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| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

No processo de privatização da Eletrobras, a venda de uma das subsidiárias, a Chesf, promete ser uma grande pedra no sapato do governo federal, principalmente para os aliados do governo Temer que vão disputar as eleições em 2018. A “entrega” da Chesf e de suas hidrelétricas no Rio São Francisco, consideradas um símbolo para o Nordeste, à iniciativa privada seguramente será usada pelos candidatos de oposição (principalmente o PT e o PSB) para atingir seus oponentes.Inclusive pelo ex-presidente Lula, crítico das ações de privatização do governo Temer e possível candidato do PT ao Planalto no ano que vem.

A reação política contra a privatização da Chesf tende a crescer com a ação de governadores dos nove estados da região – três são governados pelo PT, dois pelo PSB, um pelo PCdoB e dois por alas dissidentes do PMDB – e parlamentares nordestinos. Enfrentamento que ainda não teve início em outras regiões do país, onde estão instaladas outras subsidiárias da Eletrobras como a Eletronorte, Eletrosul e Furnas. 

Na argumentação de combate à privatização da Chesf será defendida que a venda da empresa aumentará a tarifa de energia, para atingir um eleitorado mais urbano. Mas, para apelar ao eleitor mais pobre e de áreas rurais – que apenas recentemente teve acesso à energia elétrica e teme ficar sem a água do Rio São Francisco –, também será usado o mote de que a privatização coloca na mão de grupos privados a gestão da vazão do rio, com riscos de que a população fique sem água. 

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A estratégia de combate já está sendo desenhada. Parlamentares de oposição criaram a Frente Parlamentar em Defesa da Chesf, capitaneada pelo deputado federal Danilo Cabral (PSB-PE) e vice-presidida pelo senador Humberto Costa (PT-PE). Os governadores dos nove estados da região Nordeste e cerca de 200 deputados querem tentar barrar a privatização.

Também estão se aglutinando em torno da iniciativa, de acordo com o presidente da Frente, representantes da indústria, agricultura e até da Igreja Católica, por meio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). 

“A pauta reformista do governo Temer está fazendo com que nos reaproximemos entre os partidos do campo da esquerda. É mais o anti-Temer que nos une. Mas é claro que para o Nordeste a Chesf é um símbolo”, afirmou Cabral. “Não defendo nenhum tipo de aparelhamento ou cabide de empregos, que é o gancho que sempre se coloca para fazer o convencimento da sociedade (a favor da privatização). Isso ainda tem uma aderência no momento do país. Nosso processo de convencimento será aos poucos. Nosso debate será de natureza técnica”, afirmou o deputado. 

Neste primeiro momento, os políticos da Frente reclamam de falta de diálogo do governo com os políticos, explicações sobre o processo de venda das usinas e principalmente sobre a gestão das usinas hidrelétricas. 

“Vinte dias depois da entrega de uma carta dos nove governadores da região, não tivemos nada, nem um telefonema”, disse Danilo Cabral. “O presidente da Chesf disse que não estão está sabendo de nada, que é uma questão estratégica, que o mercado pode dar sinais de favorecimento, e fica-se sob esse mantra com uma completa falta de debate. Não pode ser assim”, disse o deputado. 

Briga regional esquenta debate

Os ataques dos políticos nordestinos ganham intensidade na direção do ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, deputado eleito pelo PSB de Pernambuco e que está em processo de migração para o PMDB junto com o pai, o senador Fernando Bezerra (PSB-PE). Com a mudança de partido, Coelho Filho poderá disputar as eleições de 2018 para o governo de Pernambuco. 

O ministro admite que preferia não ter de mexer no assunto, que politicamente é desfavorável para ele em seu estado. Mas sustenta que tem convicção de que está fazendo o melhor para a empresa, para os consumidores de energia elétrica. 

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O Ministério de Minas e Energia está alocando esforços para defender a privatização da empresa e as autoridades garantem que a Chesf não ficará de fora. Na defesa do processo de venda de ações da Eletrobras, a pasta argumenta que o processo não vai retirar a União da sociedade que administra a empresa, mas sim diluir a participação como acionista majoritário, mantendo poder de veto, em modelo similar ao aplicado à Vale ou à Embraer. Com isso, a Eletrobras ficará livre de amarras estatais e poderá se recuperar dos atrasos, dívidas e prejuízos que acumulou ao longo dos anos. 

“O que estamos fazendo pela Eletrobras é melhorar seu valor. Vamos permitir maior investimento privado. É melhor ser sócio de uma empresa com maior valor, mais investimentos. Comparando com carros: é melhor ser sócio de um Maverick ou dono de um Fusquinha?”, afirmou um técnico do governo federal que participa da modelagem de venda de ações da Eletrobras. 

Congresso pode ser mais uma frente de batalha

No modelo que está em estudo para a privatização da Eletrobras, as usinas das empresas da Eletrobras que já tiveram suas concessões de 30 anos vencidas deverão passar por uma espécie de renovação das concessões para poderem continuar sendo operadas pela Eletrobras.

Será preciso que o Congresso Nacional aprove essas mudanças, que ainda estão em estudo pelo Ministério de Minas e Energia, Fazenda e Planejamento. “O governo insiste em tratorar. Em algumas votações dá certo, em outras não”, avalia Cabral. 

Esse deverá ser outro campo de enfrentamento do processo de privatização da Eletrobras. Os parlamentares de oposição prometem dificultar a tramitação. Neste mês, a venda de quatro usinas hidrelétricas da Cemig, empresa de Minas Gerais, causou rebuliço entre os parlamentares do estado, que prometeram judicializar o assunto e retaliar o governo em votações econômicas no Congresso. 

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O Congresso também terá de autorizar mudanças na lei que criou as “cotas” de energia elétrica. No governo Dilma Rousseff, uma lei considerou que o produto dessas usinas antigas não deveria incluir em seu preço o custo do investimento nas usinas, já amortizado, e apenas um valor de operação e manutenção. A medida resultou num processo de redução artificial dos preços dessa energia, a até um quarto do valor de mercado.

Agora, a gestão Temer quer reverter esse processo e permitir que as subsidiárias da Eletrobras tenham direito a renovar suas concessões, para voltar a gerar energia pelo preço de mercado, mais alto. Nesse processo, as empresas terão de pagar um “bônus” ao governo federal, dono das concessões, que irá para o Tesouro Nacional. Após esse trâmite, chamado de descotização, a Eletrobras e suas subsidiárias serão vendidas e a operação dessas usinas passará a ser feita por empresas privadas. 

A situação financeira da Chesf é complicada, fruto de má gestão e também resultado de políticas desastradas para o setor elétrico do governo Dilma. A empresa reverteu, em 2016, recorrentes prejuízos que vinha registrando em seu balanço. Em 2012, o prejuízo foi de R$ 5,3 bilhões; de R$ 466 milhões em 2013; de R$ 1,1 bilhão em 2014; e de R$ 476 milhões em 2015. Em 2016, a empresa registrou lucro de R$ 3,9 bilhões.

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