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Diferença entre FHC e Lula é mais de estilo do que de conteúdo
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Tem poucas coisas que irritam mais um liberal legítimo do que ver alguém como Fernando Henrique Cardoso sendo chamado (ou “acusado”, no caso) de “neoliberal”. É verdade que não existe um único liberalismo, e que há uma região cinzenta que abriga tons distintos, que vão do mais libertário ao mais conservador, passando pelo liberal clássico. Em algum canto mais à esquerda é possível jogar o “liberal-social”, alguém como Merquior, um grande intelectual brasileiro.

Mas para tudo há limites, e sem dúvida não existe espaço para socialistas dentro do que se chama liberalismo. Mesmo sendo muito elástico no conceito, os “liberais” americanos já não se encaixam na definição de liberais faz tempo, tendo usurpado o termo para confundir, para empurrar socialismo como se fosse liberalismo. E se Obama, Hillary Clinton e Bernie Sanders não têm nada de liberais, o que dizer de FHC? Pior ainda!

Meu xará Rodrigo da Silva, do site Spotniks, fez um breve resumo de por que alguém com o perfil de FHC jamais poderia ser incluído no rol dos liberais (ou “neoliberais”, seja lá o que isso signifique):

FHC…

Já foi editor da revista “Fundamentos”, do Partido Comunista Brasileiro.
Já teve Lula como principal cabo eleitoral, em 1978, fazendo campanha lado a lado com ele em porta de fábrica.
Já assumiu publicamente ser marxista, mesmo depois de eleito presidente da República.
Já lutou contra o impeachment de Lula em 2005.
Já lutou contra o impeachment de Dilma em 2015.
Já defendeu as políticas econômicas do PT.
Já lançou José Serra candidato à presidência.
Já disse que não gostaria de ver a prisão de Lula.
Já se assumiu como um homem de esquerda, justificando que a direita só produz “injustiças, miséria e violência”.
Já tentou brecar a ascensão de Doria, um político mais liberal, dentro do seu próprio partido.
E agora diz que o filme que retrata o liberal Gustavo Franco como protagonista do Plano Real é só uma “obra de ficção”.

Você pode dizer que FHC transitou ao longo da vida entre o extremismo e a moderação. Pode apostar que a sua vaidade lhe fez navegar por diferentes mares para ser aceito. Pode até supor que o seu narcisismo lhe forçou a adotar decisões mais ponderadas na vida pública, tornando-o menos refém dos seus próprios credos. Só não pode negar o quanto a sua identidade política é cristalina.

FHC é um dos principais representantes da esquerda brasileira. Não dessa esquerda troglodita que engole barba no almoço, é verdade – imatura, fascistóide, ignorante, que nunca leu sequer O Capital, quem dirá Florestan Fernandes – e que é tão limitada que é capaz de jurar, vejam só, que o tucano é um representante do liberalismo (provavelmente porque a única vez em que encarou o assunto na vida foi analisando uma imagem em preto e branco do Adam Smith no livro de história do segundo grau). Também não é dessa esquerda que compartilha meme da Frida Kahlo, lê poesia avulsa do Pablo Neruda e toma três aulas de francês para fingir uma intelectualidade que não possui.

FHC é da esquerda que soube superar a viuvez da queda do Muro de Berlim – e exatamente por isso é mais adaptável às novas circunstâncias que os demais. Sua grande diferença com Lula, ao menos no que diz respeito ao campo político, versa muito mais sobre estilo do que ideias. E você não precisa de nada além de um bom livro de história para chegar a essa conclusão.

Toda vez que alguém diz que FHC é um “neoliberal”, um panda comunista morre em frente à Praça da Paz Celestial.

Como pode alguém assim ser chamado de liberal ou neoliberal?! E olha que ainda faltou muita coisa. FHC foi quem introduziu as cotas raciais em nossa política, por exemplo, e foi um financiador empolgado do MST durante sua gestão, em nome dos “assentamentos agrários”. Hoje é um “progressista” que julga a legalização das drogas uma bandeira fundamental para o país e o mundo.

FHC privatizou, é verdade. Mas foi por convicção ideológica? Não! Foi por extrema necessidade de caixa, e ainda usou o BNDES de forma indevida, a ponto de Sergio Lazzarini mostrar, em Capitalismo de Laços, como o jogo continuou sendo dominado pelos mesmos grandes players, em conluio com o governo. Não estou dizendo que foi um erro privatizar. Longe disso! Meu Privatize Já diz o contrário. Mas não foi uma privatização à lá Thatcher, e sim nos moldes ainda estatizantes da esquerda.

Claro, não vamos negar os méritos de FHC, que mesmo sendo de esquerda soube delegar a economia para gente competente e ortodoxa, e o resultado foi o Plano Real e o fim da hiperinflação em nosso país. Isso não foi pouca coisa. O lado mais perto do liberalismo foi o grande legado de FHC. No restante, ele deixou seu viés esquerdista falar mais alto e o resultado foi lamentável. FHC “tirou” o estado da economia para colocar todo o resto dentro do estado, e mesmo na economia o grau de intervencionismo continuou absurdo. Regulação, impostos e dívidas crescentes: nada parecido com um legado liberal.

Por que bater em “defunto”, em quem está afastado da política e com idade avançada? Simples, e são basicamente dois motivos: FHC continua ativo na política, dando pitacos, servindo de testemunha de defesa do Lula, alertando para a “perigosa onda conservadora”, fazendo campanha para bandeiras esquerdistas e se envolvendo em discussões sobre reformas e candidaturas; e a imagem de alguém como FHC como ícone do liberalismo no Brasil é tudo aquilo que a esquerda mais quer, e que os liberais mais detestam.

Se um esquerdista contumaz como FHC for a “direita” brasileira, então só há esquerda no país, e a hegemonia não acabará nunca. Estratégia das tesouras, mantendo a “disputa” entre esquerda radical e esquerda moderada (mais no estilo do que no conteúdo, repito), e deixando de fora a verdadeira direita, liberal e/ou conservadora. Portanto, só nos cabe dizer: xô, FHC! Você não pertence ao liberalismo (e sabemos que você concorda com isso). Fique lá com seus camaradas e companheiros da esquerda.

Rodrigo Constantino

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