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Brasileira da ONU é acusada de ideologizar relatório sobre setor imobiliário no Reino Unido
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A brasileira Raquel Rolnik, arquiteta e urbanista, titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o Direito à Moradia Adequada, despertou a fúria dos conservadores e do governo no Reino Unido.

Sua missão era avaliar o programa social de casas do país. Em apenas duas semanas, porém, já tinha uma crítica pronta, e das mais veementes: acusou o programa de atentar contra os direitos humanos da ONU, de ser um “retrocesso” enorme que ameaçava os pobres.

No âmago da questão está o que ficou conhecido como “Bedroom Tax”, mas que o governo prefere chamar de “under-occupancy penalty”. Trata-se de uma reforma desse ano que introduz novas regras para o programa social de residência, restringindo a quantidade de benefícios oferecidos pelo governo para quem utilizar mais espaço nas casas.

Se a pessoa tiver espaço sobrando em sua moradia social, os subsídios serão menores. Por exemplo: uma casa com um quarto vago terá redução de 14% dos benefícios estatais, que pode chegar a 25% no caso de dois quartos desocupados.

Os ministros estimam que tal medida pode economizar até 500 milhões de libras por ano dos pagadores de impostos britânicos. A afirmação da arquiteta brasileira, portanto, despertou grande revolta na direita local, que a acusou de ser uma esquerdista de um país e um governo com milhões de pessoas vivendo em favelas.

A acusação sobre seu país de origem talvez seja desvio de foco, e levanta uma bola para Rolnik, que pode apelar ao preconceito. Mas as críticas procedem. A brasileira foi claramente precipitada, não teve tempo de fazer uma análise realmente profunda, usou o termo “Bedroom Tax”, que não é o termo oficial e já tem sua conotação pejorativa criada pela oposição, e carregou nas cores ideológicas.

Seu discurso cita especulação imobiliária dos ricos, por exemplo, sem qualquer conexão lógica com o assunto em debate. Foi acusada, por isso, de marxista. Novamente: parece proceder. Seu currículo histórico, além do discurso demagógico, sustenta isso.

httpv://youtu.be/Eei259XupvM

Um de seus estudos mais recentes é “Fortalecendo o direito à moradia nos assentamentos informais”. No imbróglio do Horto, no Rio, tomou o partido dos ocupantes ilegais, recebendo os aplausos do petista Edson Santos pela carta que mandou ao ministro Joaquim Barbosa. Em uma entrevista recente, sapecou até a ideia de “democracia direta”, bandeira bolivariana:

Entre as promessas da Constituinte, estava a ideia de uma democracia direta. Isso chegou a ser ensaiado em algumas cidades brasileiras ao longo dos anos 80 e início dos anos 90. Mas, na hora que apareceu muito dinheiro na jogada, proveniente do desenvolvimento econômico, essa pauta foi totalmente abandonada. E os partidos que estavam na oposição naquele momento, como PT e PCdoB, e carregaram essa bandeira, uma vez no poder, abandonaram essa agenda, que também nunca foi a agenda dos partidos de centro e de direita.

Como se vê, a acusação de ideologizar a questão da moradia social com seu viés marxista parece ter embasamento. Rolnik afirmou que não se pode comparar o Reino Unido com o Brasil, e sim o Reino Unido com o Reino Unido. Mas em janeiro ela esteve na Ruanda, e conseguiu tecer elogios ao “combate à miséria” do governo, enquanto o ditador Paul Kagame se via envolto em escândalos de corrupção.

O tema da moradia social é bastante delicado, sensível do ponto de vista humanitário e político. Por isso mesmo, é uma grande oportunidade para os oportunistas de plantão. A demagogia passa a ser quase irresistível: quem não gostaria de posar como o defensor do direito dos pobres morarem bem? Resta saber quais são os melhores meios para tanto. Aí a coisa complica.

Exemplos de demagogia que acaba prejudicando os pobres existem aos montes. Colocar um teto no aluguel de baixa renda, como vários governos fizeram, é um caso evidente. Ao fazer isso, o proprietário não tem mais interesse em investir na qualidade da propriedade, pois o preço do aluguel é fixado abaixo do de mercado.

Com o tempo, esses bairros ficam decadentes, os apartamentos, sem reformas, ficam em péssimo estado, e a vizinhança se torna mais pobre e abandonada. Tudo graças ao lindo objetivo do governo de impor um aluguel mais baixo aos humildes, para ajudá-los.

O debate precisa de mais luz e menos calor, de mais razão e menos emoção, de mais fundamento e menos demagogia. Os conservadores britânicos podem ter exagerado no tom da reação ao discurso da brasileira da ONU, mas é compreensível o motivo: uma marxista de um país repleto de favelas dar pitado de forma precipitada, sem a devida análise, na política de moradia social do Reino Unido, parece realmente uma afronta. E não é?

Em tempo: as moradias sociais, mesmo no Reino Unido, representam um desafio e tanto mesmo. Talvez o principal problema esteja nessa mentalidade de que ter uma casa boa e confortável é um “direito” de todos, logo, uma obrigação do estado (de todos os outros). Passaram a crer em “almoço grátis”, e a esperar todas as benesses como um presente de terceiros. E ainda ficam revoltados por ter os subsídios reduzidos ao ostentarem quartos vazios nessas moradias sociais! O socialismo, mais do que estragar a economia, afeta os valores da sociedade…

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