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O presidente do Livres, Paulo Gontijo, classificou como “cálculo  eleitoral” a manobra do presidente do PSL, Luciano Bivar, para trazer o deputado Jair Bolsonaro para a sigla. | Reprodução
O presidente do Livres, Paulo Gontijo, classificou como “cálculo eleitoral” a manobra do presidente do PSL, Luciano Bivar, para trazer o deputado Jair Bolsonaro para a sigla.| Foto: Reprodução

Ainda atordoado pela rasteira que levou do PSL, o movimento Livres, que defende ideias liberais na economia e no comportamento, tenta se reerguer a tempo de lançar seus candidatos nas eleições deste ano. Em entrevista à Gazeta do Povo, o empresário Paulo Gontijo, presidente do grupo nesta nova fase, afirma que o Livres abriu diálogo com sete legendas e já tem pelo menos 13 pré-candidaturas viáveis – o nome da nova sigla parceira pode ser anunciado na segunda-feira (22).

Gontijo não esconde a frustração com o desfecho da aliança firmada com o PSL dois anos atrás. Classifica de “cálculo eleitoral” a manobra do presidente do partido, Luciano Bivar, que acertou o ingresso do deputado Jair Bolsonaro para disputar a Presidência da República, à revelia da vontade do movimento. Gontijo acusa Bolsonaro de tentar se apresentar como um liberal, quando não passa de um “nacional desenvolvimentista convicto”. E justifica a decisão do grupo de abandonar o PSL.

“Temos discordâncias ideológicas com Bolsonaro e também com a maneira como a negociação foi conduzida. A gente entende que a prática, não só o cardápio ideológico, é importante. A prática foi diferente de tudo que a gente entende como uma política mais aberta, mais transparente. Não é o tipo de política com a qual a gente está confortável”, diz. 

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Gontijo fala ainda sobre os desafios de apresentar o liberalismo amplo (favorável, por exemplo, à descriminalização das drogas), mas sem virar utópico ou sonhático, de somar sinergias com grupos conservadores sem abrir mão de suas bases, e de tornar as pautas liberais mais tangíveis para as classes C e D. Confira a entrevista: 

Com um espaço maior para a centro-direita, de que forma os liberais pretendem mostrar quem são e se diferenciar dos conservadores também nos temas de costume? 

Os liberais no Brasil, historicamente, sempre tenderam ou para aliança com o conservadorismo ou para ser um liberalismo muito superficial. Se você pegar por exemplo o PFL antigo, era fisiológico, com pontos liberais, mas que a prática deles não estava de acordo com as práticas liberais. Tem um vácuo no espectro político brasileiro para um polo liberal-liberal, nas práticas e nas ideias, que junte as ideias liberais, não só na economia, mas também no costume. Falar de liberdades civis, de liberdade de expressão, junto com uma visão econômica que não seja apenas macroeconômica, que um vício antigo que temos de sanar, mas olhar também questões como o empreendedorismo, como protagonismo de jovens em comunidades mais pobres. Olhar para a economia no micro e no macro, com propostas liberais, é uma forma importante de nos diferenciarmos do que já aconteceu no movimento liberal do Brasil e termos identidade própria. 

Qual a principal estratégia para as eleições? Os Livres terão candidatos para o Legislativo? E para o Executivo? Tem uma meta de cadeiras no Congresso que querem ocupar? 

Há menos de duas semanas tivemos de rever todo nosso planejamento, por causa da saída do PSL. Uma questão imediata é que em 2018 temos de alocar nossos candidatos. Temos alguns candidatos, inclusive no processo do RenovaBR. Todos eles vão concorrer ao Legislativo federal ou estadual. Nossa prioridade é o Legislativo, mas não estou dizendo que eventualmente não possa acontecer no majoritário. 

Haverá candidatos em todos os estados? 

Não. Estamos tentando nos reorganizar em um projeto mais qualitativo. Temos um grupo começando a se formar, e não necessariamente estamos preocupados agora em criar nominatas gigantes, mas em pragmaticamente eleger gente. 

Por que vocês disseram não ao Jair Bolsonaro? 

A primeira questão em relação ao Bolsonaro são discordâncias ideológicas. Uma por não acreditar que ele é liberal economicamente, e tem demostrado isso com o anúncio do voto dele na reforma da Previdência. Ele está tentando criar um verniz de liberalismo, mas quando sai da superfície tem um nacional desenvolvimentista convicto. Temos discordâncias ideológicas com Bolsonaro e também discordâncias com a maneira como a negociação [com o PSL] foi conduzida. A gente entende que a prática, não só o cardápio ideológico, é importante. A prática foi diferente de tudo que a gente entende como uma política mais aberta, mais transparente e com mais diálogo. Não é o tipo de política com a qual a gente está confortável. Foi um cenário na qual ficou inviável a permanência. 

