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A arrogância fatal: singela homenagem ao aniversário de Hayek
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Em 8 de maio de 1899 nascia Friedrich Hayek, o meu economista austríaco preferido, que ganharia o Prêmio Nobel de Economia em 1974. Depois de fazer “homenagens” aos comunistas Paulo Freire e Karl Marx, que aniversariaram recentemente, fico feliz por poder fazer uma singela homenagem verdadeira, sem aspas, a esse gigante.

Trata-se simplesmente do liberal mais burkeano de todos, que teve até que explicar porque não era um conservador, tamanha a semelhança (e, em minha humilde opinião, ele deixou claro não ser apenas um reacionário ou neoconservador). Resgatarei alguns artigos com base em seus livros, portanto. E para começar, justamente seu alerta contra a “arrogância fatal” dos racionalistas:

A Arrogância Fatal

“A maior parte das vantagens da vida social, especialmente em suas formas mais avançadas que chamamos ‘civilização’, depende do fato de que o indivíduo se beneficia de maior conhecimento do que ele está ciente.” (Hayek) 

O economista da Escola Austríaca, F. A. Hayek, escreveu um livro onde expõe aquele que seria o erro fatal do socialismo, seu grande equívoco intelectual. Em The Fatal Conceit, ele mostra que a arrogante idéia de que os homens podem moldar o mundo de acordo com suas vontades levou a experimentos sociais catastróficos. Hayek sustenta que nossa civilização depende de uma extensa ordem de cooperação humana voluntária para seu avanço ou mesmo preservação. Abandonar esta ordem de mercado para adotar a moral socialista seria destruir a civilização e empobrecer a humanidade.

Hayek é um defensor da razão, e justamente por isso entende que mesmo a razão humana tem seus limites. Através da nossa própria razão, podemos entender que a ordem gerada sem um design arquitetado pode superar e muito os planos elaborados conscientemente pelos homens. O socialismo, com a idéia de planejamento central, parte da ingênua visão de que a “racionalidade” humana pode desenhar a sociedade “perfeita”, aquilo que Hayek chamou de “racionalismo construtivista”. O ponto de partida de Hayek é o insight do filósofo David Hume, de que as regras da moralidade não são conclusões da nossa razão. Para Hayek, há um processo evolutivo da moralidade, e ela não seria nem instintiva, nem criação da razão, mas algo entre ambos. Em nome da razão, os socialistas acabam a destruindo!

Adam Smith já teria percebido que a ordem de cooperação humana havia excedido os limites de nosso conhecimento, usando a metáfora da “mão invisível” para descrever esse padrão indeterminado. O conhecimento humano é disperso, e todos nós utilizamos os serviços de pessoas que não conhecemos, ou que nem mesmo sabemos da existência. A ordem extensa de cooperação é impessoal nesse sentido, e graças a ela podemos desfrutar de muito mais conforto do que na organização tribal. Se fosse preciso depender do altruísmo, as trocas seriam bem mais limitadas, e a pobreza geral seria o resultado. Muito daquilo que o homem faz de positivo nessa ordem extensa não depende dele ser naturalmente bom e objetivar tais resultados. São conseqüências involuntárias de seus atos individualistas, que geram externalidades positivas.

A gradual substituição das respostas inatas pelas regras aprendidas foi distinguindo o homem de outros animais, mas a propensão à ação instintiva de massa foi mantida como uma das características humanas. Os limites a essas respostas inatas, que são culturalmente determinados, foram a mudança decisiva do animal para o homem, segundo Hayek. A capacidade de ir aprendendo uns com os outros por imitação foi fundamental. A competição foi crucial para o processo de novas descobertas. A evolução se deu através de um processo de tentativa e erro, por experimentações constantes nas diferentes áreas. Logo, por esta visão de evolução cultural defendida por Hayek, foram as regras bem sucedidas que nos selecionaram, e não o contrário.

Quem deseja derrubar as regras é que tem o ônus da prova de mostrar os benefícios das reformas. Hume já dizia que “todos os planos de governo que implicam uma grande reforma dos costumes da sociedade são totalmente imaginários”. Os “engenheiros sociais” aprenderam the hard way que não é possível brincar impunemente com a ordem espontânea vigente. Podemos pensar não apenas nas desgraças comunistas, mas na fracassada tentativa de se adotar uma linguagem “racionalmente” superior. O Esperanto foi uma construção desta natureza, como se uma nova língua pudesse ser criada de repente, por algumas mentes brilhantes, e substituir eficientemente as línguas criadas e adotadas espontaneamente.

A evolução cultural é um processo de contínua adaptação a eventos não previstos. Essa é uma das razões pelas quais não podemos racionalmente prever e controlar o futuro da evolução. Pensadores como Marx e Comte, que assumiram ser possível descobrir as leis da evolução e prever os desenvolvimentos futuros inevitáveis, estavam simplesmente errados. Como lembra Hayek, não só toda a evolução depende da competição; a competição contínua é necessária até mesmo para preservar as conquistas existentes. Para essa competição exercer seu papel, o direito de propriedade privada e a liberdade de trocas são fundamentais. O governo, historicamente, quando tentou controlar esse processo espontâneo, criou inúmeras barreiras para ele, prejudicando seu povo.

Para os ingênuos que podem conceber uma ordem apenas como o produto de um arranjo deliberado, pode parecer absurdo que a descentralização das decisões possa gerar uma ordem mais eficiente. Mas é justamente o que acontece. Essa descentralização leva ao melhor uso da informação, que é dispersa. Eis a principal razão, segundo Hayek, para rejeitarmos as premissas do racionalismo construtivista, que pretende desenhar uma nova ordem de cima para baixo.

O livre mercado é o único meio conhecido para permitir que os indivíduos julguem vantagens comparativas de usos diferentes dos recursos escassos, e o mecanismo de preços livres é crucial para isso. A preocupação com o lucro é apenas o que torna possível o mais eficiente uso dos recursos. O desprezo pelo lucro é fruto da ignorância. Nenhuma autoridade pode agregar esse conhecimento disperso. As tentativas de intervenção nessa ordem espontânea raramente resultam em algo próximo daquilo que os interventores desejavam. Isso ocorre justamente porque há muito mais informação no “mercado” do que aquela disponível para esses interventores.

Em suma, a extensa ordem espontânea que chamamos capitalismo de livre mercado não pode ser substituída sem nefastas conseqüências por um planejamento centralizado, por uma construção “racional” de cima para baixo. Aqueles que assim desejam estão sendo vítimas do que Hayek chamou de “a arrogância fatal”. Infelizmente, esta arrogância é mesmo fatal, para milhões de cobaias de tais experimentos “científicos”. Como antídoto, devemos usar a própria razão humana para compreender seus limites e, portanto, adotar uma postura bem mais humilde diante dessa grande ordem de cooperação espontânea que é o livre mercado.

Rodrigo Constantino

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