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 | Aniele Nascimento    /    Gazeta do Povo
| Foto: Aniele Nascimento / Gazeta do Povo

Pensar em mudanças estruturais nos gastos públicos é assunto urgente. Com a definição de um teto de gastos em 2016, já se estima que a partir do ano que vem o governo terá situação complicada, podendo até ser obrigado a congelar o salário mínimo. Os candidatos precisarão falar quais são suas propostas para a Previdência, um assunto sem escapatória, apesar de indigesto por significar redução de benefícios. 

O assunto é relevante e deve ser um dos principais debatidos pelos candidatos, avalia Hélio Zylberstajn, professor sênior da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP) e coordenador do Salariômetro da Fipe. “Agora é saber se eles vão ter essa coragem de se posicionar. É um tema espinhoso. É óbvio que o Brasil precisa reduzir gasto com a Previdência e reduzir qualquer gasto é difícil”, avalia.

O especialista em Previdência Renato Follador acredita que as propostas para o tema serão “o tema central” dos debates. “Pois ganhe quem ganhar, esse será o primeiro assunto da próxima legislatura”, avalia.

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O governo atual até tentou levar a proposta de reforma da Previdência à votação na Câmara, mas jogou a toalha logo depois do carnaval. A proposta que estava na mesa, enxuta, era defendida por três dos possíveis pré-candidatos ao Palácio do Planalto no próximo ano: o presidente Michel Temer; o presidente da Câmara, Rodrigo Maia; e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Este defendia uma reforma ainda mais profunda e que teria o dobro de economia para a União do que a proposta final.

A não ser que o candidato eleito em outubro consiga fazer um acordo com Temer e com os parlamentares para aprovar algo ainda este ano, quando estarão despreocupados com a eleição, o assunto será urgente no próximo governo.

Sem a reforma, o próximo presidente não terá como escapar: será preciso aumentar impostos. Em dez anos, o governo pode precisar aumentar os tributos em cerca de R$ 430 bilhões para compensar a não realização da reforma, elevando a carga tributária a 40% do PIB, ante os atuais 32,5%. 

Diferenciais: mexer em direitos adquiridos e apresentar modelo de longo prazo 

Durante os debates, Zylberstajn chama atenção para pontos que podem denunciar se um candidato está disposto ou não a tratar do assunto com clareza: o que pretende fazer sobre direitos adquiridos pelo funcionalismo e se vai querer enfrentar as corporações; e se está pensando em propostas de longo prazo, para resolver não só a situação atual, mas criar um novo modelo de Previdência para o futuro.

“Ficou claro nessa tentativa do governo Temer que é muito difícil mexer para trás, mexer em benefício de qualquer servidor que está aposentado ou vai se aposentar. Precisamos ter a decisão inclusive de mexer no direito adquirido. E é muito difícil fazer isso. As corporações se organizam e conseguem dificultar essa decisão. O candidato tem de se pronunciar claramente se vai fazer isso mesmo”, ressalta o professor, lembrando que Temer e sua equipe econômica cederam ao retirar da reforma os militares, depois os professores e depois outras carreiras, e fazer concessões. “Precisamos saber até onde o candidato quer ir nessa queda de braço”, avalia. 

A proposição de um modelo para o futuro também é algo importante, que será preciso cobrar dos candidatos. Em sua visão, uma forma de resolver isso seria a definição de que o FGTS, a aposentadoria e o seguro-desemprego sejam atrelados, em uma conta pessoal de cada trabalhador, que recolherá para poder sacar de seu próprio saldo caso precise. Esse é o modelo sugerido por João Amoedo (Novo) e Jair Bolsonaro (PSC, que deve disputar pelo PSL).

“Os candidatos precisam dizer que os trabalhadores novos terão outra Previdência. Isso mostra que no futuro o problema será resolvido. Teria uma transição, também precisamos mudar as regras de quem está no meio do caminho. Mas o candidato precisa ser claro”, avalia. 

E o professor alerta: se algum candidato disser que a Previdência não é um problema, melhor abrir os olhos. “Se alguém disser que não tem déficit, mude de canal. Ele está mentindo”. 

