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Por João Luiz Mauad, para o Instituto Liberal

Dentro da caminhonete de luxo, havia um Ivo. Fora dela, um José. Os sobrenomes distanciavam ainda mais os dois: Pitanguy ao volante, Silva a pé. Filho do cirurgião plástico mais famoso do país, Ivinho, como é conhecido, cresceu à sombra dos bambus plantados na ilha do pai, um paraíso particular no mar esmeralda de Angra dos Reis, onde os pássaros do criadouro são alimentados com sardinha fresca a cada manhã. José passou a infância com seus 11 irmãos na pequena Sertânia, a 315 quilômetros de Recife, à beira da nascente do Rio Moxotó. Brincavam na praça, ao redor da igrejinha. Se um é empresário e circula pelas altas rodas da sociedade carioca, o outro, operário, sentia-se à vontade na Zona Sul, mas em seu subterrâneo, onde trabalhava desde abril de 2013 como escavador, abrindo caminho para o metrô chegar à Barra da Tijuca. Dois mundos completamente díspares que se encontraram na calçada da Rua Marquês de São Vicente, em frente ao número 256, na noite de quinta-feira. O encontro fez as diferenças entre os dois se alargarem: Ivo está vivo, José não.

O texto acima não foi extraído de um desses folhetins baratos que se compram em bancas de jornais.  Não é tampouco um artigo de opinião de um desses esquerdistas empedernidos que povoam a editoria de opinião do jornal Folha de São Paulo.  Trata-se do primeiro parágrafo de uma notícia, publicada, neste sábado, no jornal O Globo.

Que me desculpem os autores da matéria e seus editores, mas isso não é jornalismo, nem aqui nem em qualquer lugar do mundo civilizado.  Isso é proselitismo ideológico; é a disseminação da famigerada luta de classes com invólucro de notícia séria.

O quê realmente importa o status econômico dos envolvidos?  Será que se o atropelado fosse rico, e não pobre, o caso deveria ser tratado de forma diferente?  Se o motorista fosse pobre, isso deveria ser um atenuante, como parece ser um agravante, pelo menos aos olhos dos repórteres, o fato de o atropelador ser rico?

Meu sogro, um homem de algumas posses, morreu há cinco anos, na porta de casa, em São Conrado, bairro nobre do Rio de Janeiro, atropelado, sobre a faixa de pedestres, por um motorista pobre, morador da Favela da Rocinha, a bordo de uma Kombi velha, caindo aos pedaços, que nem mesmo documentação em dia possuía.  Até onde sabemos, o caso não deu em nada.  Agora, alguém, em sã consciência, pode achar que, aos olhos da lei, Ivo Pitangui deve ser tratado de forma diferente do atropelador de meu sogro?

Já passou da hora de o Brasil começar a enxergar que “todos são iguais perante a lei”, independentemente de raça, sexo, religião e, principalmente, condição financeira.  É preciso enterrar de vez aquele velho chavão segundo o qual a lei deve tratar os desiguais na medida das suas desigualdades.  Assim como seria absurdo dar tratamento privilegiado a Pitangui pelo fato de ser rico – o que, sejamos justos, no passado, era comum em Pindorama -, tampouco se pode condená-lo apressadamente pelo simples fato de ser rico.  Olhem bem para a imagem da deusa da justiça, pois ela diz tudo.

Se Ivo Pitangui merece ser punido pela justiça, não é porque é rico, dirigia uma caminhonete de luxo, frequentava as altas rodas da Zona Sul ou andava de barco em Angra dos Reis.  E muito menos porque a vítima era um operário pobre do Nordeste.  Ele deve ser punido – e de forma severa! – caso realmente fique comprovado que dirigia alcoolizado e em velocidade acima da permitida na hora do acidente.

Ademais, inveja e ideologia política são coisas que devem ficar bem longe da Justiça.

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