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| Foto: Sergio Silva/Agência PT

O Partido dos Trabalhadores e a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva trabalham em uma campanha que busca questionar a sentença do juiz Sergio Moro que condenou o ex-presidente a 9 anos e seis meses de prisão no processo do apartamento tríplex no Guarujá. O caso vai ser julgado na quarta-feira (24) em segunda instância, no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), e o resultado pode complicar a vida de Lula como candidato à presidência da República neste ano.

O PT criou um comitê formado por movimentos sociais e sindicais e lançou nas redes sociais a campanha “Cadê a Prova?”. Entre as estratégias está a criação de um documentário apontando falhas no processo que culminou na condenação de Lula em primeira instância.

“O ex-presidente Lula já provou em inúmeras situações a sua inocência no processo do caso “tríplex”, no qual foi condenado de forma injusta pela 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba numa sentença que já foi taxada como “fictícia, abusiva e absurda” por juristas de renome nacional e internacional devido à falta de provas”, diz uma nota do PT sobre a criação do Comitê.

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O partido também lançou um manifesto em defesa do ex-presidente, que conta com assinaturas de intelectuais, artistas e outras lideranças. Segundo o partido, o documento chamado de “Eleição sem Lula é Fraude” bateu na segunda-feira (22) a marca de 200 mil assinaturas. Aberto no site Change.org, o manifesto foi publicado em dez línguas diferentes, incluindo português, e argumenta que o processo contra o ex-presidente tem como objetivo impedi-lo de participar do pleito.

Veja quais são os principais pontos que a defesa do ex-presidente questiona em relação ao processo do tríplex e o que dizem a sentença de Moro e as alegações do Ministério Público Federal (MPF):

1) Provas

O que diz a defesa: O ponto crucial para a defesa do ex-presidente é a falta de provas contra Lula. A defesa insiste que só o ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, que tenta firmar um acordo de colaboração premiada com o MPF, confirmou a tese dos procuradores sobre o tríplex.

De fato, o depoimento de Pinheiro foi o mais prejudicial para Lula ao longo do processo em primeira instância. Em seu interrogatório, o executivo confirmou que o tríplex estava destinado ao ex-presidente em troca de facilidades para a OAS em contratos com o governo.

A defesa se engana, no entanto, quando argumenta que depois do interrogatório Léo Pinheiro fechou o acordo de delação e deixou a cadeia. O acordo ainda não foi homologado pela Justiça e o executivo continua preso na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba.

A defesa também critica o fato de, na visão dos advogados, o MPF não ter conseguido provar que o apartamento de fato pertencia ao ex-presidente. Na denúncia, os procuradores afirmam que Lula usufruiu do tríplex entre 2009 e 2014. Mas, segundo a defesa, na sentença Moro alega que não é possível provar que Lula tenha usufruído, ganhado ou adquirido o imóvel. “Sem propriedade, posse ou incremento em seus bens é um exercício de ficção tentar imputar o crime de lavagem de dinheiro à alguém”, dizem os defensores.

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A defesa critica, inclusive, o fato de o MPF usar a dificuldade de obter provas cabais como argumento nas alegações finais no processo para pedir a condenação do ex-presidente. Os procuradores pedem que o ex-presidente seja condenado com base nos indícios, já que a certeza “pode provir deles”.

O que alega o MPF: A força-tarefa da Lava Jato reconhece que há uma dificuldade probatória quando se trata de “delitos de poder” e cita um precedente do julgamento do Mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF). “A ministra bem diagnosticou a situação: em crimes graves e que não deixam provas diretas, ou se confere elasticidade à admissão das provas da acusação e se confere o devido valor à prova indiciária, ou tais crimes, de alta lesividade, não serão jamais punidos e a sociedade é que sofrerá as consequências”, argumentam os procuradores.

O MPF afirma, porém, que houve repasses de propina da OAS ao ex-presidente Lula por causa de três contratos com a Petrobras. Os procuradores alegam que Lula deve ser condenado por corrupção passiva por ter nomeado e mantido na estatal os ex-diretores Paulo Roberto Costa e Renato Duque, que também se beneficiavam do esquema.

O que diz a sentença: Ao condenar Lula, Moro faz uma relação de provas documentais juntadas ao processo pelo MPF e por pagamentos realizados à Bancoop, além de trechos de interceptações telemáticas entre investigados da Lava Jato, que reforçam a tese de que o apartamento estava reservado ao ex-presidente. Moro usa, inclusive, matérias jornalísticas veiculadas antes das investigações sobre o tríplex começarem e que afirmam que Lula seria o proprietário do tríplex no Edifício Solaris. Moro também aponta contradições entre os depoimentos prestados por Lula durante as investigações e em juízo.

