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A natureza do petrolão: não podemos aceitar a narrativa de corruptores malvados e políticos vítimas
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Lula o chefe

Reinaldo Azevedo tem sido acusado, inclusive por alguns dos meus leitores, de defender a Odebrecht. Não é esse o caso, nem de perto. Posso discordar eventualmente de suas conclusões, mas entendo perfeitamente seu ponto de vista e o que ele tem tentado defender. No caso, o Estado Democrático de Direito, daquilo que ele enxerga como um ativismo judicial perigoso. Em sua coluna de hoje, ele volta ao assunto, questionando qual a ideologia dos juízes de Curitiba, se é que há alguma, e se vão ou não chegar ao cerne da questão, ao chefe do petrolão:

Pequena digressão: como ignorar que a metafísica influente da Operação Lava Jato traz consigo o financiamento público de campanha, o fim da doação de empresas a partidos, a demonização da iniciativa privada e o ódio ao lucro? Parte dessa agenda, vejam que coisa pouco curiosa!, coincide com a do PT. O fato de a dita operação ter aspectos saneadores não pode matar o espírito crítico do observador. A ideologia, como sempre, é uma leitura interessada –pouco importa a natureza do interesse– da verdade.

Se a nossa academia não estivesse, com as exceções honrosas de sempre, ocupada com irrelevâncias, eis aí um vasto estudo: qual é a mentalidade dos homens que compõem a força-tarefa de Curitiba? Quais são suas utopias? Quais são seus valores? Como veem as garantias individuais oferecidas pelos regimes democráticos? O que pensam da atividade política? Eu não tenho dúvida de que isso renderia um estudo formidável da mentalidade plasmada nos meios jurídicos nos últimos 30 anos.

Dou o benefício da dúvida aos jovens responsáveis pela caçada implacável aos corruptos e corruptores do petrolão. Seriam idealistas corajosos que creem justamente no império das leis? Ou seriam, como insinua meu estimado vizinho virtual, gente movida por uma espécie de preconceito ao capitalismo, ao lucro? O tempo dirá. Mas, como já comentei aqui, se considero fundamental evitar a narrativa de corruptores malvados que desvirtuam políticos indefesos diante da tentação por um lado, por outro julgo o caso em questão diferente.

Os juízes não estão perseguindo capitalistas, empresários que, para fazer negócio num país insano e hostil ao capitalismo como o Brasil, precisam pagar o elevado custo de “acertar” as coisas com o estado. Não vejo assim tais empreiteiras. Estamos, em minha opinião, diante de um caso de máfia mesmo, de conchavo entre grandes empresas e estado, naquilo que, se bem compreendido, pode ser a definição do fascismo, ao acrescentarmos a terceira ponta do “triângulo amoroso”, que são os poderosos sindicatos. O Brasil esquerdista, pasmem!, parece-se muito com o fascismo de Mussolini!

Concordo com o Reinaldo: não podemos aceitar a narrativa esquerdista de culpar os corruptores e aliviar os corruptos, ainda mais nesse caso, em que tudo aponta para os corruptos do governo como a origem dos problemas. Mas esses empresários em questão não são, tampouco, vítimas. São agentes ativos, que sempre adoraram esse esquema, essa simbiose entre empresas grandes e governo inchado. Azevedo está certo, porém, quando cobra a punição do verdadeiro chefe, aquele que estava no comando do “espetáculo”:

O processo do mensalão mandou, sim, alguns figurões para a cadeia, rompeu um círculo de impunidade que se dava, então, como certo e pode, sem favor, ser considerado um marco, dado o que se tinha até então. Mas seu desfecho também coonestou uma farsa, de que as severas condenações da banqueira Kátia Rabello e do publicitário Marcos Valério são emblemas. A julgar pelas penas amargadas pelas personagens daquele escândalo, tem-se a impressão de que a dupla estava no comando. Estava?

Se não entendi errado –e me impressiona que a fala tenha repercutido tão pouco–, o deputado Miro Teixeira (Pros-RJ) relatou a esta Folha, na segunda, em entrevista a Leonardo Souza, ter assistido ao momento inaugural do mensalão, quando, nas suas palavras, o governo Lula decidiu, em 2003, que “‘aquele Congresso burguês’ poderia ter uma maioria organizada por orçamentos”. Notem: ele fala em “orçamentos”, com letra minúscula e no plural. Não tenho dúvida de que Miro assistiu ao nascimento de um crime de responsabilidade, que passou impune.

Ninguém acha estranho a banqueira Kátia Rabello estar presa e Dirceu solto, em casa? Ninguém acha estranho o publicitário Marcos Valério ter sido condenado a tantos anos enquanto Lula sequer foi incluído no processo do mensalão? São esses os principais pontos de Reinaldo, e ele, nisso, está totalmente certo. Se os juízes que hoje gozam da total estima dos brasileiros indignados querem continuar sendo vistos como heróis, então precisam ir até o finalmente, cavar até a raiz do mal. Ela não está nas empreiteiras, por mais culpa no cartório que tenham.

Ela está no Planalto, no andar de cima, em quem cobrava dos empreiteiros a fatura para continuar desviando recursos, de forma a se perpetuar no poder. Reinaldo Azevedo conclui:

É a essa natureza do petrolão que a Operação Lava-Jato ainda não chegou. É essa essência que pode ficar escondida nas dobras da ideologia se o jornalismo não fizer direito o seu trabalho. Mas eu expresso a convicção de que fará e de que, desta vez, será possível chegar ao chefe e revelar o seu crime mais grave: o assalto à democracia. 

Rodrigo Constantino

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