Veja o que já se sabe das propostas de cada pré-candidato: 

Jair Bolsonaro (futuro PSL)

Terceirizar a gestão da Previdência, com contas individuais 

O deputado federal afirmou que votaria contra a reforma da Previdência de Temer, mas a proposta apresentada pelo economista Paulo Guedes, o atual fiador de Bolsonaro na economia, está entre as mais duras. Entre os nove pontos apresentados por Guedes no começo deste ano como bases de seu plano, está a “realização/ampliação da reforma do atual sistema previdenciário e criação de sistema de capitalização, com contas individuais, para novos participantes”. 

Em entrevista à “Folha de S.Paulo”, Guedes defende que os recolhimentos previdenciários não sejam reunidos em um único bolo, mas que cada contribuinte tenha sua própria capitalização. “Não é gestão pública, o governo garante o resultado, mas terceiriza a gestão, numa nova indústria. É capitalismo na veia. Em vez de o recurso ser dissipado, é acumulado”, defendeu.

Essa proposta “hipercapitalista” e liberal também propõe opção aos futuros trabalhadores: escolher se querem recolher seus impostos e se enquadrar na Previdência atual, ou se preferem não recolher impostos e cuidar por conta própria de sua aposentadoria. “Se você quer a carteira verde-amarela, você aumenta a sua empregabilidade, porque você está recusando a Justiça Trabalhista. Tem outro problema, o sistema mistura assistência com Previdência. Às vezes o cara não contribuiu, precisa de uma renda mínima, não é Previdência”, afirmou ele ao jornal. 

A proposta do economista de Bolsonaro merece cautela. Zylberstajn diz que é importante manter o pilar de gestão pública da Previdência. Follador relembra que a proposta de Guedes é uma cópia do modelo chileno, “que conduziu os aposentados à miséria”, na visão do especialista. Procurada para se posicionar formalmente, a assessoria do pré-candidato não respondeu ao pedido da reportagem.

Lula (PT)

Pouca clareza sobre propostas, mas já realizou sua reforma 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é um dos que combateram a reforma da Previdência de Temer, até convocando atos e manifestações. Seu partido, junto com outros de oposição, foi o mais incisivo contra a reforma, chegando a apoiar a realização da CPI da Previdência, que chegou à conclusão de que não há um rombo. O senador Paulo Paim (PT-RS) esteve à frente da CPI e defende que o objetivo é beneficiar os bancos, com a “privatização da Previdência”. 

Em outubro de 2017, Lula chamou de “crime” a reforma da Previdência e acusou um desmonte do que foi feito no passado. “A oposição precisa juntar forças para evitar que essa reforma aconteça, porque o que eles estão fazendo não é uma reforma, é um desmonte, quase que uma implosão de tudo aquilo que foi considerado conquistas sociais para o povo brasileiro”, disse.

Porém, em 2003, no primeiro ano de sua gestão, Lula promoveu uma mudança na previdência dos servidores públicos, aumentando sua contribuição e colocando um teto, também mudando o direito à integralidade. Posteriormente, sua sucessora Dilma Rousseff criou a aposentadoria complementar dos servidores, o Funpresp. Procurada para se posicionar formalmente, a assessoria do pré-candidato não respondeu ao pedido da reportagem.

Marina Silva (Rede)

Precisamos, mas sem falar do quê 

A ex-senadora e ex-ministra Marina Silva (Rede) já defendeu publicamente a reforma da Previdência, mas ainda falta explicar qual seria o modelo ideal. Ela afirmou, ao jornal “Valor Econômico”, que o importante é cortar benefícios, mas que o governo Temer é ilegítimo para fazer as mudanças.

“Sou a favor [da reforma da Previdência], mas desde que não venha a prejudicar os mais frágeis. Que se combata os privilégios e que se faça uma atualização para encontrar um caminho para o problema grave do déficit da Previdência. Mas Temer não tem credibilidade, popularidade ou legitimidade. Ele não está mandatado para fazer, porque nem ele, nem Dilma, colocaram isso em seu programa de governo”, disse. 

No começo deste ano, em entrevista à Rádio CBN, Marina afirmou que a proposta de Temer não combate os privilégios, sem, mais uma vez, delinear sua proposta. “As reformas são necessárias, mas é preciso que elas sejam feitas por governo com legitimidade, credibilidade e alguma popularidade. Nenhum governo pensou em fazer reforma no ultimo ano, ainda mais com a baixa popularidade que tem o presidente Michel Temer”, declarou.