O que aconteceu entre o Livres e o Luciano Bivar, presidente do PSL? 

Para a gente parece que foi um movimento eleitoral. O Luciano fez um cálculo no qual interessava mais ter o projeto do Bolsonaro no partido. Ele sabia que os projetos não eram compatíveis. Eu entendo o quanto pode ser sedutor trazer alguém com um nível de intenção de votos como se anuncia que o Bolsonaro tem. Mas por outro lado tem o desmantelamento de um projeto de dois anos.

Acho que a razão que me parece ter movido o Luciano é cálculo eleitoral. Como eu avalio? Acho uma diferença de perspectiva. A gente estava construindo um projeto de médio e longo prazo, que já estava se viabilizando para além da cláusula de barreira, com a perspectiva de criar o legado político de um partido liberal. Porquê o Luciano abriu mão disso por um resultado mais imediato eu não sei. Teria de perguntar para ele. 

O eleitor do Bolsonaro é o mesmo que vota no Livres? Qual é a semelhança entre os eleitores do Bolsonaro e do Livres? Quem é o eleitor do Livres? 

O eleitor do Livres varia desde pessoas que simplesmente querem mais liberdade econômica até pessoas que estão identificadas com pautas comportamentais liberais, como por exemplo menos interferência do Estado na vida pessoal. Acho que os eleitores do Livres têm esses dois vieses pelos quais eles se aproximam do nosso grupo, e varia muito de estado para estado o perfil desse eleitor.

Em alguns estados é mais jovem, quase adolescente. Em outros é mais velho. A gente conversa com um espectro muito amplo que vai de gente de 18 anos a 70 anos. Conversamos com todos e temos nos esforçado para trazer as pautas liberais mais para perto das classes C e D, e isso é um exercício de falar mais do dia a dia das pessoas, como as propostas liberais podem resolver os problemas no dia a dia. Esse é o perfil do eleitor do Livres.

Em relação ao eleitor do Bolsonaro, em certa medida há uma sobreposição, de eleitores que tem o perfil do Livres e entendem no Bolsonaro o “anti-Lula”, o “anti-PT”. Pode ter aí uma certa sobreposição, mas isso é uma análise um pouco inicial. Não tenho essa questão aprofundada, até porque não tivemos os dois na mesma eleição. 

Vocês se colocam como “anti-Lula” ou “anti-esquerda”? Vocês levantarão esse tipo de bandeira? 

Não queremos nos colocar como “anti-nada”, mas sim como pró-liberdade. A gente não quer se definir pelo outro, mas definir o cenário político pelas ideias que a gente acredita. 

Como está o processo de alianças com partidos? Vocês estão em conversas com o Novo, o PPS e a Rede? 

Neste momento a gente está escutando. Temos uma janela curta de tomada de decisão, mas tivemos muitos contatos de partidos. Estamos também conversando muito com nossas bases, tentando entender os cenários locais, como encaixar esse nosso movimento na realidade de todo mundo. 

Esses nomes de partido são alguns dos nomes que estão conversando com a gente. Não tenho problema de falar desses nomes pois esses três se manifestaram publicamente convidando a gente e elogiando o Livres, prestando solidariedade. Mas não temos alinhamento específico com nenhum deles neste momento, estamos conversando com todo mundo.

Já conversamos com sete partidos até agora, ainda vamos conversar com outros, e não posso revelar quem são, alguns pediram discrição. Não temos o martelo batido ainda. Estamos preocupados em sermos democráticos nesse momento, que é crucial para o futuro do Livres. Vamos fazer uma coletiva dia 22 (segunda-feira) para anunciar nosso norte e fazer um balanço do que aconteceu até agora. Vamos ter uma clareza maior em tornar isso público. 

Vocês competem com outros movimentos como o Agora!, do Luciano Huck? E o que pensa sobre a possível candidatura do apresentador? 

Sempre fazemos o esforço de achar convergência com os movimentos que querem construir alguma coisa. Eu sou membro do Agora! e do Livres. Não existe um alinhamento automático entre os movimentos. Eles têm suas diferenças e as reconhecem, mas também reconhecem que têm pontos que são convergentes.

Trabalhar pela simplificação do Estado, para ser mais eficiente e menos burocrático é claramente uma pauta comum e a gente vai trabalhar junto com todo mundo que queira botar essa pauta para frente. Não significa adesão imediata a tudo, mas que a gente tem um olhar para uma agenda de reforma que é fundamental para o futuro do país e com a qual temos de trabalhar programaticamente. 

