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O comunismo para criancinhas – mas que os jornalistas do G1 não entenderam
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Por Lucas Berlanza, publicado pelo Instituto Liberal

Aquele que está mal informado geralmente enxerga relativas obviedades como escândalos imaginários. “Você está delirando”, “comunismo é coisa do passado”, “temos que nos preocupar com problemas reais”. Acreditam piamente que podem permanecer em um confortável debate sobre “gestão”, “eficiência” e tecnicismos e que a consistência “espiritual”, “cultural” de uma sociedade é um problema inteiramente secundário. Garantem que o bicho é menos feio do que o pintam.

Como não estou nesse time, trago uma notícia curiosa que chamou a atenção da redação do G1 – e da BBC, que aparentemente assina a matéria publicada. É um caso de deformação ideológica dos fatos que mal se disfarçou e ficou tão extravagante que provocou rápidas reações e se tornou manchete – lamentavelmente, o que não ocorre com certas distorções insidiosas que criam terreno nas nossas universidades e espaços culturais.

O título da matéria é “Comunismo para crianças”: o livro alemão que irritou a direita conservadora nos EUA. Uma ensaísta política e artista alemã – sim, alemã; há uma certa classe letrada brasileira que cultiva uma estranha ilusão de que os países desenvolvidos são paraísos de lucidez, imunes a qualquer vírus de loucura, algo que os dias atuais só fazem desmentir – chamada Bini Adamczak lançou nos Estados Unidos, há dois meses, a versão em inglês de um livro escrito há 13 anos. Segundo a matéria do G1, ela  não previa “a onda de críticas de conservadores radicais e o destaque em sites e jornais de extrema direita do país”. Conservadores radicais, jornais de extrema direita… OK, estamos acostumados a ler esse jargão sobre como os conservadores são monstros feios e cruéis que enxergam comunismo debaixo da cama. Mas então vamos seguir e ver quão radicais eles foram nesse caso…

Aos 38 anos, Adamczak escreveu “Comunismo para Crianças, publicado nos EUA pela prestigiada MIT Press (editora do Instituto de Tecnologia de Massachusetts)”. Os jornalistas provavelmente escrevem a matéria como quem diz “estão vendo? Foi uma grande editora, do MIT! Só esses conservadores caipiras mesmo para criticarem o livro”.

Com boas vendas, “o livro explica o comunismo em ritmo de fábula infantil e em meio a ‘ilustrações de pequenas revolucionárias vivenciando seu despertar político’, na definição da editora”. Frise-se: da editora. Não sou eu que estou dizendo.

“‘Comunismo define a sociedade que se livra de todos os males que as pessoas sofrem hoje sob o capitalismo’, abre o texto”, que trata do Marxismo “em uma história de princesas invejosas, camponesas desalojadas, patroas malvadas e trabalhadoras cansadas”. Sentiu o drama? Senta que tem mais: embora a autora lamente o regime stalinista, ela está convencida de que o comunismo ainda tem condições de dar certo – afinal, essa gente nunca desiste; o livro começaria explicando o que é o capitalismo e “como ele faz as pessoas sofrerem” e concluiria dizendo que o comunismo é o “remédio”, “uma utopia que precisa continuar sendo desenvolvida para se tornar realidade um dia”.

Uma ideologia invejosa na raiz, pano de fundo para milhões de mortes e dezenas de ditaduras totalitárias que encheram de horror a face do mundo no século XX, inspiradora da demolição dos maiores alicerces da nossa civilização, é o “remédio”, a “utopia que precisa” ser acalentada pelas criancinhas americanas, a solução de todos os nossos males. Diante de um “livro infantil”, em linguagem leve e simples, que mostra tal singela e “inspiradora” defesa dessa aberração, o que terá sido a crítica dos “conservadores radicais” da “extrema-direita”, dos “ultramegablasterreacionários republicanos”, à obra? Qual terá sido o terrível absurdo autoritário e repulsivo que comentaram a respeito?

Deixo os jornalistas responderem: “Embora a autora ressalte que o livro não é para crianças, mas dirigido a ‘todos que gostam de uma linguagem leve e simples’” – o que visivelmente, em relação a um livro chamado Comunismo para Crianças, com personagens de contos de fada e estética de fábula, não quer dizer rigorosamente nada a quem tiver ao menos dois neurônios -, “o livro entrou na mira de políticos e da mídia conservadora americana, que o descreveram como uma obra ‘que ensina comunismo a crianças’”.

Oh, céus, que absurdo! Os conservadores radicais da extrema direita acham que o livro defende o comunismo e o ensina a crianças! Que coisa horrível! Como podem ser tão burros? O livro só diz que o capitalismo é malvado, que é causa dos nossos maiores sofrimentos, que o comunismo é o remédio e é a utopia para nos salvar da ganância dos malvados patrões e que precisamos desenvolver dia a dia a crença no mundo cor de rosa que ele nos promete. O que isso tem de defesa do comunismo? Imagine!

A direita americana é culpada hoje do horrível crime de dizer o óbvio. Dizer o óbvio é extremismo, é um pecado mortal pelo qual deveríamos ser execrados. Não há mais limites, senhores. Não há mais limites para a hipocrisia da nossa imprensa. Eis um livro que se supõe “mastigadinho”, leve e simples para crianças, mas não foi suficiente para derrubar a anestesia mental do adestramento ideológico dos jornalistas do G1 e da BBC.

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