Para além disso, ainda falta clareza na proposta de Marina e qual seria o modelo apresentado, qual idade mínima e regras de transição. Procurada para se posicionar formalmente, a assessoria da pré-candidata não respondeu ao pedido da reportagem.

Geraldo Alckmin (PSDB)

Defesa de reforma ‘contundente’

O governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), defendeu que o governo Temer tentasse votar a reforma da Previdência este ano. Ele discordou publicamente de um dos intelectuais que coordenam sua carreira. Roberto Gianetti havia defendido a votação apenas em 2019, mas Alckmin reforçou que Temer deveria votar e que o PSDB era favorável às mudanças. 

Em entrevista, Alckmin defendeu a redução dos privilégios, com um regime amplo de Previdência. Outros pontos da proposta do tucano ainda não foram divulgados. Procurada para se posicionar formalmente, a assessoria do pré-candidato não respondeu ao pedido da reportagem. 

Alvaro Dias (Podemos)

Preservação de direitos adquiridos

O senador paranaense Alvaro Dias respondeu à Gazeta do Povo que defende uma reforma modernizadora, mas que “preserve os direitos adquiridos e respeite a complexidade regional e social do país”. Na reforma de Dias devem ser levados em consideração as características das diversas atividades laborais e regionais. 

Ele também defende que se faça uma auditoria na dívida e se cobre dos grandes devedores. “A reforma da Previdência ideal deve pensar na segurança futura do trabalhador. Mas, antes da reforma, devemos realizar uma profunda auditoria na previdência e apresentar os resultados para a população. Os grandes devedores devem ser cobrados. De R$ 400 bilhões em dívidas, mais de R$ 200 bilhões são de grandes empresas, como JBS, e bancos”, afirmou, em nota.

João Amoêdo (Novo) 

Reforma é urgente 

O empresário João Amoêdo defende que a reforma seja feita logo e de forma a reduzir privilégios. O pré-candidato sugere um sistema de capitalização, que também possibilite mais liberdade aos trabalhadores que recebem mais, em buscar opções de aposentadoria com rentabilidade mais alta.

“Quanto mais tempo demorarmos para realizar a reforma, maior será a conta a ser paga por todos os cidadãos. Eu defendo que o próximo governo aprove uma transição fiscalmente responsável em direção a um sistema de capitalização que valorize a renda dos brasileiros com melhores retornos e maiores opções de investimento”, defendeu, em nota à Gazeta do Povo.

“O Brasil precisa com urgência de um modelo de previdência sustentável e que acabe com todos os privilégios. O sistema previdenciário atual é um gigantesco programa de transferência de renda do pobre para o rico. Os mais ricos se beneficiam da aposentadoria precoce enquanto são os mais pobres que se aposentam por idade. Enquanto os servidores do setor público recebem em media de R$ 7,3 mil, os trabalhadores do setor produtivo recebem cerca de R$ 1,2 mil”, diz.

Ciro Gomes (PDT)

Diferenças regionais e críticas a Temer 

O ex-governador do Ceará e ex-ministro Ciro Gomes (PDT) é contundente em suas críticas à reforma proposta por Temer. Em vídeo publicado em sua rede social, Gomes afirma que o país é vítima de um golpe e que portanto não se pode mexer na Previdência. 

O pré-candidato afirma ser favorável a mudanças e que elas são necessárias, mas em diálogo com os trabalhadores. Essa proposta também deveria acolher as diferentes características regionais, com idades diferentes. O político critica o presidente Michel Temer ao comentar sua proposta para a Previdência, pois Temer teria se aposentado com 55 anos. 

Ciro Gomes está no time dos políticos que avaliam que a Previdência não tem déficit, bastando que o governo destine os impostos recolhidos para essa área. Em 6 de fevereiro, ele postou um vídeo em suas redes sociais, dizendo que a arrecadação acaba sendo usada para pagar “banqueiros”, com a rolagem da dívida. 

Procurada para se posicionar formalmente, a assessoria do pré-candidato não respondeu ao pedido da reportagem.

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