2) Sem relação com Petrobras

O que diz a defesa: A defesa de Lula também alega que, enquanto a denúncia do MPF relaciona a posse do apartamento a um suposto pagamento de propina por três contratos específicos com a Petrobras, na sentença essa relação não ficou demonstrada.

“Na sentença, Moro não demonstra os vínculos entre os contratos firmados entre a OAS e a Petrobras e o tal apartamento do Guarujá. Não havendo tal vínculo, desmonta-se toda a tese de crime do MPF, já que perece a ideia de propina paga ao ex-presidente em troca de um favor”, argumenta a defesa de Lula em um artigo no site oficial do PT.

O que alega o MPF: Os procuradores fazem a ligação entre o pagamento de propina a Lula e três contratos da OAS com a Petrobras. “Todas essas vantagens indevidas estiveram ligadas ao desvio de recursos públicos e ao pagamento de propina a agentes públicos e políticos, agremiações partidárias e operadores financeiros”, afirmam. O MPF também argumenta que Lula sabia dos indícios de crimes na Petrobras, pois recebeu relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o assunto.

O que diz a sentença: Moro destaca o depoimento de Agenor Medeiros, executivo da OAS, sobre contratos da empreiteira com a Petrobras. “Em seu depoimento, em síntese, confirmou o esquema criminoso que vitimou a Petrobras, o ajuste fraudulento de licitações da Petrobras, o pagamento sistemático de propinas a agentes da Petrobras e a agentes políticos, com a repartição da propina”, afirma o juiz. Segundo Moro, Medeiros teria confirmado o pagamento de propina nos contratos listados pelo MPF no processo. O juiz também cita documentos do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre as obras em questão, que apontavam para indícios de irregularidades.

3) Testemunhas e provas desconsideradas

O que diz a defesa: Os advogados do ex-presidente reclamam, ainda, de testemunhas que foram ignoradas pelo juiz Sergio Moro, como o ex-presidente da Petrobras, Sergio Gabrielli. Ele teria dito não ter conhecimento de nenhum crime praticado por Lula referente à estatal. Moro afirmou na sentença que a palavra de Gabrielli não tinha “muito crédito” por ele ter sido presidente da Petrobras na época dos crimes. A defesa também reclama que Moro teria ignorado os depoimentos de outras testemunhas, entre elas o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Segundo a defesa, nem mesmo as testemunhas de acusação corroboraram a versão apresentada pelo MPF de que Lula seria o chefe de um esquema de corrupção no governo. “A procuradoria cita Pedro Correa, Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco. Porém, os três negaram em depoimentos – já amplamente divulgados – a realização de qualquer reunião com Lula em que ele tenha solicitado ou recebido vantagem indevida”, alegam os advogados.

O que alega o MPF: Nas alegações finais o MPF usa depoimentos para reforçar sua tese contra o ex-presidente. São destacados, por exemplo, depoimentos dos delatores Delcídio do Amaral, ex-senador petista; Pedro Correa, ex-deputado federal; Dalton Avancini, executivo da Camargo Correa; Agenor Medeiros, executivo da OAS; Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras; Alberto Youssef, doleiro; Milton Pascowitch, operador; Fernando Soares, lobista, entre outros.

O MPF usa, inclusive, trechos do depoimento de Gabrielli em suas alegações finais.

O que diz a sentença: Ao longo da sentença, Moro traz trechos de depoimentos de várias testemunhas ouvidas ao longo do processo, como executivos ligados a OAS, profissionais contratados pela empreiteira para tocar a reforma, o ex-zelador do condomínio Solaris, entre outros. Moro destaca que, da parte da defesa, praticamente não foi arrolada quase nenhuma testemunha com conhecimento sobre o apartamento. O depoimento de Léo Pinheiro foi o mais aproveitado pelo magistrado para formar sua sentença. Em relação ao depoimento de Gabrielli, Moro considerou o testemunho “vago”.

4) A propriedade do tríplex

O que diz a defesa: A defesa insiste que o tríplex nem sequer pertence ao ex-presidente. O imóvel, segundo os advogados, é um patrimônio da OAS. Como a empreiteira está em recuperação judicial, o apartamento está vinculado a uma dívida com um fundo da Caixa Econômica Federal.

