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Unicamp: uma ilha parada no tempo. Ou: Dilma e suas "prostitutas"
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Muito boa a entrevista no GLOBO com Alexandre Rands, coordenador econômico do programa de Marina Silva no PSB. Reforça a ideia de que Marina realmente evoluiu, ao menos quando se trata de modelo econômico, e que pretende deixar para trás essa mentalidade “desenvolvimentista” da atual equipe econômica. Há clara convergência com o pensamento tucano, como o próprio Rands reconhece:

O PSDB adora dizer que a gente está copiando. De fato, numa discussão, vamos concordar em 80% das coisas. Não é porque os economistas de Marina são tucanos, mas simplesmente porque hoje em dia existem alguns consensos na teoria econômica. Estão em todas as universidades americanas, em 98% das europeias, em 95% das asiáticas e 97% das brasileiras. Só uma universidade aqui não tem articulação internacional, não traz e não manda ninguém para o exterior: a de Campinas (Unicamp). Ela é endógena. No entanto, tem uma força no governo Dilma que não tinha no de Lula, que era muito mais próximo do que Marina defende hoje. Os economistas de Campinas não consideram todo o desenvolvimento da teoria econômica desde a década de 1960. Dilma pensa com a cabeça de Campinas, que hoje é um lugar isolado, fora do mundo. Uma ilha que parou no tempo. Pela primeira vez, cada candidato tem propostas de desenvolvimento baseada em concepções diferentes.

[…]

Na visão de Dilma, desenvolvimento é feito por demanda (consumo). É impressionante porque, mesmo com pleno emprego, ainda mantêm isso, junto com a a visão estruturalista de privilegiar um ou outro setor com políticas discricionárias. A lógica dela é que o governo tem de reestruturar a economia. E sempre faz isso a partir da demanda. Exemplo é o setor automobilístico, visto como de alta produtividade. O governo fica tentando aumentar o crédito para estimular a demanda. É um modelo econômico altamente inflacionário, baseado no (economista) Celso Furtado. A escola de Campinas, e grande parte da esquerda brasileira, não conseguiu se libertar de Celso Furtado. Só que é um modelo que gera uma crise dentro dele próprio. O que são R$ 500 bilhões do Tesouro no BNDES para subsidiar empresário? Isso é usar a estrutura do Estado para injetar dinheiro direto na veia dos grandes empresários. Tem coisa mais de direita do que isso?

Tirando a pergunta retórica no final, o resto está perfeito. Não, Rands, BNDES como o de hoje não tem nada de direita, se por direita entendemos o capitalismo de livre mercado, aquele pregado por Thatcher, por exemplo. É um modelo de capitalismo de estado, típico da esquerda arcaica e autoritária. Por favor, não venha sujar o conceito da direita ainda mais com estereótipos inadequados que pertencem à esquerda.

Fora isso, está perfeito. Há vários consensos dos economistas mais sérios no mundo todo, infelizmente ignorados na Unicamp, a escola de Dilma e companhia. Celso Furtado é tratado como um gênio, um guru, mas estava equivocado na grande parte de suas ideias. É preciso deixar para trás essa visão intervencionista, protecionista, de seleção dos “campeões nacionais”, de controle de preços, de banco central subserviente ao Planalto, enfim, todas essas trapalhadas que o governo Dilma tem feito.

O economista e empresário lançou mão de uma metáfora muito adequada, ao dizer que Dilma trata os empresários como “prostitutas”. E vários empresários permitem isso, o que é vergonhoso. O problema é que somente um grupo seleto consegue gozar das benesses estatais, e há desvio de foco, pois as empresas passam a “investir” em lobby em vez de produtividade. Diz ele:

Dilma detesta os empresários, mas todas as políticas são para eles fazerem o que bem entenderem. O governo bate, mas depois convida para um drinque. Trata os empresários como prostitutas. Quer estar com eles, desfrutar de suas benesses, mas depois vai criticar, denegrir sua imagem.

Se os empresários lucram, como explicar a resistência deles à reeleição de Dilma?

