias vezes enquanto votava, Carmen Lúcia devolveu-lhe a palavra, chamando a atenção dos colegas para um estudo da Northwestern University Pritzker School of Law, que mostrou que, estatisticamente, na Suprema Corte dos EUA, as juízas são interrompidas três vezes mais do que os juízes.

Grace Mendonça à frente da AGU, juntamente com a ministra dos Direitos Humanos Luislinda Valois, são as únicas mulheres entre os 28 ministros que hoje compõem o primeiro escalão do Poder Executivo brasileiro. A baixa representatividade de mulheres no Executivo contrasta com a situação países como a França e o Canadá, cujos gabinetes são compostos pelo mesmo número de homens e mulheres.

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