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Metáforas futebolísticas
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Esse atacante só dá chute fora!

Clima de Copa do Mundo, dia de jogo do Brasil, resolvi resgatar um artigo que faz parte do meu livro Estrela Cadente: As contradições e trapalhadas do PT, de 2005. Como fica claro, o alerta de Baltasar Grácian continua válido: “A esperança é a grande falsária da verdade”. Tinha fé de que Lula seria derrotado nas urnas após o escândalo do mensalão, mas os eleitores resolveram, ali, jogar no lixo qualquer resquício de ética na política nacional.

Resta-nos, agora, torcer – e trabalhar muito – para que desta vez seja diferente. Uma vez mais temos inúmeros escândalos de corrupção no governo, muita incompetência, a volta da alta inflação mesmo sem crescimento econômico, tendências claramente autoritárias e completo aparelhamento da máquina estatal, ameaçando nossa República democrática. A técnica vai ou não cair com as constantes derrotas do “time” Brasil?

Metáforas futebolísticas

“Depois da tempestade vem a ambulância.” (Vicente Mateus)

É de conhecimento geral o apreço do presidente Lula pelas metáforas futebolísticas. Com bastante frequência Lula faz uso de comparações entre política e futebol. Em discurso em Guarulhos, por exemplo, ele disse que seu governo entrou no “segundo tempo” agora, após ir para o vestiário, e que as perspectivas são mais promissoras em relação ao “primeiro tempo”. Sobre o comércio exterior, disse que “nego pisa na canela mesmo”, como nos clássicos de futebol. Disse ainda que pessimistas sempre existem, como os que vão a campo e, mesmo com o time ganhando de 5 a 0, temem o empate. Já ele, como bom torcedor do Corinthians, diz que “não se abate com as derrotas”, pois é um “homem de fé”. É preciso muita fé mesmo para ignorar os fatos da realidade e ainda apostar na vitória. Os torcedores do Corinthians sabem bem isso!

Talvez seja injusto criticar nosso presidente pelas infindáveis analogias usando o futebol. Afinal, Lula não é muito afeito a leituras mais profundas, e seu campo de conhecimento é bastante limitado. Melhor ficar restrito ao futebol mesmo, para não repetir que o tsunami é um vendaval. Mas que pelo menos o presidente leve em consideração as principais características do futebol, para poder fazer comparações mais acertadas.

Por exemplo: no futebol, as regras são definidas antes da partida, e jamais podem ser alteradas durante o jogo. Elas são simples, impessoais, objetivas, e valem para todos os jogadores, de forma isonômica. O árbitro apenas aplica estas regras, não tendo como objetivo alterar o resultado da partida. Comparemos isso com as leis brasileiras. Estas são complexas, infinitas, mudam o tempo todo durante o “jogo”, pegando desprevinido o indivíduo, e não garantem tratamento isonômico. As leis acabam sendo privadas (privi leges) para cada grupo de interesse. A objetividade dá lugar à subjetividade do juiz, que leva em consideração fatores abstratos e vagos, em nome da “justiça social”, tentando assim controlar o resultado final em vez da manutenção da lei. Seria como se no futebol o Ronaldinho estivesse sujeito à certas regras diferentes, pois é mais rico que o resto. Ou como se o juiz mudasse o tamanho da baliza pois o time mais fraco está perdendo. Ou ainda como se algum jogador negro tivesse privilégios em campo, pela cor da pele. Lula deveria refletir sobre estas analogias quando defende cotas ou inúmeros privilégios para classes distintas, pregando a “igualdade” dos resultados em vez do império da lei.

E vale lembrar que, diferente do futebol, a economia não é um jogo de soma zero, onde para alguém ganhar, outro tem que perder. Todos podem se beneficiar das trocas no mercado em conjunto, oferecendo suas habilidades específicas em troca de diversos bens e produtos. Um trabalhador que voluntariamente vende sua força de trabalho para uma empresa e recebe um salário, que poderá ser trocado por diversos outros produtos, está com certeza melhor do que se tivesse que lutar sozinho pela sua sobrevivência, caçando, pescando, plantando, fazendo suas roupas etc. As trocas no mercado livre representam o único meio justo de conquista dos bens desejados, sendo a alternativa a espoliação através do roubo ou de leis injustas, que é o mesmo que roubo legalizado.

No futebol, os torcedores bancam os times, através de contribuições voluntárias, indo aos jogos etc. Mesmo com toda a paixão envolvida, que garante o suporte financeiro dos clubes, gestões irresponsáveis podem afundar um time. A maioria dos clubes está falida, pois os gastos foram irresponsáveis, e a corrupção correu solta. A equação tem dois lados: gastos e arrecadação. Não é possível gastar sem ter fonte. E a fonte é escassa, mesmo no futebol, com o desejo do torcedor de contribuir. Já na política, o “contribuinte” é um eufemismo para pagador de impostos. Ninguém paga impostos ao governo incompetente e corrupto por livre e espontânea vontade. Ninguém sustenta a enorme burocracia feliz da vida. Se no futebol, com contribuição voluntária, a revolta popular é grande quando o clube mostra uma administração ineficiente ou roubalheira, em política, com o dinheiro tomado à força, a pressão deveria ser ainda maior. Sorte dos políticos que o brasileiro não se liga muito em política, e é muitas vezes ignorante para calcular a montanha de impostos que paga, assim como saber seu destino real. Os burocratas agradecem…

Uma outra analogia interessante com o futebol que Lula deveria ter em mente é que, quando o time vai mal em algumas partidas, o técnico normalmente cai, pela pressão dos torcedores. Seria bom que o alerta fosse válido para os políticos também. Após tantas medidas irresponsáveis, projetos ineficientes e atrocidades, o “técnico” bem que deveria ser responsabilizado pelo mau desempenho do “time”. Mas Lula fica ileso às críticas e julgamentos, enquanto sua equipe recebe a culpa, quando não fatores exógenos e eternos bodes expiatórios. O time vai mal, os ministros erram o tempo todo, acusações de corrupção vem à tona, mas o presidente parece imune ao fracasso da equipe. Talvez isso mude em 2006. Talvez os “torcedores” resolvam pedir a cabeça do “técnico”. Talvez Lula não seja reeleito. Sou um homem de fé!

Rodrigo Constantino

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