A confusão em torno da propriedade do apartamento surgiu porque a ex-primeira dama Marisa Letícia, em 2005, comprou uma cota do empreendimento, que até então era da Bancoop. Com isso, a cooperativa reservou uma unidade de 82,5 metros quadrados para a mulher de Lula.

Quando a OAS assumiu as obras, Marisa teria parado de pagar as prestações e desistido do imóvel. A empreiteira, por sua vez, teria oferecido a Marisa que, ao invés de receber os valores de volta, mantivesse o investimento e adquirisse o tríplex. Depois de visitar o local, a família teria decidido não fechar negócio, segundo a defesa.

O que alega o MPF: Os procuradores sustentam que os valores recebidos por Lula da OAS foram alvo de lavagem através da “aquisição, personalização e decoração de um apartamento tríplex do Guarujá/SP”. O depoimento de Léo Pinheiro é um dos principais fundamentos do MPF para atribuir ao ex-presidente a propriedade do imóvel.

“Como provado no presente caso, sendo o triplex no Guarujá destinado ao réu LULA pela OAS a partir dos crimes de corrupção contra a Administração Pública Federal, sobretudo contra a Petrobras, esconder que o réu LULA é o proprietário do imóvel configura o crime. Dizer que “não há escritura assinada” pelo réu LULA é confirmar que ele praticou o crime de lavagem de dinheiro”, argumenta o MPF.

Os procuradores listam, ainda, uma série de documentos que serviriam como prova de que Lula é o real dono do tríplex. Listam, inclusive, um documento relativo ao apartamento apreendido na casa do ex-presidente. O MPF destaca, também, que na relação de cooperados da Bancoop que ainda não tinham assinado o termo de demissão/restituição não aparece o nome de Marisa.

O que diz a sentença: Para Moro, embora não haja dúvida sobre o registro do imóvel estar em nome da OAS e não de Lula, “isso não é suficiente para a resolução do caso”.

“Assim, por exemplo, não se amplia o deck de piscina, realiza-se a demolição de um dormitório ou retira-se a sauna de um apartamento de luxo para incrementar o seu valor para o público externo, mas sim para atender ao gosto de um cliente, já proprietário do imóvel, que deseja ampliar o deck da piscina, que pretende eliminar um dormitório para ganhar espaço livre para outra finalidade, e que não se interessa por sauna e quer aproveitar o espaço para outro propósito”, conclui Moro sobre as reformas feitas no apartamento.

Para Moro, os depoimentos colhidos em sua maioria confirmam a versão do MPF sobre os fatos. “Já os depoimentos em sentido contrário não são consistentes com essas provas documentais, pois não explicam o motivo das reformas personalizadas, não explicam a persistência das reformas para além de agosto de 2014 e não explicam as mensagens eletrônicas apreendidas”, decide o magistrado.

5) Teoria do domínio do fato

O que diz a defesa: Os advogados criticam a teoria do domínio dos fatos usada pelos procuradores para argumentar que, como presidente da República, Lula deveria saber de tudo que acontece na administração pública. “Porém, duas auditorias internacionais, a KPMG e Price, isentaram Lula de qualquer fraude na contabilidade da Petrobras e 73 testemunhas provaram a inocência de Lula”, rebate a defesa.

O que alega o MPF: Os procuradores sustentam que Lula decidiu sobre a montagem e permanência de uma estrutura criminosa na administração pública que teria beneficiado o ex-presidente de diversas formas: “atingir, por meio da corrupção, o triplo objetivo de enriquecer ilicitamente, obter recursos para um projeto de poder e garantir a governabilidade”.

“Sobretudo, em face do intenso grau de articulação política do jogo de poder, a figura que detinha a última palavra para as situações e as funções mais relevantes e estratégicas, além do cargo de maior importância na República, era o então Presidente LULA, vértice comum de todos esses esquemas criminosos”, argumenta o MPF.

O que diz a sentença: Para Moro, chamou a atenção o fato de Lula não ter reprovado os agentes públicos e políticos que participaram do esquema criminoso na Petrobras durante seu governo. “Parece, aliás, um pouco estranho que, diante da magnitude do esquema criminoso, ilustrado pelo fato da Petrobras ter reconhecido cerca de seis bilhões de reais em perdas contábeis com corrupção no balanço de 2015, não tivesse o ex-Presidente qualquer conhecimento, máxime porque ele, o esquema criminoso, também teria envolvido utilização de propinas em acertos de corrupção na Petrobras para financiamento de campanhas eleitorais, inclusive do Partido dos Trabalhadores e pelo qual o ex-Presidente foi eleito e elegeu sua sucessora”, diz o juiz.

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