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O fim dos blogs? Ou: O trade-off entre quantidade e qualidade
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Em sua coluna de hoje no GLOBO, Pedro Doria comenta sobre a decisão de Andrew Sullivan de encerrar as atividades de seu conhecido blog “Daily Dish”. Como Sullivan foi uma espécie de precursor da atividade de blogueiro e fez incrível sucesso, chegando a arrecadar US$ 1 milhão de assinantes em um único ano, a notícia parece uma hecatombe para o futuro dos blogs. Será que estão fadados à morte lenta mesmo? Será que a grande promessa de antes, que assustava os jornalistas, oferecendo mais dinamismo e uma troca maior com os leitores, mostrou-se infundada? Doria desenvolve seu raciocínio:

Durante a primeira década do século, a hipótese de que blogs, profissionalizando-se, poderiam substituir a imprensa foi fortemente discutida. Sullivan era sempre o primeiro exemplo. Em 2013, ele deu o passo decisivo. Lançou-se numa aventura sem salário, apostando que a contribuição dos leitores fiéis poderia sustentá-lo e a uma equipe. Deu certo. Já no primeiro ano, a empresa autônoma “Daily Dish”, site fechado para assinantes, fazia US$ 1 milhão por ano.

Em janeiro, Sullivan anunciou que vai parar. Está cansado, diz. São quinze anos consecutivos. Quer tempo para pensar. Blogs exigem que cada ideia seja publicada antes da devida reflexão. Quer escrever um livro. Quer escrever com tempo. Mas há outra questão não declarada. Para fazer grandes audiências, hoje, blogs precisam curvar-se ao que é viral nas redes sociais. Viral é tudo aquilo de fácil assimilação. É o sensacional. É o que causa impacto. É a emoção rápida: pode ser indignação, pode ser um riso. Mas é inevitavelmente raso.

Blogs não foram derrotados pela imprensa tradicional. Foram derrotados por seu sucessor na própria internet. Blogs não acabaram, tampouco acabarão. Mas o esforço de torná-los uma plataforma que reunia reflexão, a possibilidade de mudar de opinião, conversas profundas, ao mesmo tempo em que alcançavam gigantescas audiências, ruiu. A internet, afinal, ainda não está pronta. É uma pena.

Acho que Doria tem um ponto, mas não sou tão pessimista (nem nunca fui tão otimista antes). Os blogs são uma ferramenta interessante, e trazem vantagens e desvantagens. O dinamismo, a área de comentários com debates dos leitores, a informalidade e a velocidade, tudo isso representa uma inovação em relação ao jornalismo tradicional e impresso. Mas creio que sejam coisas complementares, e não substitutas.

Ainda há espaço para o verdadeiro jornalismo, o mais imparcial possível (e tão em falta no Brasil), do tipo que vai às ruas, traz o cheiro do asfalto, entrega um “furo” ou dá vida aos acontecimentos importantes. A questão de como remunerar direito esse trabalho permanece uma incógnita, e cada veículo ensaia uma alternativa. Mas parece inegável que há uma demanda cativa para jornalismo verdadeiro, e os blogs de opinião não substituem isso.

Por outro lado, é verdade que o crescimento das redes sociais gera cada vez mais demanda por velocidade e dinamismo, talvez por excesso de velocidade. Há, aqui, um claro risco de trocar qualidade de conteúdo por quantidade, caindo na vala comum da superficialidade. Atender ao menor denominador comum das redes sociais é um risco evidente de sacrificar a qualidade do blog. Os “memes” que tomam conta do Facebook são divertidos, os comentários de 140 caracteres do Twiiter podem ser espirituosos, mas se a comunicação caminhar apenas nessa direção, estaremos perdidos!

Disse que não sou tão pessimista, como nunca fui muito otimista com o advento revolucionário da internet, pois o homem continua sendo o que é. Rádio, televisão, tudo despertou sonhos utópicos, mas serviu para o bem e para o mal. Há demanda para todo tipo de bem e produto, e jamais caí na falácia de crer que todos ou mesmo a maioria estariam interessados em reflexões mais profundas, textos longos ou reportagens minuciosas. Mas sempre haverá gente disposta a buscar esse tipo de produto, e isso que importa. Na TV, temos ótimos documentários e séries para a minoria, e BBB para a maioria.

Acho prematura a notícia da morte dos blogs. Aqui na Veja mesmo temos casos de enorme sucesso, com cada vez mais influência no debate político e com milhões de acessos mensais. Mas como um dos blogueiros da casa, posso atestar que existe, sim, esse trade-off entre quantidade e qualidade. Conquistar mais cliques não é tão difícil assim, e basta apelar para o sensacionalismo, para a polêmica pela polêmica, com mensagens rasas e pessoais.

Definitivamente não é o que pretendo aqui. Prefiro trazer ao meu leitor reflexões mais profundas, debater ideias com argumentos, dividir meus pensamentos, trocar experiências e transmitir o máximo possível de meu conhecimento acumulado, sempre com muita objetividade e honestidade intelectual. Não faço questão de contabilizar apenas as páginas visualizadas, pois tal métrica seria muito pobre e não diria nada sobre o conteúdo, sobre que tipo de leitor estou atraindo.

E confesso, sem receio de parecer elitista ou esnobe, pois uma das minhas características é não me dobrar ao politicamente correto: não quero qualquer tipo de leitor. Não faço questão de número apenas. Quero preservar a qualidade do blog, o bom debate, textos para quem tem fôlego e deseja, de fato, expandir o horizonte mental e participar de trocas que agreguem valor. Quero companheiros (e críticos) em uma jornada por mais informação e conhecimento.

A correria de um blog coloca constante ameaça a essa meta. Mas é um exercício diário lembrar do que realmente pretendemos com esse espaço. E de uma coisa estou certo: não quero competir com os “memes” do Facebook, por mais engraçados que sejam, ou com a verborragia maniqueísta e rasa de muitos “debates” nas redes sociais. Cada um com seu nicho, e tenho certeza de que os blogs, ao menos os bons blogs como os da Veja, ainda terão muitos anos de vida e cada vez mais influência nos debates nacionais.

Já os blogs “chapa-branca” só se sustentam mesmo enquanto o governo camarada fizer jorrar recursos públicos em seus cofres em troca de bajulação e mentiras. Esses, não fosse a simbiose com o governo, já teriam morrido faz tempo…

Rodrigo Constantino

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