Não temos uma posição do Livres sobre Huck e outros candidatos nacionais agora. Tem gente que vê João Amoêdo com muita simpatia, tem gente que vê outros candidatos com muita simpatia. Qualquer candidatura que seja baseada em ideias que a gente defende, vamos olhar com bons olhos e analisar com carinho. Mas neste momento nem sabemos se a candidatura existe, precisamos saber baseada em que ela existirá. 

Por que partidos que já se alinharam ao liberalismo, como o PSDB, não comportam mais um movimento como o Livres? O que o Livres pensa do MDB? E do DEM? 

O PSDB tem uma questão que ele nunca foi um partido liberal, mas sim onde existia um pequeno grupo liberal, mas programaticamente tinham diferenças. Mas o PSDB tem problemas recentes de práticas políticas que geraram muitas resistências sobre o partido. Acho que tem uma questão e que aconteceu com todos os grandes partidos da política brasileira, em especial PT, PMDB e PSDB, que saíram muito chamuscados nesses últimos anos.

Acho que não vamos, em nenhum momento, fechar portas a questões pontuais de cooperação de um determinado parlamentar nosso, alguma causa. Mas o que diferencia a gente é exatamente fazer movimentos políticos baseados nas nossas ideias e não comprometê-las. Temos foco em ser movimento político programático, não tem nenhuma vergonha de defender as ideias da liberdade por inteiro, e a gente entende que, mantendo a coerência com as nossas ideias, está criando uma prática política diferente, que não é baseada só na obtenção imediata de poder. 

Em alguns casos e estados, se o Livres tivesse ficado no PSL e se aproveitado dos votos do Bolsonaro, teria se beneficiado eleitoralmente. Mas nós não piscamos e decidimos sair, entendendo que aquilo não tinha nada a ver com o que a gente defendia. Acho que a gente passou no nosso primeiro grande teste de coerência e pretendemos passar em todos os outros. 

É viável manter isso na política atual, que depende de recursos? Não vira sonhático? 

Não temos a ilusão de que não tem de ser pragmático em determinados momentos. A gente tem sim um compromisso em efetivamente mudar a vida das pessoas. E quando você quer descer no nível de resolver questões, isso se reflete por exemplo no nosso gradualismo, na ideia de não querer fazer uma revolução liberal, mas conseguir pequenas vitórias todos os dias, é uma prática cotidiana, a gente entende que é isso, e para fugir disso não. Entendemos que tem de ser aplicado, diário e com muito trabalho. O primeiro ponto é esse.

E o segundo é construir um modelo próprio. Sabemos que é difícil. A gente tentou construir um modelo próprio dentro do PSL. A gente não trilhou o mesmo caminho que outras pessoas trilharam. Ninguém disse que ia ser fácil e não era. Mas entendemos que é um momento propício, não é um sonho, há uma demanda por movimentos políticos que se comportem de outra maneira e se organizem de outra maneira, e vamos tentar construir o nosso modelo considerando esse cenário. 

Como o partido se posiciona sobre privatizações da Petrobras e da Eletrobrás, armas e drogas? Como mostrar para a direita conservadora que há sinergias entre o pensamento liberal e o conservador? 

A gente não têm planos específicos para essas empresas neste momento, mas vemos com muito bons olhos a privatização das empresas estatais, inclusive a Petrobras. A gente vê com simpatia a ideia, e isso vale para privatização, para descriminalização das drogas, mas para qualquer projeto, a gente quer entrar num nível de discussão mais profundo com políticas públicas viáveis.

Quando a gente vai falar de descriminalização das drogas – e não legalização –, é porque na verdade a gente defende uma política de segurança que seja mais centrada em reduzir a violência. A gente consegue o diálogo quando vai para o resultado e para a evidência. Num cenário como, por exemplo, no Rio de Janeiro, onde você não tem gasolina para viatura e salário para PM, talvez seja mais racional concentrar seus recursos em combater a violência.

Então nossa discussão vai muito baseada em evidência e em problemas práticos. Não é uma questão cultural, de “canabismo”. A gente entende a liberdade das pessoas de comportamento, valoriza, defende. Mas quando vai para o nível da política pública, tem de discutir baseado em evidências e resultados e olhar a segurança das pessoas. 

Quanto às armas, somos programaticamente a favor do direito de defesa. Isso está nos nossos princípios. Entendemos a legítima defesa como um direito do cidadão. Somos liberais por inteiro. Ser liberal não é ser entreguista. Precisamos alocar recursos nas coisas básicas que o estado tem de fazer.

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