Talvez a marca mais importante na divisão entre libertários e conservadores seja o pensamento abstrato versus o foco no contexto e na realidade. Nunca canso de repetir que Edmund Burke, o “pai do conservadorismo”, era um liberal Whig que viu o risco iminente do radicalismo jacobino e soube se adaptar.
Os libertários revolucionários gostam de abstrações, possuem aquilo que chamamos de “cabeça de planilha”, abraçam dogmas tirados de manuais de filosofia política sem quaisquer preocupações mais mundanas ou pragmáticas. Por isso eu os acusava de viverem numa torre de marfim.
Nenhum exemplo ilustra isso melhor do que a questão da imigração. O libertário leu que a imigração é sempre boa, que as sociedades devem se abrir a trocas, misturar-se, receber de braços abertos quem quiser nelas viver. O conservador vai apontar para os riscos culturais, especialmente se a nova leva de imigrantes for de refugiados muçulmanos que se recusam a endossar os valores de quem os recebe.
Bruce Bawer, autor de The Victims’ Revolution, livro fundamental para se entender a agenda “progressista” que tomou conta das universidades nessa “marcha dos oprimidos” (gravei vídeo-resenha sobre ele), publicou um importante texto na Frontpage Magazine justamente sobre esse tema. Para ele, buscar a sabedoria dos libertários sobre imigração é como perguntar a um cientista cristão por conselho sobre os melhores hospitais.
Bawer, que pertence a uma minoria, já que é homossexual assumido, usa o caso de Minneapolis para ilustrar os riscos modernos dessa imigração descontrolada. Não faz muito tempo, tudo que se podia dizer do local é que era frio demais, e que a cidade representava um exemplo escandinavo de segurança e limpeza. Não mais.
Minneapolis é, agora, a segunda capital dos muçulmanos somali (a primeira sendo Mogadishu). Na comunidade somali, o desemprego é elevado, assim como a dependência dos benefícios estatais. A cidade se tornou uma importante fonte de recrutamento para o ISIS, e ao menos dois recrutas terroristas usaram fundos do governo para viajar ao Oriente Médio e se tornar jihadistas. Vários locais são suspeitos de usar esses fundos para disseminar grupos terroristas. Os crimes violentos se tornaram epidêmicos na cidade.
Mas nada disso impediu que os oficiais do governo e mídia celebrassem o “sucesso” da imigração somali. A CNN divulgou uma coleção de fotos para mostrar a influência positiva dos somalis em Minnesota, e jornais também enalteceram a contribuição somali na região. O caso de um imigrante que virou empresário de sucesso foi usado para vender uma imagem geral positiva.
Quando um blogueiro descobriu e apontou irregularidades no caso do primeiro político somali-americano em Minnesota, foi logo acusado de “racismo” (não sabia que Islã era raça) e, claro, “islamofobia”, a palavra mágica que trava qualquer crítica legítima a muçulmanos. Mas esse tipo de celebração da comunidade somali não é exclusividade da imprensa de esquerda.
A revista libertária Reason publicou um tributo longo, de 4 mil palavras!, para festejar a imigração “pacífica” em Minnesota. O título já diz muito: “A guerra contra o terror é uma guerra contra os imigrantes somalis pacíficos e empreendedores em Minnesota”. O autor Eric Boehm se derreteu em elogios sobre os supostos triunfos dos muçulmanos supostamente cumpridores das leis e patriotas da cidade.
Aos que se mostram preocupados com a onda somali na região, Boehm cita a onda de imigrantes alemães e escandinavos ao estado um século atrás. Eis aí o poder da abstração: são todos “imigrantes”, então quem liga para as diferenças, para os “detalhes” como o aumento da criminalidade, o terrorismo, a dependência estatal?
O autor libertário chegou a elogiar (sem usar diretamente o termo) o aspecto da sharia no local, talvez como um exemplo “lindo” de “diversidade”. Os muçulmanos “devotos” criaram até alternativas ao setor bancário, sem ter que depender de juros para financiar seus negócios. A “usura” novamente proibida em pleno solo americano. Que progresso!
O presidente Donald Trump foi demonizado no texto por ter falado, em um breve discurso de campanha em 2016 no aeroporto da cidade, sobre o risco do terrorismo somali, não sobre os imigrantes trabalhadores que ajudam a economia local. Talvez por isso os libertários tenham achado que alguém como Gary Johnson tivesse mesmo chances, e tenham ficado perplexos com a vitória de Trump.
Como ele ousa falar em terrorismo! Para Boehm, o principal ponto sobre o esforço do governo federal para coletar informações sobre potenciais atos terroristas é “colocar pressão sobre as pessoas e as empresas e diminuir o nível de confiança”. Os muçulmanos, tadinhos!, se preocupam que seus imãs, anciãos e organizações comunitárias estão secretamente passando informações sobre eles. Informando sobre o quê? Boehm não parecia estar particularmente preocupado com esta questão.
Boehm saudou os esforços em andamento por Ilham Omar – quem mais além do político democrata que teve irregularidades apontadas? – para controlar programas policiais e anti-terroristas. E ele terminou o texto onde começou – com restaurantes onde você pode degustar deliciosos “sambusas”, um típico prato somali, ou escutar o som agradável da carne grelhando para fazer os sanduíches somalis.
Eis aí a abstração “imigração” na cabeça de um típico libertário: variedades culinárias! E pouco importa que a cidade tenha se transformado num celeiro de terroristas muçulmanos e num local entregue ao crime. Constatar esses fatos seria se tornar um conservador reacionário e, cruzes!, um islamofóbico contra toda e qualquer imigração, praticamente um fã de Le Pen!
Rodrigo Constantino
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