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Lula é réu, mas não está preso – condição prevista na lei para que a videoconferência possa ser cogitada. | Evaristo Sá/AFP
Lula é réu, mas não está preso – condição prevista na lei para que a videoconferência possa ser cogitada.| Foto: Evaristo Sá/AFP

O interrogatório do ex-presidente Lula pelo juiz Sergio Moro no processo do tríplex do Guarujá (SP), marcado para esta quarta-feira (10), vai exigir um forte esquema de segurança para evitar tumultos e confrontos entre manifestantes a favor e contra o petista. Diante do reconhecido risco de haver violência nas ruas, é inevitável questionar: não seria possível que Moro determinasse que o depoimento de Lula fosse feito por videoconferência, evitando a visita dele a Curitiba?

Nesse caso, o ex-presidente comparecia a um fórum devidamente equipado com recursos de teleconferência em São Paulo, estado em que mora, para responder às perguntas de Moro, que ficaria no Paraná.

Mas, embora o interrogatório a distância seja previsto na legislação, esse recurso não é ponto pacífico entre especialistas em processo penal e poderia ser alvo de questionamentos, atrasando o julgamento – especialmente num caso rumoroso como o do petista. Além disso, nada garante que também não haveria mobilizações pró e contra Lula em São Paulo ou onde quer que o ex-presidente estivesse.

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Previsão legal

A Lei N.º 11.900, sancionada justamente por Lula em 2009, autorizou o uso da videoconferência nos interrogatórios de réus em processos penais em alguns casos específicos. Um deles é justamente para evitar desordem pública – circunstância que, em princípio, pode ocorrer durante o depoimento do ex-presidente.

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Porém, o advogado Ivan Xavier Vianna Filho destaca que a lei determina expressamente que o interrogatório por videoconferência só pode ser feito no caso de o réu estar preso. Lula é réu. Mas responde ao processo em liberdade. Segundo o advogado, por esse motivo o interrogatório online não poderia ser feito na ação contra Lula.

Prerrogativa do juiz ou da defesa?

A lei prevê que o magistrado pode tomar a decisão de determinar o interrogatório a distância por conta própria ou por solicitação das partes. Mas é juridicamente questionável se um juiz pode fazer isso individualmente.

“O interrogatório tem natureza jurídica controvertida. Ora é identificado como meio de prova, ora como meio de defesa, ora, finalmente, apresenta-se com caráter dúplice”, diz Ivan Xavier Vianna Filho. Se for interpretado como meio de defesa, é direito do réu ser ouvido diretamente pelo juiz do caso. Esse princípio, segundo ele, está previsto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto de São José da Costa Rica, assinada pelo Brasil e incorporada na legislação nacional pelo Decreto n.º 678, de 1992.

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Advogado de alguns acusados pela Lava Jato e professor da Escola da Magistratura Federal do Paraná, Marcelo Lebre acrescenta que, com o objetivo de garantir a ampla defesa, modificações no Código de Processo Penal feitas entre 2008 e 2011 alteraram o entendimento sobre a fase do interrogatório numa ação. Essa etapa, diz ele, passou a ser vista como um recurso da defesa. Dessa forma, não caberia ao juiz determinar que o depoimento tem de ser feito por videoconferência.

Assim, para Lebre, o ato isolado de um juiz determinando o interrogatório por teleconferência pode ser alvo de questionamentos em instâncias superiores. Portanto, se Moro estabelecesse individualmente que Lula deve ser ouvido a distância, seus advogados poderiam recorrer ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4) para impedir a audiência – num recurso que poderia protelar o julgamento.

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Benefícios do contato pessoal

Além disso, mesmo admitindo a possibilidade de o juiz decidir por conta própria o interrogatório por videoconferência, há argumentos para que um magistrado evite ao máximo o uso desse recurso.

Ivan Xavier Vianna Filho afirma que o ideal sempre é que o juiz e o réu estejam frente a frente, pois o interrogatório por videoconferência reduz a percepção do julgador com relação a nuances e peculiaridades do caso e do perfil do acusado. “Parece intuitivo, assim, que o interrogatório realizado diretamente por quem julgará o processo permite ao seu responsável uma maior sensibilidade na coleta da prova e no seu futuro exame.”

O QUE DIZ A LEI

A Lei N.º 11.900/2009 autoriza que, em caráter excepcional, o juiz individualmente ou por requerimento das partes poderá estabelecer que o interrogatório de um réu preso, em processos penais, poderá ser feito mediante videoconferência. Os critérios para tomar essa decisão são os seguintes:

- Prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento para o interrogatório.

- Viabilizar a participação do réu quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento perante o juiz, por enfermidade ou outra circunstância pessoal.

- Impedir a influência do réu em depoimentos de testemunhas ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência.

- Responder a gravíssima questão de ordem pública.

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