Seguindo o exemplo: você acha que a prostituta confia nos homens que recebe? Chamaria um deles para a festa de aniversário do filho? Claro que não. Só tem interesse e medo.E tem outra coisa: um homem agrada três, quatro, dez prostitutas, mas não a todas as outras que não estão participando da festa.

Há uma parte do empresariado que se sente excluída?

Sim, uma boa parte. Não adianta só dar crédito barato do BNDES. Eu mesmo fiz investimentos na minha empresa com linhas de 5% ao ano do BNDES. Se fossem juros de 8% eu teria investido? Sim, do mesmo jeito. Essa diferença foi transferência direta para o empresariado. Não precisava disso. O governo escancarou o subsídio desnecessariamente. Foi generosidade demais. Mas, o mesmo empresário que se beneficia disso tem que enfrentar a Receita, o INSS, a regulação instável, o licenciamento demorado, as greves… Enfrenta em tudo essa lógica autoritária de Dilma que se espalha pelo governo. Por que, só com um crédito aqui e outro ali, vai gostar do governo? É um governo que joga a burocracia contra o empresariado, que está sitiado. O Brasil está impossível. É um país cheio de oportunidades, que tem um mercado imenso, uma cultura fácil. Mas a dificuldade de agir é muito grande. Abrir negócio, fechar, pagar imposto, tudo é muito difícil. É preciso acabar com essa relação doentia do governo com os empresários, que torna custoso demais crescer.

Questionado se poderia ser considerado um neoliberal, Rands responde:

Não. Quem fala isso não sabe o que é neoliberalismo. Gente que leu apenas um livro na vida, o do (economista britânico John) Keynes, e nem conseguiu entender até hoje. O neoliberal acredita que as forças de mercado e um sistema totalmente democrático resolvem tudo. Entre os tucanos, há neoliberais. Entre nós, em torno de Marina, até há alguns. Mas a maioria dos que são tachados (pelo PT) de neoliberais são os que os que acreditam que o mercado é eficiente na maioria das áreas, mas não em todas. Há aquelas que precisam da mediação do Estado. O neoliberalismo não consegue, por exemplo resolver o problema da pobreza na velocidade necessária. Não defende tanto investimento em educação, como é a base de Marina. Acha inclusive que deveria ser privada. Há uma distância imensa entre nós e o neoliberalismo. O que não acreditamos mesmo é em mágica.

Mais um escorregão. Neoliberal (?) ou liberal algum defende mágicas. Ao contrário: o liberalismo clássico não é afeito a utopias. O tal “fundamentalismo de mercado” é mais uma caricatura do que uma verdade. Os liberais apenas entendem que as falhas de mercado dificilmente são resolvidas por meio de intervenção estatal. Normalmente, elas pioram ainda mais as coisas.

Dito isso, há claramente um afastamento em seu discurso do modelo atual do governo Dilma, que tem afundado nossa economia. O programa econômico de Marina Silva não seria neoliberal ou liberal, como o PT “acusa”, mas seria, ao que tudo indica, bem menos intervencionista do que o atual. E isso já seria um grande passo na direção certa.

A Unicamp é mesmo uma ilha parada no tempo, e Dilma trata mesmo os empresários como prostitutas, sendo que vários aceitam tal tratamento, mas parecem cansados dos mimos, insuficientes para compensar o resto que são obrigados a suportar.

Marina Silva, ao delegar seu programa econômico a gente como Eduardo Giannetti e Alexandre Rands, ele mesmo um empresário de sucesso (ao contrário de Dilma, que faliu uma loja de bugigangas em sua única experiência como gestora), sinaliza que haveria progresso em relação ao caos atual.

Nem preciso dizer que vejo na equipe de Aécio Neves os melhores nomes para liderar a mudança tão desejável e necessária, apesar de ainda distante do modelo liberal que defendo. Mas não restam dúvidas de que, entre Dilma e Marina, a melhor alternativa estaria em Marina. Ninguém aguenta mais esse nacional-desenvolvimentismo tacanho!

Rodrigo Constantino

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