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Brincando perigosamente com a inflação
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O editorial do Estadão de hoje subiu o tom ao alertar para a perigosa tolerância do governo com a escalada inflacionária, e disse, logo na abertura:

O vilão da inflação é o governo, como provou mais uma vez o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em sua patética entrevista sobre a disparada dos preços. “Eu tenho certeza de que vamos terminar o ano dentro do limite de 6,5%. Não vamos ultrapassar”, assegurou. A meta oficial é de 4,5%, mas as falas do ministro e da presidente Dilma Rousseff geralmente passam longe desse detalhe. A preocupação efetiva, como têm confirmado os números nos últimos quatro anos, é alcançar qualquer ponto até o limite da margem de tolerância. Tanto melhor se o resultado ficar em torno de 6%, de preferência pouco abaixo, como em 2012 e 2013. Mas esse pormenor é meramente decorativo. Mais de uma vez a presidente negou qualquer tolerância à inflação. Mais de uma vez a política oficial desmentiu suas palavras e desmoralizou suas promessas. Igualmente desmoralizante, a entrevista do ministro Mantega ainda acrescentou um toque grotesco ao cenário.

Após mostrar com números as absurdas declarações do ministro Mantega, o jornal concluiu de forma bastante direta:

Diplomado em economia, o ministro parece desconhecer fatores como as limitações da oferta e o excesso de demanda alimentado pelos estímulos ao consumo e pela gastança pública. Quem leva em conta esses fatores identifica o verdadeiro vilão.

Que Mantega é diplomado em economia nós sabemos. Mas isso apenas comprova que certos diplomas não valem nada! Infelizmente, vivemos sob a “cultura do diploma”, e por isso que tantos economistas da Unicamp, mesmo após tantos equívocos históricos, ainda desfrutam de espaço na imprensa ou estão no poder. Quem paga o pato é o povo brasileiro, claro.

A inflação foi também o tema da coluna do economista Fernando Rocha no Valor. Rocha trabalha em uma grande gestora carioca, e por isso mesmo precisa se preocupar com as previsões que faz, ao contrário do ministro Mantega, que pode divulgar um crescimento de 4,5% do PIB e se fazer de bobo (sem muito esforço, é verdade) quando o número oficial nem chega a 2%. Rocha faz importantes alertas:

A chamada nova matriz macroeconômica, implementada no governo Dilma, consistiu em baixar o nível da taxa de juros, adotar uma política fiscal mais acomodativa, turbinar o crédito dos bancos públicos, promover uma desvalorização da taxa de câmbio, aumentar as tarifas de importações e fomentar fusões empresariais com o apoio do BNDES na busca de “campeões nacionais”. Acreditava-se que isso traria um novo vigor ao setor produtivo, principalmente ao setor industrial, o que resultaria em maior crescimento econômico. No entanto, os resultados foram pífios em termos de crescimento e provocaram, como era de se esperar, um aumento da inflação.

[…]

Atualmente, os preços estão rodando, em média, acima de 6%. Isso significa que alguns preços, principalmente de serviços, estão subindo perto de 10% ao ano, enquanto outros, como as tarifas públicas, sobem bem menos – em 2013, a alta foi de apenas 1,5%. Outro dado preocupante: excluindo os itens de alimentação, que são muito voláteis, 72% dos itens do IPCA subiram no mês de março de 2014. Esse percentual, em 2006, era próximo de 50%. Isso mostra que a inflação está mais disseminada. A disseminação da inflação favorece o surgimento de distorções de preços relativos. Recentemente, popularizou-se nas mídias sociais os chamados “preços surreais”, que nada mais são que uma expressão da distorção de preços relativos, quando um determinado bem ou serviço fica muito caro comparado a outros bens da cesta de consumo. Estamos em um estágio muito incipiente, mas essa distorção de preços relativos é muito perigosa, uma vez que gera má alocação de recursos. Na Argentina, isso fica muito claro. Os setores que têm poder de repassar preços mais rapidamente se defendem enquanto outros setores, principalmente os regulados, ficam com grandes defasagens de preços, prejudicando os investimentos.

O Brasil tem o DNA da inflação alta. Nossa estabilização é muito recente. Um exemplo ilustra como a evolução da inflação pode ser rápida. Em 2002, acreditava-se que o candidato Lula, se eleito, promoveria uma série de mudanças na economia, entre elas o calote da dívida pública, que vinha sendo propugnado pelo PT. Os poupadores domésticos, detentores dos títulos da dívida pública, venderam seus papéis e partiram para o consumo de bens, principalmente duráveis e imóveis. O que ocorreu então foi uma disparada da inflação para 17% ao ano. A partir de certo ponto, a evolução da inflação deixa de ser gradual e linear e passa a ser exponencial. Todo cuidado é pouco, portanto. O governo atual está se descuidando perigosamente dessa questão.

Já usei essa analogia aqui e repito: o governo Dilma parece um adolescente brincando de riscar fósforos em um paiol repleto de pólvora. O povo brasileiro está sentado em cima deste paiol…

Rodrigo Constantino

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